Por que estados e municípios têm piso mínimo de investimentos em saúde, respectivamente de 12% e 15%, e a União não tem? A pergunta, formulada há dias pelo senador Aécio Neves, traduz, na falta de uma resposta lógica e racional para essa insólita distorção no financiamento público da saúde no Brasil, a incoerência que vem norteando as políticas públicas do governo federal para com um setor essencial para a imensa maioria da população brasileira que depende exclusivamente dos serviços do Sistema Único de Saúde, o SUS, que na letra constitucional tem por norma a universalização do atendimento.
A Emenda 29, que era a grande esperança para uma efetiva mudança no financiamento da saúde pública nacional, acabou sendo aprovada pelo Senado e teve sua regulamentação publicada na última segunda-feira, sem obrigar a União a comprometer-se com a aplicação de um índice mínimo de recursos na saúde, embora obrigue estados e municípios a responderem pelo piso acima mencionado.
Trata-se de um disparate, que fere gravemente os mais elementares princípios do sistema federativo nacional.
Mesmo a emenda de um ex-senador do PT e hoje governador do Acre, Tião Viana, que previa a destinação de 10% das receitas da União para investimentos na saúde, assegurando mais recursos, da ordem de R$ 60 bilhões, para o financiamento do setor em 2012, acabou sendo vencida, como também foi vetado pelo Planalto até mesmo o artigo que previa mais recursos da União para em caso de revisão do valor do Produto Interno Bruto (PIB).
Esse incompreensível descompromisso da União para com a saúde pública, deixando que os ônus recaiam sobre estados e municípios, também se revela nos investimentos federais para o setor, que caíram 10% ao longo da última década, além de apresentarem uma defasagem de cerca de R$ 46 bilhões entre os valores orçamentários empenhados e aqueles efetivamente gastos na saúde nesse período. Essa colossal diferença, jogada nos "restos a pagar", tem como resultado final o seu sumário cancelamento.
Isso explica por que, na última pesquisa CNI/Ibope, mais de 60% da população brasileira desaprova o serviço público de saúde, classificando-o como "ruim" ou "péssimo", enquanto 85% dos brasileiros afirmam não ter percebido qualquer avanço no sistema público de saúde nos últimos anos.
O governo federal perdeu uma extraordinária oportunidade de dar uma contribuição efetiva à melhoria da saúde pública no Brasil, ao negar apoio à emenda que destinava 10% das receitas da União ao setor, o que seria perfeitamente plausível considerando que o governo federal concentra, hoje, 70% do bolo tributário nacional, ao mesmo tempo em que sua arrecadação vem crescendo de modo contínuo.
Se tudo isso não bastasse, acrescente-se que o setor não foi poupado sequer pela Emenda Constitucional 61, que prorrogou até 31 de dezembro de 2015 a vigência da Desvinculação de Receitas da União (DRU). Assim, recursos antes previstos para investimento em saúde serão drenados para o governo federal usar livremente, "sem carimbo", correspondendo a 20% da arrecadação dos tributos federais, em um montante estimado em R$ 62,4 bilhões.
É chegado, pois, o tempo de restaurar a Federação brasileira, a fim de garantir solidariedade e responsabilidade compartilhadas entre União, estados e municípios, com mais justa repartição de tributos e graus maiores de autonomia política e administrativa dos entes federados. O Estado democrático exige hoje a remoção desse verdadeiro "entulho autoritário", configurado na hiperconcentração de poderes na União, na contramão de uma nação que acaba de ser reconhecida como a 6ª economia do mundo.
Alberto Pinto Coelho
A Emenda 29, que era a grande esperança para uma efetiva mudança no financiamento da saúde pública nacional, acabou sendo aprovada pelo Senado e teve sua regulamentação publicada na última segunda-feira, sem obrigar a União a comprometer-se com a aplicação de um índice mínimo de recursos na saúde, embora obrigue estados e municípios a responderem pelo piso acima mencionado.
Trata-se de um disparate, que fere gravemente os mais elementares princípios do sistema federativo nacional.
Mesmo a emenda de um ex-senador do PT e hoje governador do Acre, Tião Viana, que previa a destinação de 10% das receitas da União para investimentos na saúde, assegurando mais recursos, da ordem de R$ 60 bilhões, para o financiamento do setor em 2012, acabou sendo vencida, como também foi vetado pelo Planalto até mesmo o artigo que previa mais recursos da União para em caso de revisão do valor do Produto Interno Bruto (PIB).
Esse incompreensível descompromisso da União para com a saúde pública, deixando que os ônus recaiam sobre estados e municípios, também se revela nos investimentos federais para o setor, que caíram 10% ao longo da última década, além de apresentarem uma defasagem de cerca de R$ 46 bilhões entre os valores orçamentários empenhados e aqueles efetivamente gastos na saúde nesse período. Essa colossal diferença, jogada nos "restos a pagar", tem como resultado final o seu sumário cancelamento.
Isso explica por que, na última pesquisa CNI/Ibope, mais de 60% da população brasileira desaprova o serviço público de saúde, classificando-o como "ruim" ou "péssimo", enquanto 85% dos brasileiros afirmam não ter percebido qualquer avanço no sistema público de saúde nos últimos anos.
O governo federal perdeu uma extraordinária oportunidade de dar uma contribuição efetiva à melhoria da saúde pública no Brasil, ao negar apoio à emenda que destinava 10% das receitas da União ao setor, o que seria perfeitamente plausível considerando que o governo federal concentra, hoje, 70% do bolo tributário nacional, ao mesmo tempo em que sua arrecadação vem crescendo de modo contínuo.
Se tudo isso não bastasse, acrescente-se que o setor não foi poupado sequer pela Emenda Constitucional 61, que prorrogou até 31 de dezembro de 2015 a vigência da Desvinculação de Receitas da União (DRU). Assim, recursos antes previstos para investimento em saúde serão drenados para o governo federal usar livremente, "sem carimbo", correspondendo a 20% da arrecadação dos tributos federais, em um montante estimado em R$ 62,4 bilhões.
É chegado, pois, o tempo de restaurar a Federação brasileira, a fim de garantir solidariedade e responsabilidade compartilhadas entre União, estados e municípios, com mais justa repartição de tributos e graus maiores de autonomia política e administrativa dos entes federados. O Estado democrático exige hoje a remoção desse verdadeiro "entulho autoritário", configurado na hiperconcentração de poderes na União, na contramão de uma nação que acaba de ser reconhecida como a 6ª economia do mundo.
Alberto Pinto Coelho
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