O termo "faxina" - usado todas as vezes que a presidente petista indicou mudanças em seu primeiro escalão - foi uma das maiores marcas de 2011
Dia 8 de junho de 2011. Como se fosse a primeira peça de uma sequência de dominós enfileirados, o então ministro da Casa Civil Antonio Palocci - homem forte do PT, ligado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - viu-se tocado pelo dedo indicador da presidente Dilma Rousseff (PT). Caiu sob acusação de ter usado informações privilegiadas do governo em consultorias privadas, fazendo seu patrimônio multiplicar por 20. Atrás dele, outros cinco ministros não mantiveram-se de pé após suspeitas de corrupção.
Segundo o doutor em Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB) José Matias Pereira, o caso Palocci foi o sinal de alerta para os demais ministros. Isso porque o ex-ministro da Casa Civil já havia passado pela União entre 2003 e 2006, à frente da Fazenda. Ao retornar ao governo federal, junto de Dilma, ganhou status de "superministro": era ele quem dialogava com partidos, combinava espaços e nomes para compor o governo.
Palocci perdeu força em menos de um semestre, graças às denúncias que colocavam em voga seu aumento patrimonial entre 2006 e 2010; justamente o vácuo entre sua queda da Fazenda, sob denúncias de quebra de sigilo do caseiro Francenildo Costa (que desde o escândalo nunca mais conseguiu um emprego), e o retorno a Brasília.
"A presidente sinalizou não estar disposta a tolerar desvios na atividade pública. Palocci caiu sozinho. Quando um ministro cai como uma fruta podre, dá o sinal de que nenhum outro está imune. Os demais vieram na sequência, expondo a lógica dessa política que entrega órgãos públicos e ministérios a partidos, de porteira fechada", ponderou Pereira.
A fila de dominós
Depois de Palocci, a devassa ministerial continuou. Caíram Alfredo Nascimento (Transportes), Wagner Rossi (Agricultura), Pedro Novais (Turismo), Orlando Silva (Esporte) e Carlos Lupi (Trabalho). Sobre eles, pesaram suspeitas de cobrança de propina, favorecimento de fornecedores em troca de financiamento de campanha, uso de verba pública para fins pessoais, desvio de dinheiro e tráfico de influência. A última exoneração veio na noite de 4 de dezembro.
"A corrupção é a doença que mais mata no Brasil. Não temos sequer uma ideia clara do que é arrecadado e quanto disso chega ao destino final. Na queda dos ministros, a imprensa teve papel fundamental, porque foi ela que denunciou e acompanhou os casos. O governo reconheceu que já não dava mais para camuflar ou criar uma cortina de fumaça sobre eles", destacou José Matias Pereira.
Para o advogado Délio Prates, membro da ONG Transparência Capixaba, Dilma indicou não estar disposta a se manchar pelos erros dos outros. "Ela é menos política que seu antecessor e tem descartado os ministros porque não tolera ?o lado podre?, não tem estômago para isso. A presidente não segura a pressão das ruas", considerou.
Outra característica que marcou o ano foram as manifestações anticorrupção pelas ruas. Em sua maioria, elas nasceram nos sites de relacionamento, reunindo milhares de seguidores. Em setembro, o "Todos juntos contra a corrupção" reuniu cerca de 30 mil pessoas na Cinelândia, no Rio de Janeiro. Na internet, o grupo reunia mais de 150 mil adeptos.
"Conseguimos incomodar os políticos, mostrando que temos ferramentas para combatê-los. Sinto que estamos todos falando a mesma língua, os movimentos estaduais estão se conectando", avaliou a empresária Cristine Ferreira, uma das organizadoras do ato da Cinelândia.
No Estado, também houve movimentos marchando em protesto ao cenário nacional. O estudante Guilherme Gouveia, de 17 anos, é um dos organizadores do grupo "NasRuas.ES", uma dissidência do grupo nacional de mesmo nome. Este ano, eles foram às ruas protestar contra a corrupção por três vezes, em atos realizados em Vitória e Vila Velha.
"A insatisfação das pessoas com a política aumentou, e isso fez com que elas saíssem de casa para protestar. Costumo ouvir, em casa, que quando o certo merece aplauso é porque o errado já virou constante. É o que está acontecendo por aí", observou o jovem.
E para o ano que começa no próximo domingo novas manifestações estão previstas. Tanto o "Todos juntos contra a corrupção" quanto o "NasRuas.ES" planejam voltar à atividade assim que o Congresso retornar do recesso, em fevereiro. "Está planejada uma campanha de conscientização do voto e novas passeatas em 2012. O cenário só vai mudar se todos participarem", ressaltou Gouveia.
Caminho sem volta
Na avaliação de Délio Prates, o sentimento de intolerância com a corrupção é algo irreversível, que deve gerar novos capítulos no próximo ano. "O povo está tomando a direção da barca e não está mais aceitando as coisas de qualquer jeito. Não dá mais para tolerar desmandos", ressaltou o advogado.
O cientista político José Matias Pereira é menos otimista. Para ele, enquanto o modelo de alianças e distribuição de cargos no governo federal não for alterado, nada vai mudar. "À medida que se entregam ministérios a partidos como uma fazenda de porteira fechada, tudo continua como está. Dilma herdou um número de ministros que provavelmente ela não faria se pudesse escolher".
Cristine Ferreira, do "Todos juntos contra a corrupção", põe parcela de culpa nos ombros da presidente. "Isso que assistimos em 2011 não foi faxina. Na verdade, saíram do governo os ?cabeças? dos esquemas, mas continuaram os subordinados. Todos ali são coniventes. A presidente tinha que trocar todos. Mas é difícil acreditar que possa acontecer", disse.
Para 2012, a promessa do grupo organizado pela empresária carioca é por na internet uma lista de políticos condenados e envolvidos em casos de corrupção, para ver se, assim, surge "uma luz no fim do túnel" após as eleições de outubro.
O representante da Transparência Capixaba não tem dúvidas de que isso acontecerá. "A nova geração não tolera os erros, a apesar de viver na era das notícias rápidas, da internet, sabe fazer barulho. Isso trará efeitos benéficos às urnas", concluiu Prates.
Análise
Carlos Vinícius de Mendonça, Doutor em História do Brasil e professor da Ufes
"Em 2011, começamos a virar a página da corrupção"
Acredito que 2011 foi um ano emblemático, de ruptura com a memória de corrupção apática no Brasil. Existe, hoje, uma tendência na sociedade que acredita que o Brasil é isso: essa corrupção toda, que nada muda, que a corrupção é um destino; e há uma outra tendência que acredita que é necessário a superação desta memória, para construção de outra. Este ano foi um ano de tomada de consciência, de atitudes. O Brasil hoje é um país muito mais transparente que há dois anos, com uma postura que não tolera velhas práticas. Mas essa nova tendência tem que ser contemplada pela punição exemplar. Se a sociedade não enxergar os resultados do que quer ver diferente, deve haver um processo que nenhum de nós deseja: o desencantamento. O cenário acena positivamente contra o tráfico, contra a violência e homicídios. Mas a corrupção é uma violência institucional e isso também precisa ser combatido.
Eduardo Fachetti - A Gazeta
Dia 8 de junho de 2011. Como se fosse a primeira peça de uma sequência de dominós enfileirados, o então ministro da Casa Civil Antonio Palocci - homem forte do PT, ligado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - viu-se tocado pelo dedo indicador da presidente Dilma Rousseff (PT). Caiu sob acusação de ter usado informações privilegiadas do governo em consultorias privadas, fazendo seu patrimônio multiplicar por 20. Atrás dele, outros cinco ministros não mantiveram-se de pé após suspeitas de corrupção.
O termo "faxina" - usado todas as vezes que a presidente petista indicou mudanças em seu primeiro escalão - foi uma das maiores marcas de 2011. A fórmula se repetiu em todos os casos: as denúncias surgiam na imprensa e ganhavam repercussão. O Congresso chiava, a presidente ponderava, esticava a corda e, antes que a poeira abaixasse, surgia uma carta de exoneração. Oficialmente, foram os ministros que pediram pra sair.
Segundo o doutor em Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB) José Matias Pereira, o caso Palocci foi o sinal de alerta para os demais ministros. Isso porque o ex-ministro da Casa Civil já havia passado pela União entre 2003 e 2006, à frente da Fazenda. Ao retornar ao governo federal, junto de Dilma, ganhou status de "superministro": era ele quem dialogava com partidos, combinava espaços e nomes para compor o governo.
Palocci perdeu força em menos de um semestre, graças às denúncias que colocavam em voga seu aumento patrimonial entre 2006 e 2010; justamente o vácuo entre sua queda da Fazenda, sob denúncias de quebra de sigilo do caseiro Francenildo Costa (que desde o escândalo nunca mais conseguiu um emprego), e o retorno a Brasília.
"A presidente sinalizou não estar disposta a tolerar desvios na atividade pública. Palocci caiu sozinho. Quando um ministro cai como uma fruta podre, dá o sinal de que nenhum outro está imune. Os demais vieram na sequência, expondo a lógica dessa política que entrega órgãos públicos e ministérios a partidos, de porteira fechada", ponderou Pereira.
A fila de dominós
Depois de Palocci, a devassa ministerial continuou. Caíram Alfredo Nascimento (Transportes), Wagner Rossi (Agricultura), Pedro Novais (Turismo), Orlando Silva (Esporte) e Carlos Lupi (Trabalho). Sobre eles, pesaram suspeitas de cobrança de propina, favorecimento de fornecedores em troca de financiamento de campanha, uso de verba pública para fins pessoais, desvio de dinheiro e tráfico de influência. A última exoneração veio na noite de 4 de dezembro.
"A corrupção é a doença que mais mata no Brasil. Não temos sequer uma ideia clara do que é arrecadado e quanto disso chega ao destino final. Na queda dos ministros, a imprensa teve papel fundamental, porque foi ela que denunciou e acompanhou os casos. O governo reconheceu que já não dava mais para camuflar ou criar uma cortina de fumaça sobre eles", destacou José Matias Pereira.
Para o advogado Délio Prates, membro da ONG Transparência Capixaba, Dilma indicou não estar disposta a se manchar pelos erros dos outros. "Ela é menos política que seu antecessor e tem descartado os ministros porque não tolera ?o lado podre?, não tem estômago para isso. A presidente não segura a pressão das ruas", considerou.
O povo nas ruas
Outra característica que marcou o ano foram as manifestações anticorrupção pelas ruas. Em sua maioria, elas nasceram nos sites de relacionamento, reunindo milhares de seguidores. Em setembro, o "Todos juntos contra a corrupção" reuniu cerca de 30 mil pessoas na Cinelândia, no Rio de Janeiro. Na internet, o grupo reunia mais de 150 mil adeptos.
"Conseguimos incomodar os políticos, mostrando que temos ferramentas para combatê-los. Sinto que estamos todos falando a mesma língua, os movimentos estaduais estão se conectando", avaliou a empresária Cristine Ferreira, uma das organizadoras do ato da Cinelândia.
No Estado, também houve movimentos marchando em protesto ao cenário nacional. O estudante Guilherme Gouveia, de 17 anos, é um dos organizadores do grupo "NasRuas.ES", uma dissidência do grupo nacional de mesmo nome. Este ano, eles foram às ruas protestar contra a corrupção por três vezes, em atos realizados em Vitória e Vila Velha.
"A insatisfação das pessoas com a política aumentou, e isso fez com que elas saíssem de casa para protestar. Costumo ouvir, em casa, que quando o certo merece aplauso é porque o errado já virou constante. É o que está acontecendo por aí", observou o jovem.
E para o ano que começa no próximo domingo novas manifestações estão previstas. Tanto o "Todos juntos contra a corrupção" quanto o "NasRuas.ES" planejam voltar à atividade assim que o Congresso retornar do recesso, em fevereiro. "Está planejada uma campanha de conscientização do voto e novas passeatas em 2012. O cenário só vai mudar se todos participarem", ressaltou Gouveia.
Caminho sem volta
Na avaliação de Délio Prates, o sentimento de intolerância com a corrupção é algo irreversível, que deve gerar novos capítulos no próximo ano. "O povo está tomando a direção da barca e não está mais aceitando as coisas de qualquer jeito. Não dá mais para tolerar desmandos", ressaltou o advogado.
O cientista político José Matias Pereira é menos otimista. Para ele, enquanto o modelo de alianças e distribuição de cargos no governo federal não for alterado, nada vai mudar. "À medida que se entregam ministérios a partidos como uma fazenda de porteira fechada, tudo continua como está. Dilma herdou um número de ministros que provavelmente ela não faria se pudesse escolher".
Cristine Ferreira, do "Todos juntos contra a corrupção", põe parcela de culpa nos ombros da presidente. "Isso que assistimos em 2011 não foi faxina. Na verdade, saíram do governo os ?cabeças? dos esquemas, mas continuaram os subordinados. Todos ali são coniventes. A presidente tinha que trocar todos. Mas é difícil acreditar que possa acontecer", disse.
Para 2012, a promessa do grupo organizado pela empresária carioca é por na internet uma lista de políticos condenados e envolvidos em casos de corrupção, para ver se, assim, surge "uma luz no fim do túnel" após as eleições de outubro.
O representante da Transparência Capixaba não tem dúvidas de que isso acontecerá. "A nova geração não tolera os erros, a apesar de viver na era das notícias rápidas, da internet, sabe fazer barulho. Isso trará efeitos benéficos às urnas", concluiu Prates.
Análise
Carlos Vinícius de Mendonça, Doutor em História do Brasil e professor da Ufes
"Em 2011, começamos a virar a página da corrupção"
Acredito que 2011 foi um ano emblemático, de ruptura com a memória de corrupção apática no Brasil. Existe, hoje, uma tendência na sociedade que acredita que o Brasil é isso: essa corrupção toda, que nada muda, que a corrupção é um destino; e há uma outra tendência que acredita que é necessário a superação desta memória, para construção de outra. Este ano foi um ano de tomada de consciência, de atitudes. O Brasil hoje é um país muito mais transparente que há dois anos, com uma postura que não tolera velhas práticas. Mas essa nova tendência tem que ser contemplada pela punição exemplar. Se a sociedade não enxergar os resultados do que quer ver diferente, deve haver um processo que nenhum de nós deseja: o desencantamento. O cenário acena positivamente contra o tráfico, contra a violência e homicídios. Mas a corrupção é uma violência institucional e isso também precisa ser combatido.
Eduardo Fachetti - A Gazeta
Bem difícil esta situação de ministros em decadência!
ResponderExcluirOnde vamos parar?
No buraco já estamos!