Não votei na senhora. Aliás, em São Paulo, o lulismo nunca deu muito certo. Vocês já disputaram várias eleições por aqui. Para governador não levaram nenhuma. E isso desde a fundação do PT. Já em 1982, quando foi realizada a primeira eleição direta para o cargo - eu bem me recordo -, o próprio Lula se apresentou como candidato e levou uma bela surra: acabou em quarto lugar. Eleições para presidente, de seis vocês só levaram uma, a de 2002. E já no pleito seguinte foram sovados novamente.
O povo daqui é ordeiro e trabalhador. Vai ver que é por isso que não gosta de vocês. Pelo menos a maior parte dele. A gente torce o nariz à forma como os petistas fazem política.
Vocês se deram bem no começo por se dizerem diferentes de tudo o que existia. Agora, quatro décadas passadas, continuam a se achar assim. São ripongas, ou seja, hippies fora de época: gente que não soube envelhecer com dignidade.
O fato é que a hora da revolução já passou. E, quando passou, vocês estavam dormindo. Paciência. Como leão desdentado também ruge, vocês, petistas, acreditam poder continuar na estrada.
Naquelas "pré-históricas" eleições de 1982, o slogan do partido era: "Vote em Lula, um brasileiro igualzinho a você". Para reforçar o apelo, o candidato deixou a gravata e o paletó de lado e comparecia aos debates televisivos apenas com uma camiseta. Não funcionou. Pesquisas posteriores demonstraram que as pessoas, em geral, pensavam: "Se ele é igual à gente, por que não vem aqui pegar no pesado? Nós queremos votar em alguém que seja melhor".
Bem, senhora presidente, como Vossa Excelência não é daqui e naquela época nem sequer era petista, esses assuntos devem parecer-lhe tediosos. Vamos, então, direto ao que realmente interessa.
Acontece que nós, paulistas, mesmo não tendo contribuído para a sua vitória eleitoral, por alguns momentos acreditamos que o seu governo, em relação ao anterior, representaria um avanço. Ainda antes de ser empossada, a senhora cuidou de descartar Celso Amorim, encerrando, assim, a política externa de "pragmatismo irresponsável" que ele representava. A gente passava vergonha lá fora com as diabruras do ex-chanceler. Ele que vá procurar emprego no Irã ou na Venezuela.
Essa sua atitude, presidente Dilma, contribuiu muito para incrementar o seu prestígio por aqui. Aumentou a nossa esperança no futuro. Também quando a senhora confrontou as centrais sindicais, no início do ano, a imagem que nos passou foi a de uma nova "dama de ferro". E isso alimentou ainda mais os nossos bons augúrios.
Mas, vou ser sincero, é muito frustrante perceber que todas essas nossas expectativas estão se demonstrando vãs, em razão dos fatos ocorridos nos últimos tempos. O que parece é que os governantes da era lulista têm sido muito infelizes com as suas escolhas para a Casa Civil. Os que ousam sentar-se naquela cadeira quase sempre dela são ejetados. E ficam, para sempre, sob suspeita.
Todos nós sabemos, senhora presidente, que Antônio Palocci tem sido o seu principal auxiliar no governo. Como o foi também Erenice Guerra, na gestão anterior. E antes disso havia, ainda, José Dirceu. Pelo visto, somente a senhora, no posto, teve um comportamento irreprovável.
De duas, uma. Se a senhora realmente acredita que os dois primeiros sejam inocentes, saia imediatamente em defesa deles. Não se conhece nenhuma palavra sua nesse sentido. E ambos foram escolhidos pessoalmente pela senhora. Omitir-se, simplesmente, não lhe fica bem. Ou, então, se não pretende arder no inferno com eles, a senhora deve assumir que selecionar recursos humanos não é mesmo o seu forte. Cuide de bem administrar e delegue essa tarefa à alta burocracia do Estado, aos partidos que a apoiam ou - quem sabe - até mesmo a uma empresa de headhunting.
Mas, até agora, não se verificou nem uma coisa nem outra. Essa omissão acabou contribuindo para que a sua estrela esmaecesse e a de seu antecessor voltasse a brilhar.
Creio que é esse o ponto, senhora presidente. Todos nós, brasileiros - tendo ou não sufragado seu nome -, esperamos que a senhora se revele uma pessoa superior ao cidadão comum. Eu, pelo menos, tinha essa expectativa. Não a apoiei, mas entendia que, uma vez eleita, a senhora se imbuiria de sua missão. E com isso encorpasse, crescesse e ganhasse grandeza.
De um estadista, dona Dilma, não se requer, tão somente, que seja eficiente. É preciso, também, que seja eficaz. E que se mostre efetivo.
Superar-se, senhora presidente, não significa apenas pretender impor a sua vontade aos outros, mas também compreender que, na política - como na vida -, a gente não faz apenas o que quer, mas também aquilo que pode. Os parlamentares que estão no Congresso Nacional foram igualmente eleitos pelo voto popular. E, portanto, eles se sabem tão legítimos quanto a senhora. Não vale a pena confrontá-los.
É preciso ousadia, é certo. Como dizia Tancredo Neves, "ninguém chega ao Rubicão para pescar". Nem para apenas molhar os pés.
Mas é preciso, também, saber conversar. E a senhora, pelo visto, não sabe e não quer dialogar com ninguém.
A História esta aí para mostrar: os governantes que fizeram a diferença foram todos excelentes negociadores. Criavam os seus consensos, compunham as suas maiorias e sabiam, enfim, como empolgar com os seus próprios enredos.
Por outro lado, na vigência da democracia, no último meio século, apenas três presidentes acreditaram ser possível governar sem o Parlamento: um renunciou, outro foi deposto e o terceiro acabou impedido.
João Mellão Neto - O Estado de S.Paulo
O povo daqui é ordeiro e trabalhador. Vai ver que é por isso que não gosta de vocês. Pelo menos a maior parte dele. A gente torce o nariz à forma como os petistas fazem política.
Vocês se deram bem no começo por se dizerem diferentes de tudo o que existia. Agora, quatro décadas passadas, continuam a se achar assim. São ripongas, ou seja, hippies fora de época: gente que não soube envelhecer com dignidade.
O fato é que a hora da revolução já passou. E, quando passou, vocês estavam dormindo. Paciência. Como leão desdentado também ruge, vocês, petistas, acreditam poder continuar na estrada.
Naquelas "pré-históricas" eleições de 1982, o slogan do partido era: "Vote em Lula, um brasileiro igualzinho a você". Para reforçar o apelo, o candidato deixou a gravata e o paletó de lado e comparecia aos debates televisivos apenas com uma camiseta. Não funcionou. Pesquisas posteriores demonstraram que as pessoas, em geral, pensavam: "Se ele é igual à gente, por que não vem aqui pegar no pesado? Nós queremos votar em alguém que seja melhor".
Bem, senhora presidente, como Vossa Excelência não é daqui e naquela época nem sequer era petista, esses assuntos devem parecer-lhe tediosos. Vamos, então, direto ao que realmente interessa.
Acontece que nós, paulistas, mesmo não tendo contribuído para a sua vitória eleitoral, por alguns momentos acreditamos que o seu governo, em relação ao anterior, representaria um avanço. Ainda antes de ser empossada, a senhora cuidou de descartar Celso Amorim, encerrando, assim, a política externa de "pragmatismo irresponsável" que ele representava. A gente passava vergonha lá fora com as diabruras do ex-chanceler. Ele que vá procurar emprego no Irã ou na Venezuela.
Essa sua atitude, presidente Dilma, contribuiu muito para incrementar o seu prestígio por aqui. Aumentou a nossa esperança no futuro. Também quando a senhora confrontou as centrais sindicais, no início do ano, a imagem que nos passou foi a de uma nova "dama de ferro". E isso alimentou ainda mais os nossos bons augúrios.
Mas, vou ser sincero, é muito frustrante perceber que todas essas nossas expectativas estão se demonstrando vãs, em razão dos fatos ocorridos nos últimos tempos. O que parece é que os governantes da era lulista têm sido muito infelizes com as suas escolhas para a Casa Civil. Os que ousam sentar-se naquela cadeira quase sempre dela são ejetados. E ficam, para sempre, sob suspeita.
Todos nós sabemos, senhora presidente, que Antônio Palocci tem sido o seu principal auxiliar no governo. Como o foi também Erenice Guerra, na gestão anterior. E antes disso havia, ainda, José Dirceu. Pelo visto, somente a senhora, no posto, teve um comportamento irreprovável.
De duas, uma. Se a senhora realmente acredita que os dois primeiros sejam inocentes, saia imediatamente em defesa deles. Não se conhece nenhuma palavra sua nesse sentido. E ambos foram escolhidos pessoalmente pela senhora. Omitir-se, simplesmente, não lhe fica bem. Ou, então, se não pretende arder no inferno com eles, a senhora deve assumir que selecionar recursos humanos não é mesmo o seu forte. Cuide de bem administrar e delegue essa tarefa à alta burocracia do Estado, aos partidos que a apoiam ou - quem sabe - até mesmo a uma empresa de headhunting.
Mas, até agora, não se verificou nem uma coisa nem outra. Essa omissão acabou contribuindo para que a sua estrela esmaecesse e a de seu antecessor voltasse a brilhar.
Creio que é esse o ponto, senhora presidente. Todos nós, brasileiros - tendo ou não sufragado seu nome -, esperamos que a senhora se revele uma pessoa superior ao cidadão comum. Eu, pelo menos, tinha essa expectativa. Não a apoiei, mas entendia que, uma vez eleita, a senhora se imbuiria de sua missão. E com isso encorpasse, crescesse e ganhasse grandeza.
De um estadista, dona Dilma, não se requer, tão somente, que seja eficiente. É preciso, também, que seja eficaz. E que se mostre efetivo.
Superar-se, senhora presidente, não significa apenas pretender impor a sua vontade aos outros, mas também compreender que, na política - como na vida -, a gente não faz apenas o que quer, mas também aquilo que pode. Os parlamentares que estão no Congresso Nacional foram igualmente eleitos pelo voto popular. E, portanto, eles se sabem tão legítimos quanto a senhora. Não vale a pena confrontá-los.
É preciso ousadia, é certo. Como dizia Tancredo Neves, "ninguém chega ao Rubicão para pescar". Nem para apenas molhar os pés.
Mas é preciso, também, saber conversar. E a senhora, pelo visto, não sabe e não quer dialogar com ninguém.
A História esta aí para mostrar: os governantes que fizeram a diferença foram todos excelentes negociadores. Criavam os seus consensos, compunham as suas maiorias e sabiam, enfim, como empolgar com os seus próprios enredos.
Por outro lado, na vigência da democracia, no último meio século, apenas três presidentes acreditaram ser possível governar sem o Parlamento: um renunciou, outro foi deposto e o terceiro acabou impedido.
João Mellão Neto - O Estado de S.Paulo
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