quinta-feira, 3 de junho de 2010

A compadecida diplomacia amoral de Lula.

Elio Gaspari

Dilma e Vannuchi precisam ler o que acontece aos presos na ditadura do companheiro Ahmadinejad


A CANDIDATA DILMA Rousseff e o companheiro Paulo Vannuchi, secretário nacional de Direitos Humanos, precisam ler "Death to the Dictator!" ("Morte ao Ditador!"), livrinho de 169 páginas que saiu nos Estados Unidos, contando a história de um jovem de 25 anos que foi preso pela milícia iraniana no dia 5 de agosto do ano passado, durante um protesto contra a posse de Mahmoud Ahmadinejad na Presidência.
Ele passou 28 dias nos calabouços da República Islâmica. Ambos conheceram a rotina dos porões da ditadura brasileira e podem avaliar o que sucede no Irã enquanto Nosso Guia apoia a ditadura que esmagou a sociedade civil iraniana.
Ex-presos políticos, Dilma e Vannuchi podem entender o que sucedeu ao ex-metalúrgico Mohsen (um pseudônimo, bem como o da autora, cujas qualificações foram verificadas pelo colunista Roger Cohen, do "New York Times").
Ele era um ativista periférico e participou de passeatas e quebra-quebras nas semanas seguintes à eleição. Preso, foi levado para a prisão de Evin, a Bastilha de Teerã, desde o tempo do Xá. Os presos ficavam nas celas algemados, encapuzados e obrigados ao silêncio.
Na linguagem do porão, Mohsen "quebrou" na primeira surra. Isso ficou claro quando confirmou ter participado de reuniões e projetos inexistentes, inventados pelos interrogadores. Mohsen ficou poucos dias em Evin. Foi transferido para outro calabouço, onde o regime guardava bandidos, traficantes e cafetões.
Lá, não mais o interrogavam. Os policiais o espancavam em nome do "Deus misericordioso e compadecido..." e um deles ordenou: "Engravide-o". Outro disse-lhe: "Você quer de volta o seu voto?" Mohsen, como seus companheiros de cela, era violentado todos os dias, às vezes mais de uma vez. Três semanas depois jogaram-no numa beira de estrada.
Quando reencontrou a família, pediu que o levassem a um médico que não o conhecesse.
Na noite da eleição, em junho passado, o presidente Ahmadinejad ironizou esportivamente os protestos: "É como no futebol, todo mundo acha que vai ganhar". No dia seguinte, Lula, recorreu à mesma metáfora: "Por enquanto, é apenas uma coisa entre flamenguistas e vascaínos".
O médico que cuidou de Mohsen disse à sua mãe que vigiasse o filho, pois vira casos semelhantes e muitos jovens mataram-se.
O que aconteceu no Irã depois que a Guarda Revolucionária se impôs nas ruas, nas empresas, nos meios de comunicação e no aparelho judiciário não foi coisa de flamenguistas ou de vascaínos.
O beneplácito misericordioso e compadecido que, desde então, Lula dá a Ahmadinejad, suja com a marca da amoralidade a diplomacia brasileira. Esse beneplácito faz com que soe parcial quando condena as ações de Israel.
Razões de Estado podem levar o governo turco, que tem uma extensa fronteira com o Irã, a cultivar uma política de boa vizinhança com Ahmadinejad, mas Brasília fica a 11 mil quilômetros dessa encrenca.
Lula argumenta que exerce no Oriente Médio uma função pacificadora, porque o Brasil "cansou de ser tratado como segunda classe". Expandindo contenciosos e importando conflitos que pouco têm a ver com o interesse brasileiro, pratica uma agenda de terceira.

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