quarta-feira, 16 de novembro de 2011

BARBÁRIE ANUNCIADA

O Senado votará o projeto do Código Florestal com celeridade recorde. Se mantido o viés até agora observado, iniciado com o virulento brado do deputado Aldo Rebelo contra supostas conspirações internacionais, produzirá uma das maiores iniquidades de nossa história: uma lei injusta, insegura e inconstitucional, que premia quem desafiou a legislação e pune quem a cumpriu.

Desconsiderou-se aquilo que o IBGE constatou em 2006: 158,8 milhões de hectares de terras com potencial agrícola são ocupados por uma pecuária de baixíssima produtividade, quase três vezes a área utilizada para agricultura, 59,8 milhões de hectares. Basta o uso de tecnologia para aproveitamento mais racional e inteligente de nossas terras e recursos naturais. O projeto propõe normas que contrariam o conhecimento já produzido para permitir a consolidação de danos em áreas de preservação permanente e de reserva legal, o plantio de até 50% da reserva legal com eucaliptos e a construção de projetos habitacionais em manguezais, dentre outros absurdos, como decretar que o leito de um rio no período de cheia não é mais parte dele.

As áreas de preservação permanente - como margens de rios, encostas e manguezais - são espaços protegidos em razão de características específicas. Já as áreas de reserva legal são espaços de uma propriedade rural que devem ser mantidos com vegetação nativa para o equilíbrio ecológico da região. Sob o ponto de vista constitucional, ambas são instrumentos para conferir à propriedade privada uma função social e para garantir que o uso do patrimônio nacional representado pela Floresta Amazônica, Mata Atlântica, Serra do Mar, Pantanal Mato-Grossense e Zona Costeira seja feito dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, como preveem os artigos 186 e 225, parágrafo 4º da Constituição. Não resta dúvida de que a maior parte do projeto é inconstitucional por desconsiderar essas normas. Porém, isso sequer foi abordado.

Os impactos das alterações para o cumprimento de acordos internacionais aprovados pelo Congresso - como as Convenções sobre Mudança do Clima, a Proteção de Zonas Úmidas, a Diversidade Biológica e a de Combate à Desertificação - tampouco foram considerados. Além disso, a perpetuação de tudo o que foi desmatado ilegalmente até julho de 2008 fortalece a impunidade. É o triunfo de quem não aceita se submeter à legislação nem ao esforço dos órgãos ambientais, da sociedade civil e do Ministério Público para fazer cumpri-la, respondendo com o uso da força para mudar a lei e fazer com que tudo fique como está.

RODRIGO DA COSTA LINES é procurador da República e coordenador do Grupo de Trabalho Áreas de Preservação Permanente da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal.

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