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segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

O ESTADO DESIGUAL


Os números do Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios na década passada mostram que o caminho para desconcentrar a riqueza do Espírito Santo ainda é bastante longo. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados na semana retrasada, revelam, apesar da tão propagada política de interiorização de investimentos tocada pelos governos Paulo Hartung e Renato Casagrande, uma Grande Vitória cada vez mais rica e um interior com cada vez menos espaço na divisão do bolo.

O levantamento, que compila dados de 1999 a 2010, mostra que a Região Metropolitana (Cariacica, Fundão, Guarapari, Serra, Viana, Vila Velha e Vitória) responde por 63,2% de todas as riquezas do Espírito Santo. Em 1999, a Grande Vitória contribuia com 60,3% do PIB capixaba. Os outros 71 municípios, consequentemente, que há 12 anos englobavam 39,7% do PIB, ficaram, em 2010, com apenas 36,8%.

De acordo com dados levantados pelo professor aposentado do Departamento de Economia da Ufes, ex-secretário de Planejamento do Estado e diretor do Instituto Futura, Orlando Caliman, que assina o artigo da página ao lado, o processo de urbanização do PIB, iniciado logo após a erradicação dos cafezais, na década de 60, ainda não foi estancado, pelo contrário. Em 1970, a Região Metropolitana era responsável pela geração de 55% do PIB estadual. Percentual que passou para 56%, em 1980, chegando a 60%, em 2000, e a 63,2% agora.

Quando reunimos os cinco municípios mais ricos do Estado – Vitória, Serra, Vila Velha, Cariacica e Anchieta –, o avanço se repete. Em 1999 – com Aracruz no lugar de Anchieta –, eles respondiam por 58,41% do total das riquezas do Espírito Santo, agora, contribuem com 65,45%. Também chama atenção o fato de apenas duas – Metropolitana e Litoral Sul – das dez microrregiões do Estado, terem avançado percentualmente em cima do PIB. Todas as outras, incluindo Rio Doce, com as ilustres presenças de Linhares e Aracruz, perderam espaço.

Sem preocupação
Na avaliação da Secretaria de Estado de Desenvolvimento, responsável por capitanear esse processo de interiorização, trata-se de um trabalho de longo prazo e que ainda está no meio do caminho. "O primeiro passo, que era levar os investimentos para o interior, foi dado. Ainda tem muita coisa para acontecer tanto no Sul como no Norte do Estado, mais do que na Grande Vitória. A partir do momento que essas âncoras estiverem estabelecidas, esse quadro proporcional do PIB certamente será outro", assinala a chefe em exercício da pasta, Cristina Santos.

O segundo passo, segundo ela, é dar infraestrutura logística e educacional para sedimentar a renda e incentivar o surgimento de novos empreendedores no interior. "Depois de estabelecido, por exemplo, o estaleiro da Jurong, vamos trabalhar para que o fornecimento de bens, serviços e mão de obra seja, em sua maioria, contratado naquela região. Para isso, temos de qualificar o pessoal e dar a infraestrutura necessária. No início do ano que vem, o Estado põe na rua um plano para melhorar as rodovias estaduais. Na educação, o objetivo é que cada um dos 78 municípios tenha uma escola profissionalizante, seja ela do Sistema S, federal ou do Estado".

Motivos e saídas

Ana Paula Vescovi, economista e ex-presidente do Instituto Jones dos Santos Neves, concorda com a linha traçada pelo governo, mas se mostrou surpresa, negativamente, com o desempenho de determinadas regiões.

"São números que até me surpreendem, esperava por uma desempenho melhor principalmente de Linhares e Aracruz. Quando olhamos para trás, observamos uma importante desconcentração dos investimentos nesta última década, pressupúnhamos que a desconcentração de riquezas viria junto, mas não é o que acontece. Isso deixa claro que só os investimentos não são o suficiente para adicionar valor a essas regiões, a renda e, consequentemente, a riqueza não está ficando ali".

Para Ana Paula, a falta de um setor terciário (comércio e serviços) mais pujante dificulta a já complexa tarefa. "É preciso criar uma rede de fornecedores locais que atendam tanto a indústria como os trabalhadores dessas grandes plantas. O dinheiro tem de circular no interior. Caso contrário, o industrial trará os insumos de fora e venderá também para fora. Os trabalhadores desta indústria, por sua vez, suprirão suas necessidades de compras e lazer também fora".

Este, na opinião dela, é um dos motivos da Grande Vitória permanecer desgarrando-se economicamente das demais regiões. "Além de ter uma economia bastante dinâmica, praticamente toda a prestação de serviços e o comércio de qualidade do Estado concentra-se na Região Metropolitana. O interior do Estado precisa dar esse passo além para que a renda gerada lá fique por lá".

Na avaliação de José Edil Benedito, presidente do Instituto Jones dos Santos Neves, apesar das tentativas governamentais de induzir o crescimento para regiões menos desenvolvidas, é complicado alterar essa proporção. "Há investimentos para todas as regiões, mas determinados locais, por conta do petróleo, por exemplo, atraem mais dinheiro com mais facilidade. Não tem jeito".

Para Edil, infraestrutura e educação de qualidade são essenciais para tornar o interior mais forte. "Vivemos num Estado geograficamente pequeno, com rodovias duplicadas e seguras o trânsito de bens e serviços e, consequentemente, a oferta deles fica facilitada. Isso tende a beneficiar o interior. A qualificação também é essencial, essas escolas de ensino profissionalizante devem dar um salto de qualidade, com gente instruída, é mais fácil segurar a renda no local, além do fato de aumentar as chances do surgimento de empreendedores e novas ideias".

Ainda com relação à educação, o presidente do Instituto Jones chama atenção para a necessidade que o Estado tem de explorar a indústria criativa. "Ainda temos muito para crescer nessa área. Regiões como o Caparaó, por exemplo, têm grande possibilidade de desenvolver o turismo, a culinária, um café de excelência. Trata-se de uma indústria que não é tradicional, mas que também faz girar muito dinheiro".

Per Capita
O avanço da Grande Vitória também foi observado pelo Brasil Metro, relatório produzido pelo Global Cities Initiative sobre a economia das 300 maiores metrópoles do mundo, sendo 13 no Brasil. Entre essas 13, a Região Metropolitana de Vitória foi a que apresentou o maior avanço de PIB per capita entre 1990 e 2012, 55%. Enquanto isso, a média das demais metrópoles foi de 42%.

O relatório dá números parecidos com o do IBGE para a concentração de riquezas. De acordo com o Brasil Metro, 66% do PIB do Estado está concentrado na Grande Vitória. Na avaliação de Jill Wilson, um dos pesquisadores responsáveis pelo levantamento, o percentual é normal. "Para começar, a Grande Vitória é o lar de cerca de metade da população do Estado. Além disso, as áreas metropolitanas são centros de atividade econômica. Como o Espírito Santo é um Estado pequeno, não é de surpreender que a Grande Vitória seja parte tão importante de seu PIB".

Eles investem aqui

"É mais fácil crescer numa cidade como Vitória do que no Rio de Janeiro ou São paulo"

Aposta foi na boa comida

Há quatro anos, o chef argentino Ivan Di Cesare, natural de Mendoza, veio para Vitória com a intenção de ficar um ano num intercâmbio gastronômico e cultural. Três meses depois, percebeu o tamanho da oportunidade que tinha pela frente e decidiu ficar de vez. "A cidade não é tão grande, mas tem uma economia muito forte e dinâmica. Há muita gente querendo bons restaurantes, boa comida". Ele é um bom exemplo das muitas pessoas, daqui ou de fora, que se veem incentivadas a investirem na Grande Vitória, região que cresce acima da média estadual e nacional. Alguns meses depois, Ivan chamou o amigo de infância Emilio Recchia para ajudá-lo na empreitada. Eles começaram nas cozinhas dos restaurantes argentinos que começaram a surgir na Grande Vitória. Há dois meses abriram o próprio negócio. "Apesar da demanda, Vitória é uma cidade praticamente virgem no que nos propomos a fazer", analisa Recchia. O último do trio a chegar foi Marcos Palomar. Veio para suprir o grande problema enfrentado pelos empreendedores argentinos no Estado, a falta de mão de obra. "Ele é especialista em carnes. Veio para ajudar, mão de obra por aqui é muito complicado. As pessoas somem sem avisar", reclama Ivan, já sentindo o peso dos entraves brasileiros.



Análise
Tudo começou com crise dos cafezais

Esse processo de concentração da produção da riqueza não é novidade no Espírito Santo. Em 1970, a Região Metropolitana foi responsável pela geração de 55% do PIB estadual. Percentual que passou para 56% em 1980, chegando a 60% em 2000 e 63% em 2010. Isso nos leva a avaliação de que a velocidade desse processo de concentração foi maior em anos anteriores a 1970. Mas, especialmente na década de 60, quando do desmantelamento da cultura do café, que provocou uma avalanche de urbanização; e que também aconteceu concomitantemente ao início do processo de industrialização. O porto de Tubarão começou a operar em meados da década de 70 e começa a dar o tom de uma economia em outra escala de operação. Ao analisarmos os dados recentes do PIB regional vamos perceber que a concentração agora contempla também as regiões litorâneas Sul e Norte. No Sul, o foco central está em Anchieta, mas também inclui Presidente Kennedy. Este último pelo simples fato de ter à sua frente plataformas de exploração de petróleo. No litoral Norte, temos dois focos: Linhares e Aracruz. Essa região foi responsável por 9,1% do PIB em 2008. A queda subsequente – em 2012, foi de 8% – deu-se principalmente por conta da crise mundial que afetou a produção de celulose. A explicação mais simples para essa concentração maior do PIB no litoral está na escala dos investimentos em relação a dimensão da economia estadual, mas, mais especificamente do interior. Esses investimentos, pelas suas características nunca aconteceriam na Região de Caparaó, por exemplo. A estratégia é fazer com que Caparaó posso também usufruir desse crescimento maior do litoral, como todo o restante do interior do Estado. E para isso é preciso qualificar o interior, facilitando a sua integração, inclusive logística, com os polos de maior crescimento. Uma coisa tem que estar clara: o interior não pode concorrer com o litoral pela via da escala. A saída está na via do escopo, dos nichos de mercado, nas franjas da economia de escala.

Orlando Caliman
Economista

 
 
Fonte: A Gazeta

sexta-feira, 13 de abril de 2012

O CARNAVAL ACABOU

Com aprovação de 77%, a presidente Dilma Rousseff fez inveja a Obama, mas a "quarta-feira de cinzas" pode chegar antes do esperado

Ao chegar à Casa Branca na segunda feira, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, trouxe consigo algo que sem dúvida provocou inveja em seu anfitrião, o presidente americano Barack Obama - uma aprovação de impressionantes 77% ao seu governo. Como um dos Brics, instalado confortavelmente no topo do mundo, como queridinho dos investidores internacionais, preparando-se para organizar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil se vê arrebatado por um surto nacional de adrenalina comparável - talvez do ponto de vista caricatural - àquilo que as passistas sentem quando entram no sambódromo do Rio para receber os aplausos do público.

A euforia era evidente na mais recente edição do Fórum Econômico Mundial em Davos, na qual o contribuinte brasileiro financiou o evento oficial da noite de sábado. É costume incluir em Davos sessões voltadas especificamente a determinados países, e o Brasil foi mais uma vez o tema de uma sessão do tipo este ano. A principal conclusão pareceu ser a de que os governantes do País devem tomar cuidado para evitar o superaquecimento da economia brasileira.

Ao fim da reunião, um correspondente internacional veterano comentou: "Os brasileiros se consideram mesmo incríveis. Parece que solucionaram todos os problemas". Havia mais do que uma pitada de ironia no que ele disse, talvez porque esse correspondente tenha coberto o "milagre brasileiro" do fim dos anos 60 e início dos 70. Apresentando um crescimento de dois dígitos por um período de cinco anos consecutivos, o "milagre" levou a um excesso de empréstimos e culminou numa "década perdida" de inflação e estagnação após a crise de endividamento da América Latina, em 1982.

Aplicando consistentemente políticas fiscais e sociais extremamente responsáveis do ponto de vista macroeconômico depois de vencer a hiperinflação em meados dos anos 90, o Brasil cresceu constantemente, ainda que não espetacularmente. O País suportou com sucesso o atual declínio global, e começou finalmente a reduzir a desigualdade social, criando uma classe média relevante pela primeira vez em sua história: com atualmente 95 milhões de pessoas, a classe média finalmente passou a representar metade da população.

Talvez tenha de fato chegado a hora de esquecer a antiga piada: "O Brasil é o país do futuro - sempre o será". Talvez seja hora de dar ao autor austríaco Stefan Zweig, mais conhecido no País como autor de Brasil, país do futuro, publicado em 1941, o crédito que merece enquanto profeta.
Os brasileiros estão satisfeitos consigo mesmos. E não estão sozinhos.

Os estrangeiros estão rumando para o Brasil como as hordas que foram à Califórnia em busca do ouro em 1849. O número de moradores estrangeiros cresceu mais de 50% no último ano, passando de pouco menos de 1 milhão para 1,5 milhão de pessoas, de acordo com reportagem do Washington Post. "Agora as pessoas estão nos vendendo o Brasil", disse-me o primeiro presidente da Comissão de Valores Mobiliários brasileira, Roberto Teixeira da Costa, em conversa recente. Hoje membro do conselho diretor de várias das principais empresas brasileiras, Teixeira da Costa resumiu a situação da seguinte maneira: "Como o restante do mundo vive uma situação tão difícil, as pessoas acham que o Brasil é o grande salvador. Antes, éramos o problema. Agora, somos a solução".

Junto com outros membros dos Brics, como Índia e China, o Brasil deve ajudar a manter a economia global funcionando até que todos os demais arrumem a casa. O Banco Santander, principal credor entre os bancos espanhóis, ganha atualmente mais dinheiro no Brasil do que em qualquer outro dos mais de 30 países em que opera: um quarto do seu lucro vem do gigante latino-americano. A General Electric projetou recentemente um aumento total na renda de 25% em toda a América Latina até 2016, esperando que a região apresente desempenho superior ao da Ásia; executivos previram que Brasil, México e Peru estarão na vanguarda dessa tendência. O investimento estrangeiro direto no Brasil atingiu novo recorde pelo segundo ano consecutivo, passando de US$ 48,5 bilhões para US$ 66,7 bilhões em apenas 12 meses.

Mas essa mentalidade típica de uma corrida do ouro parece cegar tanto os governantes quanto os investidores. Alguns brasileiros astutos descrevem a psique do País como bipolar. Todos conhecem o lado positivo do carnaval, do samba, do futebol e das praias. Mas poucos compreendem o lado negativo. Os brasileiros afirmam ter um tipo próprio de melancolia, definido pela palavra "saudade", supostamente impossível de traduzir para outros idiomas. O mais elogiado compositor brasileiro, Tom Jobim, o ícone da Bossa Nova, compôs com o parceiro Vinicius de Moraes uma canção chamada Felicidade, cujo refrão destaca que Tristeza não tem fim / Felicidade, sim. Para tudo se acabar na quarta-feira (de cinzas), como dizem os versos da música e ocorre com o carnaval.

No caso da economia brasileira, o despertador da quarta-feira deve ter soado com o anúncio do crescimento de 2,7% em 2011, uma acentuada queda em relação aos 7,5% de 2010 e muito abaixo do apresentado na maioria dos demais emergentes. De fato, o Santander atribuiu seu lucro abaixo do esperado no último trimestre de 2011 a problemas no Brasil e na Grã-Bretanha.

Nouriel Roubini, o economista que ficou famoso ao prever o colapso do mercado imobiliário americano e a recessão global de 2008 que se seguiu, visitou o Brasil em fevereiro, precisamente durante o período de carnaval. Ao deixar o País, ele não se mostrou nem um pouco eufórico: "Uma sóbria avaliação realista sugere que o Brasil pode desapontar em muitos aspectos nos próximos anos, a não ser que importantes reformas estruturais sejam promovidas". Prevendo um futuro desanimador, ele acrescentou que "esse baixo crescimento potencial deixa o Brasil vulnerável a um ciclo de prosperidade e quebra conforme o País se aproxima rapidamente de sua velocidade máxima".

Por mais que outros fatores como o crescimento da classe média desempenhem um papel claro, o recente crescimento brasileiro decorreu principalmente da capacidade do País de injetar minerais e produtos agrícolas na China. Entre 2000 e 2010, a parcela das exportações brasileiras para a China saltou de 3% para 16%. O dinheiro que entra no País, somado ao investimento estrangeiro direto e ao capital em portfólios de ações, impôs pressão ao real, a moeda brasileira. Os juros brasileiros, mantidos altos para combater a inflação em lugar de reformas envolvendo o sistema tributário e a administração pública, politicamente mais complicadas, atraem os investidores estrangeiros mesmo com o controle de capitais. Os juros americanos, muito próximos do zero, e os problemas na zona do euro exacerbam esse quadro conforme o dinheiro deixa as regiões de baixa lucratividade em busca de oportunidades melhores.

Como resultado, o real apresenta supervalorização de 35% em relação ao dólar americano, de acordo com o índice Big Mac da revista The Economist. O Brasil pode já estar sofrendo da chamada doença holandesa, com sua moeda supervalorizada tornando as exportações mais caras no exterior e os produtos importados mais baratos para os consumidores brasileiros. Isso pode levar o País a uma desindustrialização incipiente: a fabricação doméstica de bens de consumo caiu quase 2% em 2011, enquanto as vendas prosperavam por causa do crescimento na demanda.

O governo brasileiro atribui a culpa pela supervalorização do real àquilo que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, chama de "guerra cambial" - a entrada de um fluxo intenso de capital especulativo que busca lucro no Brasil. Representantes do governo aplicaram medidas pouco expressivas para conter esse fluxo, como um ajuste na tributação dos empréstimos no exterior anunciado em março, prorrogando a aplicação de um imposto de 6% aos empréstimos com vencimento em três anos - antes o imposto incidia sobre os empréstimos com vencimento em dois anos.

Em resposta aos apelos da indústria local, o governo aplicou gradualmente uma série de medidas protecionistas que causaram inquietação do Japão ao México. "O Brasil continua improvisando nas políticas industrial e comercial", queixou-se a colunista Miriam Leitão, que cobre a área de economia para o jornal carioca O Globo. "Ao tentar encontrar saídas de afogadilho para o déficit que apareceu na balança, e para o magro número da indústria em 2011, tudo o que se consegue no governo é repetir o cacoete: protecionismo, vantagens para lobbies e corporações."

Como no filme O Anjo Exterminador, de Luis Buñuel, no qual os convidados de um jantar não conseguem ir embora conforme a noite avança, apesar da inexplicável ausência de barreiras físicas, as soluções para os problemas do Brasil parecem óbvias, mas nunca são implementadas. A maioria dos economistas atribui a responsabilidade pela maioria dos problemas do País àquilo que é chamado de "custo Brasil", um conjunto de fatores que torna mais caros os empreendimentos no Brasil do que na maioria dos países. O Brasil ocupa a 126.ª posição (são 183) no índice do Banco Mundial que lista os países de acordo com a facilidade de conduzir os negócios, perdendo para Bangladesh, Uganda, Suazilândia e Bósnia-Herzegovina.

Suas recomendações para uma mudança costumam incluir as seguintes medidas: simplificar a estrutura tributária, reformar a administração pública e a Previdência Social para aumentar a eficiência e reduzir os gastos, alterar a legislação trabalhista para diminuir o custo da contratação de novos empregados e investir em infraestrutura.

Além disso, uma reforma fiscal daria aos governantes uma ferramenta adicional de combate à inflação, possivelmente permitindo que os juros sejam reduzidos mais rapidamente, estimulando a economia e, ao mesmo tempo, ajudando a conter o capital especulativo.

É verdade que a pauta para redução do custo Brasil é ambiciosa, mas o País progrediu pouco nessas frentes - se é que houve progresso. A infraestrutura poderia parecer vital para a preparação para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, mas os investimentos estão tão atrasados que chegaram a render um desagradável episódio diplomático. Um funcionário do alto escalão da federação internacional de futebol, a Fifa, sugeriu recentemente que os organizadores precisavam de "um chute no traseiro" porque estavam atrasados nos preparativos. Os eufóricos brasileiros não gostaram nem um pouco.

Talvez o Brasil esteja vivendo no próprio vácuo. Poderíamos dizer isso sobre sua política econômica. Por mais que fosse de uma popularidade sem igual, o predecessor de Dilma, Luiz Inácio Lula da Silva, teve como principal contribuição à política econômica a atitude de seguir a recomendação do médico e "em primeiro lugar, não causar nenhum mal". Como afirmou o Globo em matéria especial dedicada ao fim do mandato, "o presidente Lula chega ao fim do seu oitavo ano de governo com uma popularidade nunca antes vista por um presidente do País, apesar do seu legado contraditório. Não houve avanços nem melhorias no ensino, na saúde, na segurança pública, no saneamento básico e na infraestrutura, e as reformas necessárias não foram implementadas". De acordo com o sociólogo Ted Goertzel, da Universidade Rutgers, autor de biografias de Lula e seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, "Lula optou por se aposentar com uma popularidade na casa dos 80% em vez de usar essa popularidade para pressionar por reformas controvertidas".

O maior feito de Lula foi provavelmente sua habilidade - digna de Reagan - de fazer com que os brasileiros se sentissem bem a respeito de si mesmos e do seu país - e, vencendo Reagan em seu próprio jogo, convenceu também os estrangeiros: as provas disso são a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

Mas essa confiança levou ao tipo de convencimento que causou má impressão no correspondente veterano em Davos, cegando os líderes para a necessidade de tratar do problema do custo Brasil. Em sua campanha pela Presidência em 2010, Dilma repreendeu um repórter da Reuters numa entrevista, quando este sugeriu que talvez fosse impossível manter um crescimento de 7% sem a implementação de reformas.

"O ritmo atual de crescimento do Brasil está próximo (desta marca)?", perguntou ela, incisiva. O jornalista teve de reconhecer que a resposta era afirmativa. "Bem, então, me parece que isso é possível, sim." Claramente, o crescimento atual de 2,7% mostra que essa possibilidade não está ocorrendo no momento. E, se Dilma pretende retomar o crescimento da época de Lula, ela terá de lidar com os aliados políticos escolhidos pelo partido dela, o Partido dos Trabalhadores - o PMDB, um partido heterogêneo que não possui nenhuma ideologia política identificável. Tecnicamente, o PMDB confere à presidente a maioria no Congresso, mas seus membros tendem a trabalhar com extrema lentidão nas questões legislativas, a não ser que recebam algum benefício pessoal.

O fato de as pessoas se importarem com o destino da economia brasileira mostra o quanto o País avançou desde que começou a lutar contra a hiperinflação, há quase duas décadas. Mas a história econômica mostra que tudo funciona de acordo com ciclos. A pergunta é: será o próximo declínio do Brasil profundo e prolongado, como a "década perdida" que se seguiu ao "milagre" dos anos 70, ou curto e relativamente indolor, como ocorreu em 2009 quando o País se recuperou prontamente do choque global de 2008? Na ausência de reformas, a primeira opção parece mais provável.

Como os americanos, os brasileiros são donos de um otimismo típico do Novo Mundo, permanecendo animados mesmo durante períodos de crescimento medíocre. Entretanto, sobreviver aos maus momentos não é o suficiente para um salvador, nem para um novo pilar da economia global. A quarta-feira de cinzas pode chegar antes do esperado.

Bill Hinchberger - O Estado de São Paulo

TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

CRESCIMENTO ZERO

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro estacionou no terceiro trimestre, com crescimento zero em relação ao segundo, na série livre de influências sazonais. Houve desaceleração generalizada de atividades e setores. Como esperado, a indústria teve queda, e a surpresa ficou por conta do recuo dos serviços e da desaceleração do consumo das famílias.

Com isso, para diversos analistas, ficou bem difícil o PIB crescer 3% em 2011. Alguns deles já acham difícil chegar a 3% também em 2012. "Dificilmente o PIB cresce 3% este ano, deve ficar mais perto de 2,8%", projeta Bráulio Borges, economista-chefe da consultoria LCA.

Outras instituições que preveem ou consideram que ficou mais provável um PIB abaixo de 3% em 2011 são o Itaú-BBA, a consultoria MB Associados e as gestoras de recursos Opus e JGP, no Rio.

Cenário geral da economia

Em relação a igual período de 2010, o PIB do terceiro trimestre cresceu 2,1%, o pior resultado desde a queda de 1,5% no terceiro trimestre de 2009. O mau desempenho atingiu quase todos os setores e subsetores. A desaceleração foi puxada pela indústria, e já atingiu o consumo das famílias, quem tem sido um suporte da economia brasileira.

Os investimentos também caíram ante o segundo trimestre. Segundo os analistas, a alta da Selic e as medidas de contenção de crédito desde o final de 2010 aliaram-se ao impacto recente da crise internacional para provocar a parada brusca da economia.

Na comparação com o período de abril a junho, na série dessazonalizada, a indústria recuou 0,9% e os serviços caíram 0,3% no terceiro trimestre. A agropecuária, porém, cresceu substanciais 3,4%, impulsionada pelo bom desempenho de mandioca, feijão e laranja.

Governo quer novas medidas
O governo vai adotar novas medidas para estimular as operações de empréstimo, informou ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega. "No momento, não há medidas que o governo pense em tomar, mas vamos seguir na flexibilização do crédito", adiantou. O objetivo, acrescentou, é barateá-lo.

Fonte: A Gazeta