sexta-feira, 12 de agosto de 2011

BASE ALIADA DE DILMA: O PERIGO QUE MORA AO LADO.

O governo Dilma conta com uma ampla base de aliança; mas a crise expõe a barganha em troca de cargos

As crises políticas do governo Dilma Rousseff (PT) trouxeram à tona os vícios do chamado "presidencialismo de coalizão" no modelo político-institucional brasileiro. Para formar uma base governista que dê suporte para o Executivo aprovar matérias de seu interesse no Congresso, a moeda de troca passa a envolver cargos, emendas orçamentárias e loteamento de ministérios e estatais.


Nessas estruturas de poder, partidos e seus "caciques" montam "feudos", favorecem amigos e acabam virando alvo de denúncias de corrupção e propina, fraude em licitações e suspeitas de enriquecimento pessoal e caixa de campanha. A sombra de irregularidades pairou sobre a base parlamentar de Dilma em escândalos recentes como o do PR nos Transportes, do PMDB na Agricultura, do PP nas Cidades e de PT e PMDB no Turismo.

A principal crítica de especialistas a esse modelo brasileiro é a seguinte distorção: a coalização construída para governar não prioriza um projeto de país, como frisa o cientista político Sérgio Abranches. A aliança programática é critério secundário em uma cultura de coligações que distribui o poder e polpudas fatias do orçamento entre grandes e microlegendas que apoiam o governante. No caso de democracias parlamentaristas européias, a coalizão, que faz o primeiro ministro, faz indicações políticas, mas se pauta pela agenda de programática.

Altos e baixosDilma hoje vive indisposições com uma base insegura depois da "faxina" na qual demitiu 27 nos Transportes e de uma operação que prendeu 35 no Turismo, cujo ministro Pedro Novais é indicado do presidente do Senado José Sarney (PMDB). Na Agricultura, denúncias de propina fragilizaram o ministro Wagner Rossi (PMDB), indicado do vice-presidente Michel Temer (PMDB).

Já o ministro das Cidades foi acusado de favorecer empresas doadoras de campanhas de seu partido, PP. O primeiro ministro a cair foi o da Casa Civil, Antonio Palocci (PT), acuado pela denúncia de enriquecimento meteórico. Alfredo Nascimento (PR) caiu em julho por fraudes reveladas em contratos de Transportes.

Os altos e baixos sobre o desmonte de "esquemas" até agora revelados tem preocupado siglas como o PMDB. Comandada por Temer e Sarney, a sigla é fragmentada em facções internas de poder, reune quadros progressistas e fisiológicos e está dentro de todos os governos desde a redemocratização, em 1985.

A costura com esse partido fez o PT do ex-presidente Lula viabilizar a vitória de Dilma em 2010. Nesta gestão, é constante o atrito das duas siglas, tanto que a preocupação do Palácio do Planalto é mais com a manutenção da base do que com a frágil oposição, sem maioria para impor derrotas ao Executivo. Tentam assinaturas para emplacar as CPIs dos Transportes e da Corrupção.

É o chamado "fogo amigo" que assombra o Executivo, pois os partidos aliados podem "sabotar" uns aos outros quando uma crise surge ou chamuscar algum ministro na berlinda. Assim, a preocupação passa a ser afagar a base parlamentar com cargos, liberação de emendas e espaços de poder na máquina federal.

foto: ABr
Presidente Dilma Rousseff (PT) - Editoria: Política - Foto: ABr
A relação de presidentes e Parlamento
Sarney:
Herdou alianças de Tancredo na abertura política. Governo (1985/90) considerado fisiológico. Concedeu canais de rádio e TV a aliados.
Collor:
Não teve base aliada sólida. Sofreu impeachment no Congresso. Vice Itamar Franco assumiu com coalizão em 1992 e lançou Plano Real.
FHC: Bloco com Sarney e ACM abafava crises e garantia governabilidade. Compra de votos para aprovar sua reeleição virou escândalo.
Lula: Quando Roberto Jefferson (PTB) viu o ?quarteirão isolado?, denunciou e implodiu o mensalão. Lula refez a política de alianças.
Dilma: Com Lula e Palocci atuando, exerceu pouca articulação política. Agora, faz ?faxina? e toma rédeas do governo em altos e baixos com a base.
Desafios no Congresso
A necessidade de ter uma base sólida no Congresso será testada à exaustão este semestre. Há polêmicas propostas a serem votadas que causam impactos vultuosos nas contas da União e mexem com a receita dos Estados. Exemplos: a PEC 300, que fixa piso nacional para policiais e bombeiros; a nova divisão dos royalties do petróleo e gás, que opõe estados produtores e não produtores; e a Emenda 29, que fixa percentuais de investimento de União, Estados e municípios em Saúde.

Uma base rebelde, se articulada, pode obstruir, inviabilizar ou fazer o governo adiar pautas que considere importantes. A votação do novo Código Florestal na Câmara foi uma derrota para o Planalto, provocada por aliados. A meta agora é reverter no Senado, sem anistiar desmatadores. O senador Ricardo Ferraço (PMDB) apoia a CPI dos Transportes e se diz "independente" na base. Em discurso na Casa, disse que "em nome da governabilidade, optamos por um pragmatismo que beira irresponsabilidade, em função do patrimonialismo e do aparelhamento dos cargos de confiança".

HistóricoDe todo modo, a relação delicada com a base não é exclusiva de Dilma. Seus antecessores viveram momentos de altos e baixos na coalizão. José Sarney distribuiu canais de rádio e TV para agradar aliados e prorrogar o mandato; Fernando Collor (PTB) perdeu o controle da base e sofreu impeachment; Fernando Henrique Cardoso (PSDB) sofreu denúncias de compra de votos para aprovar reeleição.

Já Lula viu sua aliança implodir com a revelação de pagamento à base parlamentar, esquema chamado de mensalão. Depois, ele refez critérios de aliança política, estabeleceu parceria estratégica com o PMDB intensificada no segundo mandato e levou Dilma à presidência.

Esse bloco amplo de alianças sem identidade programática atende a múltiplos interesses de PT, PMDB, PTB, PDT, PP, PR, PSB, PCdoB e outros. Os nacos de poder se assemelham, diante da opinião pública, a um balcão de negócios a partir das negociações fisiológicas das bancadas e "caciques". Tudo isso sem uma regra clara de fidelidade partidária ou uma cláusula de barreira à formação de tantas siglas no arranjo político nacional. Sem mudanças à vista na cultura e no modelo, só resta esperar o próximo escândalo.

Análise:
"Dilma pode enfrentar banda podre"
Sérgio Abranches Cientista político

Como não temos um partido dominante, a presidente tem que fazer coalizão para governar, mas isso não a obriga a fazer acordos clientelistas e fisiológicos, como Lula fez. O incentivo à corrupção não é inerente à coalizão adotada no parlamentarismo europeu. Só que, no Brasil, temos tradição de favorecimento de grupos desde a época colonial, de elites se apropriando de nacos do Estado ?provedor?. Há desfaçatez nessas práticas nocivas. Eleições são disputadas no marketing, com pouca discussão de políticas públicas. Quando os eleitos formam o governo, fazem nova coalizão distribuindo cargos e verbas do Orçamento, sem discutir programas. Dilma rompeu com comportamento de Lula de dizer que envolvidos em corrupção são inocentes. Ela decidiu demitir e afastar acusados, como fazem outras democracias, e fez um bem ao país rompendo a cultura de complacência. Os partidos podem até fazer chantagem, mas a presidente pode governar com técnicos e políticos, inclusive da oposição, que não compactuam com irregularidades. Ao contrário de Lula, não acho que o Congresso tem 300 picaretas. Dilma ficará na História se levar a ferro e fogo o combate à corrupção. Ela tem apoio da sociedade na faxina, está tomando as rédeas do governo e pode enfrentar a banda podre dos partidos se unindo à banda boa.

Multipartidarismo
R$ 214,6 bilhões

É o orçamento total dos ministérios do PT em 2011. Em 2010, o PMDB geriu R$ 150 bilhões; e o PT, R$ 153 bilhões.
27 partidoscom registro nacional
Do total, 22 atuam no Congresso numa fragmentação sem identidade programática nem regra clara de fidelidade.
A "Coalizão"
Acordos:
"Coalizão" refere-se a acordos entre partidos (normalmente em torno da ocupação de cargos no governo) e alianças (dificilmente em torno de ideias ou programas) entre forças políticas para alcançar objetivos. Na maioria das vezes a coalizão é feita para sustentar um governo, dando-lhe suporte político no Legislativo (em primeiro lugar) e influenciando na formulação das políticas (secundariamente).
Maiorias: Pelo sistema, o presidente da República se elege com maioria dos votos, mas é obrigado a formar coalizões no Congresso Nacional, porque seu partido em geral não conquista a maior parte das cadeiras na Câmara ou no Senado. A construção de maiorias legislativas passa pela troca de recursos econômicos, como emendas orçamentárias (inclusive restos a pagar prorrogados de emendas, conforme faz Dilma) e cargos.

Fonte: A Gazeta

Um comentário:

  1. Porquê nos casos de corrupção neste país os culpados sempre são os acessores e os "chefes" nunca sabem de nada ? Porquê até nos casos envolvendo parentes e assessores próximos, os "manda chuvas" nunca são responsabilizados ? Porquê apenas os assessores vão p´resos e seus "chefes" permanecem impunes ?
    Ah ... isso é Brasil, isso é Brasil, isso é Brasil ...

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