sexta-feira, 11 de novembro de 2011

COM A VIOLA NO SACO

Quando ainda se sentia confiante na solidez de sua posição à frente do Ministério do Trabalho, Carlos Lupi não se poupou de trovejar bravatas. Mas, como quem fala muito, segundo o dito popular, acaba dando bom dia a cavalo, o ministro acabou cometendo dois graves equívocos, um deles provavelmente fatal: o de colocar em dúvida a possibilidade de a presidente Dilma Rousseff demiti-lo, garantindo que só deixaria o cargo "abatido à bala". Já meteu a viola no saco. O outro foi o de tentar reverter a seu favor a lógica dos acontecimentos, lançando mão de um jogo de palavras demagógico e primário: "Sou osso duro de roer. Quero ver até onde vai essa onda de denuncismo". A onda que assola o País não é essa, é a da corrupção. As denúncias são apenas consequência. E a demissão de cinco ministros de Estado por elas atingidos revela que todas têm tido fundamento. Ou a presidente da República é irresponsável?

Por que o caso do ministro do Trabalho seria diferente? As suspeitas de trambiques de agentes do governo, com ONGs picaretas, começaram a pipocar ainda na administração anterior e estão no foco das denúncias recentemente veiculadas sobre a cobrança de propina, por parte de assessores do ministro Lupi, para fazer vista grossa a irregularidades. Ontem o Estado publicou o caso da ONG Oxigênio, de um amigo de Lula, com sede em São Paulo, que foi cobrada pelo próprio Ministério do Trabalho a respeito da comprovação de serviços de qualificação de operadores de telemarketing pelos quais recebeu R$ 24 milhões. E ficou comprovado que outra organização, a Associação dos Artesãos e Produtores Rudimentares do Rio (Aart), que recebeu R$ 3,75 milhões de convênio firmado em dezembro de 2009 para oferecer cursos de qualificação para o "arranjo da indústria do carnaval", não funciona em nenhum dos dois endereços que constam dos documentos oficiais. Não é à toa que a presidente determinou uma rigorosa revisão de todos os convênios firmados com organizações não governamentais.

Apesar das evidências contra ele, o trovejante Lupi permitiu-se, na última terça-feira, uma fanfarronice temerária para quem, como ele, afirma conhecer muito bem Dilma Rousseff: "Não saio do cargo. Daqui ninguém me tira. Só se for abatido à bala. E tem que ser bala de grosso calibre, porque eu sou pesado". E acrescentou que não sairia agora nem na reforma que Dilma fará em janeiro. Foi a conta. A presidente mandou a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffman, chamar o falastrão a seu gabinete, passar-lhe um pito e exigir uma retratação pelos "excessos" verbais. Imediata e obedientemente o PDT, partido do qual Lupi é o chefão, divulgou nota oficial para esclarecer que "em nenhum momento as declarações do ministro Carlos Lupi, durante coletiva ontem na sede nacional do PDT, foram de ameaça a quem quer que seja, muito menos à presidente Dilma Rousseff, mas sim um desafio aos acusadores que se escondem por trás do anonimato".

Por recomendação do Palácio do Planalto, na quinta-feira pela manhã Lupi compareceu, menos trovejante, a uma audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, para prestar esclarecimentos sobre as denúncias de irregularidades envolvendo sua pasta. Depois de reiterar seu ato de penitência pelos excessos verbais, chegou a declarar: "Presidente Dilma, peço desculpas se errei. Eu te amo. Quem trabalha muito erra muito" - e procurou minimizar a importância de todas as irregularidades apontadas, chegando a garantir que seu ex-chefe de gabinete Marcelo Panella, o primeiro a ser demitido pelo próprio ministro quando a situação começou a ficar feia, sempre teve um comportamento irrepreensível: "Não há possibilidade de ele estar envolvido em qualquer coisa irregular". E saiu pela tangente quando convidado a explicar a série de "erros e equívocos" apontados nos convênios: "São mais de 500 convênios, como não vai ter isso? Mas corrupção, dentro do meu partido, não há".

Será ótimo se for verdade, porque, a se repetir o procedimento que Dilma Rousseff tem geralmente seguido em situações semelhantes, quando o ministro Lupi cair o feudo do Trabalho estará garantido nas mãos do PDT. Afinal, é preciso preservar a governabilidade.

Fonte: O Estado de São Paulo

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