“ ...Acho que os nossos antepassados nos deixaram um país com fronteiras tranquilas, sem nenhum atrito com países que tenham fronteira com o Brasil. A nossa história foi construída não com batalhas, foi construída com a capacidade de os nossos antepassados de negociarem a formação do país, de maneira que tenho muita preocupação de que hoje tenhamos oportunidade de abrir questões históricas, que devem ser encerradas para frente em um interesse nacional.” (Portal G1 – 13 Jun) – declarações do Senador José Sarney.
“...(Sarney) reclamou que foi mal interpretado nas declarações que deu na última segunda-feira (13) sobre o assunto. Sarney ressaltou que quando usou o termo “abertura de feridas” referiu-se à possibilidade de que, a partir da divulgação de documentos históricos da delimitação das fronteiras, fossem criados problemas já superados com países como a Bolívia e o Peru, por exemplo. (Portal R7 – 14 Jun) – sobre declarações do Senador José Sarney.
Se proposital ou não, o Senador José Sarney, ao justificar nos últimos dias por que alguns assuntos de governo devem ficar submetidos a sigilo eterno, foi soltando, de forma clara, pistas de que fazia referência a problemas relacionados com a formação das fronteiras do Brasil. Chamou-me a atenção o fato de o acompanhar nesse ponto de vista o Senador Fernando Collor (também ex-presidente), mas não o faz o também Senador e ex-Presidente Itamar Franco.
O Senador Sarney, em seus comentários sobre o assunto, declarou que “A nossa história foi construída não com batalhas...” e que a formação das fronteiras do Brasil se deu uma forma tranquila e negociada não cabendo reabrir feridas com nossos vizinhos.
Senador Sarney! Com as devidas vênias, Vossa Excelência tem a obrigação de não ser descuidado em suas declarações, simplificando dessa forma a História do Brasil. Fronteiras negociadas? Sim. Mas tranquilas? Não. Que o digam os gaúchos, os mato-grossenses, os nordestinos, amazonenses e acreanos de cada época.
A definição da fronteira ao Sul foi marcada por guerras e guerrilhas entre luso-brasileiros e os povos de origem espanhola. Chegou a ser denominada de “fronteira do vai e vem” devido a ora estar demarcada por uma linha mais ao Sul e, logo depois, por conta de uma guerra ou de um tratado não bem aceito regionalmente, ser transportada mais para o Norte. E nesse “vai e vem” da fronteira, que chegou a ser demarcada pelo Rio da Prata, muito sangue de brasileiros correu, em repetidas refregas com os “orientales” e “correntinos” e, até mesmo, com povos indígenas de ascendência guarani, gênese da tradição missioneira gaúcha.
Vossa Excelência tem por obrigação saber que, dentre outros, um dos motivos para a criação do Uruguai como país foi dar um fim a essas refregas, comportando-se a nova nação como um “estado tampão” entre o Império Brasileiro e a Argentina, ou como “um algodão entre cristais”, no dizer de outros.
Deve-se lembrar também que, no primeiro ano da Guerra da Tríplice Aliança, o Paraguai invadiu o Brasil por duas frentes, por Forte Coimbra e Dourados, no Mato Grosso, e por São Borja, no Rio Grande do Sul e, do mesmo modo que no Sul, também a Oeste muito sangue foi derramado, com incontáveis atos de heroísmo protagonizados por civis e militares brasileiros.
Depois, já na República, nordestinos, principalmente cearenses, e amazonenses, ao comando de Plácido de Castro, bateram-se em guerra contra o exército da Bolívia, na região em que hoje fica o nosso Estado do Acre, onde mais sangue foi derramado, o inimigo, derrotado e o Brasil, com luta, ali firmou pé.
Dito isto, desculpe-me por relembrar, Senador, que muito se lutou pelas fronteiras que hoje temos e, se negociações foram importantes, também o foi o espírito de luta dos brasileiros. Fronteiras negociadas? Sim, mas, tranquilas? Nunca.
Prosseguindo em suas descuidadas declarações sobre assuntos de relevância nacional, o Senador Sarney esclareceu um pouco mais a charada, por ele mesmo lançada, dizendo, em 14 de junho, que o que se queria era evitar problemas com a Bolívia e o Peru.
Por sua condição privilegiada de acesso a documentos ultrassecretos relacionados com os dois Tratados de Petrópolis (1903 e 1908), que, respectivamente, definiram as fronteiras com a Bolívia e com o Peru, é de se supor que sucessivos ex-presidentes tenham tomado conhecimento de prováveis cláusulas confidenciais, ou mesmo detalhes das negociações, que nem imaginamos. O que se sabe é que as articulações políticas pela fronteira com a Bolívia, no atual Acre, custaram muito caro ao Brasil, financeiramente falando, em que pese as declarações do atual presidente da Bolívia, em maio de 2006, quando disse que o Acre fora trocado com o Brasil por um cavalo. E o dinheiro com que o Brasil indenizou a Bolívia? Ficou com quem?
Quando da definição da fronteira com o Peru, mais atritos fronteiriços com mortes aconteceram, embora de pequena monta, sem configurar uma guerra. Mas isso importa aos que morreram? Em função do Tratado de Petrópolis de 1908, um tanto da terra que recém tínhamos comprado da Bolívia, foi entregue aos peruanos.
Portanto, como cidadão e militar, peço a devida vênia para dizer ao Senador José Sarney que as fronteiras brasileiras, se não no seu todo, mas em significativa parte de sua extensão, podem sim ter sido negociadas, mas, antes, sem nada de tranquilo, foram conquistadas, mantidas e restauradas com o sangue de muitos brasileiros (...o que se espera não aconteça quando o Brasil – no futuro - tiver que retomar a região do Maranhão).
Jorge Alberto Forrer Garcia - Coronel Reformado do Exército
“...(Sarney) reclamou que foi mal interpretado nas declarações que deu na última segunda-feira (13) sobre o assunto. Sarney ressaltou que quando usou o termo “abertura de feridas” referiu-se à possibilidade de que, a partir da divulgação de documentos históricos da delimitação das fronteiras, fossem criados problemas já superados com países como a Bolívia e o Peru, por exemplo. (Portal R7 – 14 Jun) – sobre declarações do Senador José Sarney.
Se proposital ou não, o Senador José Sarney, ao justificar nos últimos dias por que alguns assuntos de governo devem ficar submetidos a sigilo eterno, foi soltando, de forma clara, pistas de que fazia referência a problemas relacionados com a formação das fronteiras do Brasil. Chamou-me a atenção o fato de o acompanhar nesse ponto de vista o Senador Fernando Collor (também ex-presidente), mas não o faz o também Senador e ex-Presidente Itamar Franco.
O Senador Sarney, em seus comentários sobre o assunto, declarou que “A nossa história foi construída não com batalhas...” e que a formação das fronteiras do Brasil se deu uma forma tranquila e negociada não cabendo reabrir feridas com nossos vizinhos.
Senador Sarney! Com as devidas vênias, Vossa Excelência tem a obrigação de não ser descuidado em suas declarações, simplificando dessa forma a História do Brasil. Fronteiras negociadas? Sim. Mas tranquilas? Não. Que o digam os gaúchos, os mato-grossenses, os nordestinos, amazonenses e acreanos de cada época.
A definição da fronteira ao Sul foi marcada por guerras e guerrilhas entre luso-brasileiros e os povos de origem espanhola. Chegou a ser denominada de “fronteira do vai e vem” devido a ora estar demarcada por uma linha mais ao Sul e, logo depois, por conta de uma guerra ou de um tratado não bem aceito regionalmente, ser transportada mais para o Norte. E nesse “vai e vem” da fronteira, que chegou a ser demarcada pelo Rio da Prata, muito sangue de brasileiros correu, em repetidas refregas com os “orientales” e “correntinos” e, até mesmo, com povos indígenas de ascendência guarani, gênese da tradição missioneira gaúcha.
Vossa Excelência tem por obrigação saber que, dentre outros, um dos motivos para a criação do Uruguai como país foi dar um fim a essas refregas, comportando-se a nova nação como um “estado tampão” entre o Império Brasileiro e a Argentina, ou como “um algodão entre cristais”, no dizer de outros.
Deve-se lembrar também que, no primeiro ano da Guerra da Tríplice Aliança, o Paraguai invadiu o Brasil por duas frentes, por Forte Coimbra e Dourados, no Mato Grosso, e por São Borja, no Rio Grande do Sul e, do mesmo modo que no Sul, também a Oeste muito sangue foi derramado, com incontáveis atos de heroísmo protagonizados por civis e militares brasileiros.
Depois, já na República, nordestinos, principalmente cearenses, e amazonenses, ao comando de Plácido de Castro, bateram-se em guerra contra o exército da Bolívia, na região em que hoje fica o nosso Estado do Acre, onde mais sangue foi derramado, o inimigo, derrotado e o Brasil, com luta, ali firmou pé.
Dito isto, desculpe-me por relembrar, Senador, que muito se lutou pelas fronteiras que hoje temos e, se negociações foram importantes, também o foi o espírito de luta dos brasileiros. Fronteiras negociadas? Sim, mas, tranquilas? Nunca.
Prosseguindo em suas descuidadas declarações sobre assuntos de relevância nacional, o Senador Sarney esclareceu um pouco mais a charada, por ele mesmo lançada, dizendo, em 14 de junho, que o que se queria era evitar problemas com a Bolívia e o Peru.
Por sua condição privilegiada de acesso a documentos ultrassecretos relacionados com os dois Tratados de Petrópolis (1903 e 1908), que, respectivamente, definiram as fronteiras com a Bolívia e com o Peru, é de se supor que sucessivos ex-presidentes tenham tomado conhecimento de prováveis cláusulas confidenciais, ou mesmo detalhes das negociações, que nem imaginamos. O que se sabe é que as articulações políticas pela fronteira com a Bolívia, no atual Acre, custaram muito caro ao Brasil, financeiramente falando, em que pese as declarações do atual presidente da Bolívia, em maio de 2006, quando disse que o Acre fora trocado com o Brasil por um cavalo. E o dinheiro com que o Brasil indenizou a Bolívia? Ficou com quem?
Quando da definição da fronteira com o Peru, mais atritos fronteiriços com mortes aconteceram, embora de pequena monta, sem configurar uma guerra. Mas isso importa aos que morreram? Em função do Tratado de Petrópolis de 1908, um tanto da terra que recém tínhamos comprado da Bolívia, foi entregue aos peruanos.
Portanto, como cidadão e militar, peço a devida vênia para dizer ao Senador José Sarney que as fronteiras brasileiras, se não no seu todo, mas em significativa parte de sua extensão, podem sim ter sido negociadas, mas, antes, sem nada de tranquilo, foram conquistadas, mantidas e restauradas com o sangue de muitos brasileiros (...o que se espera não aconteça quando o Brasil – no futuro - tiver que retomar a região do Maranhão).
Jorge Alberto Forrer Garcia - Coronel Reformado do Exército
Nenhum comentário:
Postar um comentário