Os EUA qualificaram ontem o acordo mediado por Brasil e Turquia com o Irã de "inaceitável" e informaram que a carta enviada pelo presidente Barack Obama ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se consistia em "instruções para negociação".
Contradizendo o Itamaraty, o governo americano afirmou ainda que o chanceler Celso Amorim "sabia perfeitamente" que o acordo de troca de combustível com o Irã, fechado no dia 17, não levaria os EUA a desistirem das sanções contra Teerã. Os EUA rejeitaram o acordo sob o argumento de que ele não resolvia o problema de o Irã continuar enriquecendo urânio. Amorim e o governo brasileiro esperavam que, com o acordo, os EUA deixassem de buscar as sanções. na ONU contra o Irã.
O Itamaraty sustenta que o Brasil fez tudo o que Obama recomendava na carta enviada a Lula em 20 de abril. "Ninguém nos disse: olha, se eles não pararem com o enriquecimento a 20%, esqueça o acordo", disse Amorim nesta semana.
Washington convocou uma entrevista para "esclarecer" pontos sobre o acordo e desmentiu Amorim. "O ministro das Relações Exteriores do Brasil sabia perfeitamente da importância dessa questão (do enriquecimento)", disse um dos três altos funcionários do governo que participaram da entrevista. "Em fevereiro, o subsecretário Bill Burns reuniu-se com Amorim e discutiu esse assunto longamente, e a secretária Hillary Clinton também falou disso com Amorim e com Lula", disse outro funcionário.
Os americanos disseram também que "nunca pediram aos brasileiros que saíssem negociando em nome dos americanos". A carta de Obama a Lula, segundo eles, era apenas uma reação à ideia proposta pelos brasileiros e turcos. "Não sentimos a necessidade de sermos abrangentes em relação a tudo o que seria necessário para um acordo aceitável com o Irã. A carta não continha instruções para negociação."
Os americanos afirmaram que o acordo é "simplesmente inaceitável", pois ele permite que o Irã continue enriquecendo urânio, o que vai contra as atuais resoluções da ONU. Afirmaram ainda que o acordo está defasado, porque hoje o Irã já tem um estoque de urânio muito maior do que tinha em outubro, quando as potências fizeram proposta parecida.
Um dos funcionários tentou por panos quentes nas recentes rusgas entre Brasil e EUA. "Temos visto muitas notícias sobre como esse caso (do Irã) está causando tensão no relacionamento entre EUA e Brasil", disse. "Mas nosso relacionamento bilateral abrange dúzias de questões, é uma relação muito forte."
Reações. Alfredo Valadão, do Instituto de Estudos Políticos (Sciences-Po), de Paris, adverte que a diplomacia brasileira interveio em um tema desconhecido do país, provocando mal-estar parceiros históricos, como os EUA. "No Irã, o Brasil foi além da retórica e atrapalhou toda uma estratégia internacional e uma manobra diplomática importante dos EUA", disse. "Por que demonstramos mais confiança em Mahmoud Ahmadinejad do que em Obama, na democracia americana ou francesa?"
Para o diretor da Faculdade de Economia da FAAP, Rubens Ricupero, as relações bilaterais ficaram agora mais "complicadas". "É um acordo que toca em tópicos muito sensíveis para os EUA", diz. Mas, acredita ele, o governo Obama não deve dar ao episódio uma proporção exagerada, por reconhecer a importância do Brasil como força regional.
Para Alexandre Barros, cientista político, as discordâncias não devem comprometer as relações bilaterais. "Os EUA tendem a ficar muito irritados, mas isso vai passar", diz. "Brasil e EUA têm interesses comerciais e investimentos, é uma relação muito antiga e tradicional para se deixar comprometer por isso."
Ag. Estado
Nenhum comentário:
Postar um comentário