domingo, 23 de maio de 2010

ABSURDOS EM TERESINA REFLETEM O CAOS DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL.

Teresina é uma cidade referência em saúde para boa parte do Norte e Nordeste. Doentes que não encontram tratamento em outras cidades vão para lá, e acabam caindo na mão de espertalhões. O golpe começa logo na chegada, na rodoviária. Agenciadores abordam os pacientes e oferecem transporte de graça para alguma pensão da cidade.


Para você entender o esquema, a reportagem do Fantástico se passou por paciente. E descobriu que muitos taxistas também encaminham os doentes para as pousadas.



Pensão São Lucas, aqui sua saúde está em primeiro lugar. Pensão Palmas Brasil, acompanhamento às clínicas, hospitais e laboratórios. Pensão São Pedro, consultas e exames econômicos.



“Tem um médico muito bom aqui, ele faz até transplante de coração”, diz dona Didi, dona da pensão. O taxista deixa o repórter na pensão da dona Didi. E olha o absurdo: é ela quem faz o dignóstico.



Dona Didi também indica os médicos. “Tem um bocado de médico bom aqui, tem o doutor Live, é um médico muito bom, ele faz até transplante de coração. Sempre eu gosto de levar gente pra ele”.



“Seu problema é só coração, ou quer ir ao medico gástrico para ver esse problema de estômago? Tem um bem aqui muito bom. Ele é exclusivo dessa parte de úlcera, de gastrite, dessas coisas assim”.



“Se você quiser ir logo ao gástrico, eu te levo logo. Se quiser ir ao médico de coração e te levo logo. Você vai ao gástrico, por lá ele pede todos os seus exames”.

Como funciona


"Essas pensões servem de agenciadores de pacientes para as clínicas médicas e cirúrgicas. Eles recebem em função desse trabalho de agenciamento um percentual para cada consulta. E essa consulta, na maioria das vezes, é uma consulta antiética. É uma consulta que busca ainda mais levar o paciente a fazer exames desnecessários. Exames de alta tecnologia", disse Fernando Correia Lima, presidente do Conselho Regional de Medicina do Piauí.


Não são apenas os donos de pensão. Perto dos hospitais públicos de Teresina também existem os agenciadores autônomos. Uma mulher confirma que recebe propina das clínicas que ela indica.


O repórter do Fantástico seguiu uma indicação da agenciadora e foi parar num médico, que trabalha num laboratório. Ele não faz ficha, pergunta apenas o nome do paciente e tenta tirar a pressão. Tenta por 14 minutos e chega a um resultado absurdo: - Aparentemente deu 7 x 2. Deu baixa.


Baixa? Uma pressão de 7 x 2 significa que o paciente estaria em choque, provavelmente desacordado. O médico tenta de novo, no outro braço. E o resultado se repete: 7 x 2. O médico desiste da pressão e pede uma bateria de exames, a um custo de R$ 434.


Todo esse descalabro em Teresina ocorre porque o principal hospital credenciado pelo (Sistema Único de Saúde (SUS) não dá conta de tantos pacientes que chegam de fora. O hospital botou uma grade para barrar os agenciadores clandestinos, mas não adiantou. Os pacientes que não conseguem fazer os exames de graça pelo SUS acabam nas garras dessa gente.

Mas quem fatura mesmo são as pensões. Elas recebem muita gente que vem de longe, precisando de atendimento médico.

Comissão por exame

Circulando pela cidade, o repórter do Fantástico encontrou um estudante de radiologia, que trabalha na pensão da mãe. Ele abre o jogo sobre as comissões pagas pelas clínicas. São R$ 80 por um exame de ressonância, de R$ 600.

O rapaz diz que quer largar essa vida. “Por isso é que eu estou estudando, pra ver se eu saio dessa vida, tiro minha mãe dessa vida”.


"O relacionamento das pensões com as clínicas médicas, além de ser um problema grave, de natureza ética, é também um problema de polícia", disse Correia Lima.


“A gente está procurando justamente o que o estado pode fazer, junto com o Ministério Público, a partir do momento que detectado essas anomalias, a gente tomar as devidas providências. Ou seja, junto com o Ministério Público a gente consiga contornar ou minimizar esses problemas”, disse Telmo Gomes, secretário de Saúde do Piauí.

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