José Caldas Costa
Já falei aqui, em outra oportunidade, sobre a Felicidade Interna Bruta, índice adotado pelo Butão, distante país asiático, contrapondo-se ao Produto Interno Bruto (PIB) do mundo ocidental. Obviamente, são culturas diferentes, mas creio que temos algo a aprender com as milenares culturas orientais, notadamente, quanto à paciência e à valoração de diferentes aspectos da vida, além da capacidade de consumo.
Já fui uma pessoa muito ansiosa por aquisições materiais nos meus tempos que reputo como de maior imaturidade, quando, igualmente por questões culturais, fui envolvido pela mesma onda avassaladora que continua sem prazo para acabar. É a própria lógica do nosso sistema de produção, com seu apêndice no sistema educacional, onde as pessoas são medidas pela sua capacidade de consumo e não pelo seu conteúdo ético-moral (só isso aqui já daria um livro, e não uma coluna).
Esse “nariz de cera” visa a uma reflexão sobre recente debate em que participei, no programa Oportunidades, mediado pelo jornalista Guilherme Klaws, na TVE-ES, sobre a interiorização do desenvolvimento. O debate contou com a participação de dirigentes públicos, professores e representantes de municípios do interior. A primeira parte vai ao ar neste sábado, 18h30, e a segunda parte na próxima semana, quinta-feira, 22 horas, com reprise no próximo sábado, 18h30.
Obviamente, que dois períodos de uma hora de um programa de televisão não são suficientes para esgotar o assunto, mas servem para levantar a discussão, que precisa continuar. Uma delas é sobre o significado de crescimento e desenvolvimento, geralmente confundidos, exceto quando comparamos os discursos com os índices disponíveis em órgãos de análise técnica, como os índices do IPEA, de desenvolvimento econômico, e GINI, de desenvolvimento social, e o IDEB, de desenvolvimento educacional.
Mas nem precisa olhar os números. Basta um pouco de sensibilidade e de apuro de olhar geográfico para perceber que alguma coisa não está assim tão bem. Crescimento econômico não representa, obrigatoriamente, desenvolvimento da sociedade. Utilizar o PIB per capta para enaltecer dirigentes públicos não é, obrigatoriamente, o caminho para indicar acerto em políticas de desenvolvimento. Vejamos o exemplo do Espírito Santo.
Pensei que estava dando uma grande contribuição para elucidar a história de meu país quando escrevi e lancei o livro “Caparaó – a primeira guerrilha contra a ditadura”. Hoje, compreendo que ajudei, sim, a desvendar um pouco da história, mas quem mais cresceu foi o próprio autor, pela oportunidade de buscar conhecimento com os entrevistados e, depois, com os interessados no tema.
No filme “Caparaó”, que utilizou o meu livro como fonte em boa medida, o cineasta Flávio Frederico recuperou, nos arquivos públicos, imagens expressivas que retratam uma época. Para nossa reflexão, uma das mais importantes foi um programa oficial do regime militar falando que o Espírito Santo “é um dos Estados mais pobres do País”, e mostra imagens de miséria em nosso território. Todas as vezes em que exibo o filme para públicos restritos (geralmente, estudantes), esta passagem chama a atenção.
Em boa medida, o Espírito Santo deve ao regime militar seu crescimento econômico, mas deve também o desequilíbrio sócio-econômico. Em 1970, a Grande Vitória tinha pouco mais de 200 mil habitantes; hoje, somente considerando os cinco municípios do núcleo principal, passa de 1,6 milhão. Os índices comprovam o que se pode observar visualmente: a capital é uma ilha de prosperidade cercada de pobreza por todos os lados.
O ciclo que ora se desencadeia provoca preocupações. Daqui a 40 anos teremos o resultado: prosperidade econômica na faixa litorânea e atraso na faixa oeste do Estado, ou seja, no interior. Por mais que os agentes públicos defendam que há um programa de interiorização do desenvolvimento, ele se mostra muito tímido diante do movimento que ocorre no litoral.
Em 40 anos, teremos uma grande mancha de ocupação demográfica, de Presidente Kennedy a São Mateus, com pequenos intervalos de mudanças no perfil do espaço geográfico, possivelmente, devidos a áreas de preservação.
O modelo concêntrico de atração de investimento será mantido. Consequentemente, de atração de gente. Haverá grande crescimento na faixa litorânea, sem, obrigatoriamente, representar desenvolvimento sócio-econômico, até pelo modelo que vem sendo adotado, com a reprodução de grandes projetos, como na época dos militares.
Sem que isso represente uma certeza, dado à baixa evolução da classe dirigente política, talvez o outro lado de nosso Estado encontre outras formas de ser feliz.
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