Acaba de chegar às livrarias um texto excepcional para a compreensão de boa parte do que foram os anos de chumbo do regime militar. Chama-se “Jornal Movimento – Uma reportagem”, de autoria do jornalista Carlos Ataujo, editado pela “Manifesto”. Através da crônica daquele bravo semanário que resistiu de 1975 a 1982, é oferecida ao leitor uma radiografia do sindicalismo da época, precisamente quando os donos do poder iam e voltavam em suas promessas liberalizantes e em seus atos truculentos.
Tão ou mais importante do que acompanhar desvios e desvãos de todos os movimentos, até do próprio jornal, será verificar como as lideranças evoluem e involuem em suas trajetórias. Tome-se o Lula, personagem quase central da narrativa, e a criação do PT, a 10 de fevereiro de 1980, no Colégio Sion, em São Paulo.
Naqueles idos o já nacionalmente conhecido líder sindical atravessava o rubicão das campanhas salariais e reivindicatórias para ingressar na selva político-partidária. Vale citar alguns conceitos por ele expressos na primeira Convenção Nacional da legenda, em auditório do Senado Federal:
“O PT nasce da consciência que os trabalhadores conquistaram de que não podem ser massa de manbra de políticos da burguesia. Não seremos, jamais, um partido de crentes ou de ateus. Para nós, a divisão é outra, entre os que estão do lado da libertação e os que estão do lado da opressão. O PT jamais representará os interesses do capital. (...) Qual a ideologia do PT? Sabemos que o mundo caminha para o socialismo. Queremos uma sociedade sem exploradores. Queremos mudar a relação entre capital e trabalho. Queremos que os trabalhadores sejam donos dos meios de produção e dos frutos de seu trabalho. Essa é uma sociedade socialista. (...) O PT não será um partido social-democrata interessado em buscar paliativos para as desigualdades do capitalismo.”
Quem te viu, quem te vê. Tanto o Lula quanto o PT transmudaram-se em ritmo invulgar. Da assinatura da “Carta aos Brasileiros”, renegando os postulados da criação do PT e aderindo ao neoliberalismo, aos tempos atuais, a distância é tão grande quanto os trajetos hoje feitos pelo ex-presidente, ao redor do mundo, em jatinhos de empresários e empreiteiros, para faturar 300 mil reais em cada palestra, das múltiplas que pronuncia. Claro que o Lula é dono dos frutos do seu trabalho, mas não é o de torneiro-mecânico. Seus objetivos ficam longe daqueles anunciados para os trabalhadores. Paliativos para as desigualdades do capitalismo tem sido o bolsa-família e similares, ao tempo em que do lado da libertação ele não parece estar. Talvez do outro, da opressão.
Quanto ao Partido dos Trabalhadores, quanta desilusão. Transformou-se no partido dos mensalões, dos aloprados e dos aferrados aos DAS. Para não falar dos feudos conquistados na administração federal e do gradativo desinteresse de suas bancadas por projetos sociais, fixadas exclusivamente em nomeações e na ocupação de cargos públicos. Talvez por isso os inspiradores do discurso acima referido do Lula já o tenham abandonado faz muito: Francisco Weffort e frei Beto...
Carlos Chagas.
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