sábado, 18 de setembro de 2010

O QUE ESTÁ EM DISPUTA.

José Carlos Corrêa



Foram muitas as mensagens que comentaram o texto "Lula e Tiririca" publicado neste espaço no último sábado. No texto há uma crítica a Lula que, nesta campanha eleitoral, não se comporta como um presidente da República - ou seja, como um presidente de todos os brasileiros - preferindo desdenhar a gravidade do crime cometido pela Receita Federal de quebra de sigilo fiscal de centenas de pessoas e zombar das multas que lhe foram aplicadas pela Justiça por descumprimento da lei eleitoral. A menção a Tiririca se fez considerando que ambos - Lula e Tiririca -, cada um a seu modo, debocham da democracia, Tiririca com as palhaçadas que exibe no horário eleitoral gratuito, e Lula quando, tentando fazer graça, pergunta a uma multidão "cadê esse tal de sigilo?".

A grande maioria das mensagens, é preciso registrar, concorda com o final o texto que conclama Lula a "se comportar como um presidente da República, deixando apenas para Tiririca o papel vergonhoso de brincar com coisa séria". Mas houve também quem considerasse a comparação entre o presidente e o palhaço "mais uma demonstração de preconceito de uma elite" que "ainda não aceitou um operário [...] de origem humilde" e que, por isso, "só gosta de difamar e conspirar sempre em direção a um golpe".

Não creio que o fato de ter sido um operário de origem humilde dá a Lula o direito de se colocar acima da lei como ele tem feito nesta campanha eleitoral. E tampouco lhe dá o direito de fechar os olhos ao crime cometido pela Receita e considerar que a denúncia não passa de uma "armação eleitoral" de seus adversários. Ao agir assim, como bem definiu a candidata Marina Silva, Lula deixou de lado a defesa dos cidadãos que tiveram seus sigilos quebrados para defender unicamente a sua candidata. Que, aliás, não tem a mesma "origem humilde" de Lula. Se alguém tem origem humilde nesta disputa pela presidência da República esse alguém são exatamente os adversários da candidata do Governo.

Por outro lado, é um exagero ver uma conspiração "em direção a um golpe" em um texto que nada mais fez do que defender um comportamento ético do presidente da República. Talvez isso seja reflexo das atitudes de Lula que considera todas as críticas e denúncias como "desespero dos adversários", mesmo que as críticas e denúncias se refiram, como no caso da quebra do sigilo fiscal, a crimes confessados pelos próprios agentes do Governo.

Um amigo chegou a considerar a comparação entre Lula e Tiririca uma injustiça já que o palhaço sequer tem consciência do que faz nesta campanha eleitoral. Se assim é, o deboche de Tiririca poderia ser aceito, mas não o de Lula que, ao contrário, tem plena consciência de tudo o que faz. Inclusive quando assegura que nada sabia e sabe sobre todos os escândalos que eclodiram, e ainda eclodem, durante o seu Governo, envolvendo pessoas cujos gabinetes estão ao lado do seu.

É saudável a livre troca de opiniões que só existe nas democracias. É isso que diferencia os regimes democráticos dos ditatoriais. Por isso me senti à vontade em comentar as mensagens que recebi. Em algumas delas, entretanto, é possível perceber um perigoso viés autoritário que considera Lula "mais tolerante que deveria ser" com a imprensa e faz votos de que essa posição seja revista em um próximo governo petista. Algo próximo ao controle defendido por José Dirceu e o PT, e que foi tentado algumas vezes ao longo do Governo Lula.

É sinal que, nessas eleições, a disputa não se dá somente entre nomes de candidatos, mas também entre ideologias e diferentes concepções de liberdade, inclusive a liberdade de expressão.

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