A bandeira da ética, uma das armas mais temidas em eleições passadas, poderá até aparecer neste ano na campanha para a Presidência, mas sem a contundência de outros tempos.
Estrategistas das campanhas do ex-governador José Serra (PSDB) e das ex-ministras Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) disseram que não vão brandir denúncias de corrupção contra os adversários na propaganda eleitoral gratuita. Também vão fazer vista grossa para as contradições entre eventuais discursos sobre moralidade no serviço público e a formação de alianças com candidatos fisgados na rede da lei da Ficha Limpa.
O diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo, diz que os candidatos tentam se manter afastados de discussões sobre corrupção porque não querem abrir o flanco para ataques dos adversários. No xadrez político atual, com alianças baseadas apenas em conveniências políticas momentâneas, qualquer ofensiva pode redundar em contra-ataque. Ele sustenta que o tema, além de não atrair votos, é pouco compreendido.
“Esse assunto é evitado pelos candidatos. Em geral, eles não têm o que dizer, não têm noção das medidas que devem ser adotadas. Também tem acusações para tudo quanto é lado. Se o Serra usar o mensalão contra a Dilma, a Dilma usa o mensalão lá de Minas contra o Serra”, diz.
Mensalão
O escândalo do mensalão estourou em 2005, triturou o núcleo base do governo Lula e tirou o brilho de estrelas do PT, como o deputado cassado José Dirceu e os deputados José Genoíno e João Paulo Cunha. A onda de denúncias arrastou o PSDB de Minas Gerais, liderado à época pelo senador Eduardo Azeredo. No fim de 2009, outro mensalão implodiu o principal líder da nova geração do DEM, o ex-governador José Roberto Arruda.
“A usina de produção de dossiês é com o PT. A gente não sabe fazer isso. O PSDB tem notória dificuldade de tratar desse tema. Denúncias contra o governo Lula normalmente nascem em brigas na própria base do governo”, diz o presidente do PSDB, Sérgio Guerra.
O deputado José Eduardo Cardozo (PT) diz que denúncias de corrupção estão fora do esquadro. “Nossa ideia é fazer uma campanha propositiva. Não entraremos no denuncismo ou numa situação que saia do debate programático”. (Agência Globo)
“Justiça não pode ter dois pesos”, reclama Dilma
São Paulo
A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, disse ontem em Jales (SP) que a Justiça Eleitoral não pode ter "dois pesos e duas medidas", numa referência aos elogios feitos pelo governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), ao candidato tucano à Presidência, José Serra.
A vice-procuradora-geral eleitoral, Sandra Cureau, considerou "caso de abuso de poder político" as declarações elogiosas que o presidente Lula fez a Dilma em evento oficial ocorrido na terça-feira.
Já sobre as declarações de Goldman, Cureau afirmou que também configuram abuso de poder político. "Não pode, falando oficialmente como governador, dizer as coisas boas que Serra fez. Ele está indicando à população que Serra é a pessoa ideal para governar o país."
Zelo
Ela ainda não decidiu se vai abrir procedimento para apurar as declarações do governador, mas destacou que o PSDB tem demonstrado mais zelo e respeito à Lei Eleitoral do que o PT.
"Não vou entrar nessa polêmica com a procuradora", afirmou Dilma ontem. "Agora, acho que não se pode na vida ter dois pesos e duas medidas."
Dilma visitou Jales acompanhada do seu candidato a vice, Michel Temer (PMDB), do candidato a governador Aloizio Mercadante (PT-SP), dos candidatos paulistas ao Senado Marta Suplicy (PT) e Netinho de Paula (PC do B) e de seu assessor especial Antonio Palocci.
Ao ser questionado sobre os elogios que recebeu, Serra se limitou a dizer que "hoje, aqui em Ilhéus, não vai ter ti-ti-ti".
Serra e Dilma trocam de discurso na eleição
Rio
Uma análise de entrevistas e discursos dos presidenciáveis José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) desde o início oficial da campanha mostra um troca-troca de bandeiras. Na cartilha dos dois, a estratégia de neutralizar o discurso adversário, segundo especialistas.
O Bolsa-Família, um dos temas prediletos do tucano nas duas últimas semanas, foi abordado duas vezes mais por Serra do que pela candidata petista. Já Dilma tratou de economia e da desoneração tributária três vezes mais do que o tucano. A Saúde foi o assunto mais abordado pelos dois candidatos.
“Há uma inversão de papéis. Dilma repete que o candidato oposicionista vai acabar com programas sociais. Serra, então, tem um contradiscurso para insistir na defesa desses programas. Dilma, por sua vez, tem um discurso mais voltado para empresários, classe média e agricultores, afetados pela alta tributação. Essa inversão aquece a campanha, já que um entra no terreno do outro”, diz o historiador Marco Antônio Villa.
Economia
Nos discursos entregues ao Tribunal Superior Eleitoral, Serra cita o Bolsa-Família cinco vezes. Uma a mais do que Dilma. O assunto foi abordado pelo tucano em outras quatro entrevistas. Já Dilma citou quatro vezes o termo “economia” na primeira versão entregue ao TSE, enquanto Serra usou o termo quatro vezes. Marina, no registro de sua candidatura, não citou uma única vez o Bolsa-Família e falou sobre economia por três vezes. O tucano falou sobre Saúde 19 vezes – menos do que Dilma, que citou o termo em 23 momentos do discurso.
“Quando Serra diz que é pai do Bolsa-Família, toca talvez na maior peça chave da campanha de Dilma. Dilma, por sua vez, tem falado em desoneração, bandeira do PSDB”, diz o cientista político David Flescher, da UnB.
Para o cientista político Eurico Figueiredo, da Universidade Federal Fluminense (UFF), é legítimo que Serra, por estratégia eleitoral, se apresente como defensor do Bolsa-Família: “Não dá para combater política pública aplicada por um presidente com 77% de aprovação. Mas, às vezes, tenho impressão que o discurso da Dilma é o do Serra”. (Agência Globo)
Falta profundidade nas promessas, diz especialista
Rio
As promessas, repetidas em frases pelos candidatos nas entrevistas nos primeiros dez dias de campanha e expostas nos programas de governo apresentados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mostram, na avaliação de especialistas, falta de profundidade e de preocupação em esclarecer o modo como serão cumpridas. O que não surpreende, segundo o historiador Marco Antônio Villa.
“Candidatos falam de temas clássicos, como Saúde, Educação, transporte e Segurança. O eleitor não cobra como as coisas serão feitas, o Brasil não tem tradição de querer saber como vai ser feito. Quer ouvir a proposta. Então, o candidato bate na tecla de uma ideia. Discutir orçamento não é preocupação nem do Congresso”.
Na avaliação do cientista político Eurico Figueiredo, da UFF, existe, de fato, convergência entre os discursos de Dilma e Serra. As diferenças entre os dois, segundo ele, não ficam evidentes nos discursos. “Em relação ao papel do Estado na economia, ao investimento na área social, à luta contra a inflação, nenhum dos dois disputa”.
Como exemplos de discursos vagos, especialistas apontam as promessas de acabar com a “praga destruidora do crack”, presente nos discursos de Dilma. E “dar prioridade à qualidade do ensino”, promessa que Serra vem repetindo em suas entrevistas.
Nas entrevistas e discursos, Marina Silva, candidata do PV, tem falado sobre sustentabilidade e sobre o papel do Estado na economia. Está perdendo a chance, segundo especialistas, de tratar de temas que estão na ordem do dia. (Agência Globo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário