terça-feira, 7 de setembro de 2010

O CHEFE. CAPÍTULO 5.






O senador Fernando Bezerra (PTB-RN) afasta especulações de que deixará o


cargo de líder do governo Lula no Congresso. Mas, ao mesmo tempo, não retira o que

disse a Veja. Do senador:



– Não vejo razão, até agora, que me faça entregar o cargo. Não agredi o governo

em nada.

18 – 31/5/2005 Descontrolados com notícias que não param de pipocar,

deputados e senadores da “tropa de choque” do governo mudam de tática. A ordem

agora é “matar” a CPI na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), um órgão da

Câmara dos Deputados. Ali o Palácio do Planalto acha que dispõe de votos para frustrar

a CPI, declarando-a inconstitucional.



A alegação é falta de “fato determinado”, algo que justifique a investigação.

Tudo se resumiria a suspeitas, usadas pela oposição por motivos eleitorais, para

produzir uma devassa na administração petista. A decisão da CCJ terá de passar pelo

crivo de deputados e senadores, num momento em que pesquisas não deixam dúvidas: a

população quer a investigação do escândalo.



Para complicar as coisas há uma crise na relação Palácio do Planalto/PT.

Ministros não se entendem entre si. Lula, atrás de uma saída, escolhe o ministro

Antonio Palocci (PT-SP) para negociar com parlamentares. O objetivo é um só: abortar

a CPI. A condução do processo, nas mãos de Palocci, desagrada a José Dirceu (PT-SP),



o poderoso ministro da Casa Civil, que mantém uma disputa surda com o ministro da

Fazenda. Do deputado João Paulo Cunha (PT-SP):

– Não vai haver CPI.

Do líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP):

– A tese de inconstitucionalidade da CPI tem eco e respaldo em vários deputados

da CCJ.

Deputado Paulo Rocha (PA), líder da bancada do PT:



– Temos maioria na CCJ, temos maioria no plenário, estamos reconstruindo a

nossa maioria política.

Opinião do procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, favorável à CPI:



– Quando há um fato, e não é tolo, é dever fazer um amplo esclarecimento.

Outro problema no horizonte, com potencial para atormentar o governo.

Senadores de oposição decidem acionar o STF (Supremo Tribunal Federal), com a

finalidade de reavivar uma CPI dos Bingos. O objetivo é apurar irregularidades em

casas de jogo e a conduta de Waldomiro Diniz, o ex-assessor do ministro Dirceu

fulminado em 2004, após aparecer numa gravação pedindo propina.



O requerimento da CPI dos Bingos fora arquivado pelo então presidente do

Senado, José Sarney (PMDB-AP). Aliado do governo, Sarney determinara o

engavetamento da comissão alegando que nada podia fazer, já que os líderes da base

governista se recusavam a indicar os nomes para compor a CPI.



19 – 1/6/2005 A imprensa volta a noticiar os subterrâneos do poder. As estatais

Furnas Centrais Elétricas e Infraero indicaram, de forma suspeita, negócios a ser

intermediados pela corretora de seguros Assurê, de propriedade de Henrique Brandão, o

amigo do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Brandão aparece associado à corretora

norte-americana Acordia. A notícia é da Folha de S.Paulo.



..2006 Ivo Patarra

Este livro é distribuído pela licença Creative Commons

http://www.escandalodomensalao.com.br/





O Chefe, por Ivo Patarra



Conforme a reportagem, “a existência de cartas de estatais solicitando ao IRB a

nomeação da Assurê/Acordia era comentada por resseguradores desde o ano passado”.

O jornal considera estranha a rapidez com que a indicação foi feita:



“A correspondência da Infraero foi assinada no mesmo dia em que a Acordia

obteve licença do IRB para operar no Brasil: 6 de agosto de 2003.”



21 – 3/6/2005 As manchetes de jornais chocam a opinião pública. “Operação

abafa da CPI custa R$ 400 milhões”, afirma a Folha de S.Paulo. “Contra a CPI, Palocci

abre cofre”, escreve O Estado de S. Paulo. Na Folha, a informação de que “os líderes

governistas estão fazendo listas de deputados fiéis para ter suas emendas pagas”. A

operação vai liberar a dinheirama das emendas parlamentares para beneficiar redutos

eleitorais dos aliados do governo.



Já O Estado afirma que o ministro Antonio Palocci (PT-SP) prometeu R$ 1,5

milhão por deputado que votar a favor da derrubada da CPI. “Com isso, os governistas

estão agora mais otimistas quanto ao sucesso da operação montada para abafar a

investigação”.



A revista Veja reproduz em seu site na internet a gravação da entrevista do expresidente

do IRB (Instituto de Resseguros do Brasil), Lídio Duarte. Em depoimento à

Polícia Federal, ele desmentira o teor do que dissera à revista. A divulgação da fala

renova o combustível político da crise. Fica a impressão de que Lídio Duarte foi

pressionado a recuar, antes de depor no inquérito policial. Afinal, a reprodução de sua

voz não deixa dúvidas: ele havia mesmo contado à reportagem de Veja a história da

mesada que deveria ser entregue ao PTB. Eis a declaração:



– A história é a seguinte: dizem que o partido tem despesas com o diretório, com

as festas, com os jantares, com não sei o quê. Cada indicado tem de botar lá R$ 400 mil

por mês, entendeu?

22 – 4/6/2005 Mais um petardo contra o presidente do PTB. A revista Época

estampa, na capa: “O laranja de Roberto Jefferson”. Conta a história do dono de uma

pequena sorveteria de beira de estrada, em Cabo Frio (RJ). Foi motorista, segurança e

funcionário de gabinete do deputado Jefferson (RJ).



Ex-camelô, Durval da Silva Monteiro enfrenta problema até para pagar a conta

de luz da sorveteria. O pequeno estabelecimento tem 25 metros quadrados. Mas o

sorveteiro “ganhou” duas emissoras de rádio de Jefferson, suspeito de ser o verdadeiro

dono dos negócios. Uma das emissoras, a Rádio Matozinho FM, de Três Rios (RJ), em

20 anos nunca rendeu um real a Durval. Sobre a outra, em Paraíba do Sul (RJ), o

sorveteiro não tem informações. Simplesmente desconhece. Não tinha a menor idéia de

que era um dos donos do negócio. Foi informado pela revista. Trecho da entrevista

publicada na Época traz a reação do sorveteiro:



– Rádio Clube Vale do Paraíba? Eu não sou sócio dela não. Isso aí é um troço

novo para mim. Rádio Clube Vale do Paraíba... Vou lá buscar ela! Quero um pedaço

dela já, já. Essa rádio eu até acho que era sócio dela também.

Veja descreve o desbaratamento de uma quadrilha. A organização cobrava

propina para fazer vistas grossas à extração ilegal de madeira, em Mato Grosso. A

reportagem de capa, “Amazônia à venda”, traz foto da prisão do gerente do Ibama

(Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) em Mato

Grosso. Hugo Werle aparece algemado. O deputado Carlos Augusto Abicalil (PT-MT)



o indicara para o cargo. Werle é conselheiro fiscal do PT e atuou como arrecadador de

dinheiro na campanha eleitoral pela Prefeitura de Cuiabá, em 2004. É acusado de

enriquecimento ilícito.

Werle foi preso com outros dois militantes do PT, ambos gerentes do Ibama.

Marcos César Antoniassi, de Juara (MT), e Ana Lúcia da Riva, de Sinop (MT). O

primeiro preside o diretório do PT de Novo Horizonte do Norte (MT). É acusado de

emitir laudos falsos de vistoria e de atestar a existência de madeireiras-fantasmas. Ana

Lúcia de Riva, por sua vez, é casada com o presidente do diretório do PT em Alta

Floresta (MT).

A Polícia Federal calculou que a madeira derrubada ilegalmente pela quadrilha

seria suficiente para carregar 66 mil caminhões em dois anos. Uma devastação. Entre

outros expedientes, os funcionários do Ibama vendiam autorizações para o transporte de

“produtos florestais” e facilitavam a falsificação de documentos. Veja reproduz um

diálogo telefônico interceptado pela Polícia Federal. Nele, dois madeireiros, acusados

de pertencer à quadrilha, defendem a manutenção de Werle no Ibama. Para tanto,

resolvem prestigiar um jantar político do PT em Cuiabá:

– Mandaram um convite pra mim aqui, pra uma janta do José Dirceu.

– Ah, o Zé Dirceu vai vir aí?

– Vai, amanhã.

– Ah, mas o Zé Dirceu é mala...

– Tem que pagar o convite, adivinha o preço do convite...

– R$ 100.

– R$ 500. Mas é brabo, é porque é eleição do cara, entendeu? E aqui, e se o cara

não ganhar, é perigoso o Hugo sair.

– Não, não. Então tem que deixar ele aí.

23 – 5/6/2005 Divulgada pesquisa Datafolha. Levantamento nacional mostra

que, num período de um ano, dobrou de 32% para 65% o percentual de brasileiros que

acreditam que haja corrupção no governo Lula. E 88% apóiam a criação da CPI dos

Correios.

Fontes do Palácio do Planalto assopram informações a jornalistas que fazem a

cobertura política de Brasília. Assinalam uma mudança no discurso de Lula. O

presidente não vai mais disfarçar um “extremo constrangimento” com as denúncias que

envolvem o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). A estratégia é isolar o petebista,

contaminado de forma irreversível pela crise. Suposto desabafo de Lula a ministros de

seu círculo mais próximo:

– Isso não pega em mim. Quem cometeu irregularidade ou tem culpa no cartório,

que pague o preço.

Outra frase atribuída ao presidente:

– Não sou conivente de forma alguma.

Dentro do PTB, clima de tensão. Um dos integrantes da direção do partido, sem

se identificar, dá entrevista para relatar o constrangimento de ver o presidente do

partido, Roberto Jefferson, no noticiário sobre o escândalo de corrupção. Mas

acrescenta: ninguém ousa tomar a iniciativa de afastá-lo. Único a se identificar

publicamente, o senador Fernando Bezerra (PTB-RN) escolhe as palavras:

– O caso é grave e, se eu fosse ele, ia querer que tudo fosse apurado.

24 – 6/6/2005 Entrevista-bomba de Roberto Jefferson. O deputado denuncia para

a Folha de S.Paulo, pela primeira vez, a história do mensalão. O Brasil não será mais o

mesmo. “PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson”, é a manchete de

primeira página. A entrevista, concedida à jornalista Renata Lo Prete, põe Brasília em

polvorosa.

O presidente do PTB acusa o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, homem da

cúpula do partido e da confiança do presidente Lula. Acusa-o de dar dinheiro a

representantes do PP e do PL, em troca de apoio ao governo no Congresso.

Jefferson relata à jornalista o diálogo que manteve com o ex-presidente do PTB,

José Carlos Martinez, morto em acidente aéreo, em outubro de 2003:

– Um pouco antes de o Martinez morrer, ele me procurou e disse: “Roberto, o

Delúbio está fazendo um esquema de mesada, um mensalão, para os parlamentares da

base. O PP, o PL, e quer que o PTB também receba. R$ 30 mil para cada deputado. O

que você me diz disso?” Eu digo: “Sou contra. Isso é coisa de Câmara de Vereadores de

quinta categoria. Vai nos escravizar e vai nos desmoralizar”.

Em outro trecho, Jefferson conta que Delúbio manteve contato com o líder do

PTB na Câmara dos Deputados, José Múcio (PE):

– Final de dezembro, início de janeiro, o doutor Delúbio o procura: “O Roberto é

um homem difícil. Eu quero falar com você. O PP e o PL têm uma participação, uma

mesada, eu queria ver se vocês aceitam isso”. O Múcio respondeu que não poderia

tomar atitude sem falar com o presidente do partido.

Em seguida, Jefferson menciona uma reunião entre os deputados Valdemar

Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (PL-RJ) e Pedro Henry (PP-MT), para pressionar

Múcio:

– “Que que é isso? Vocês não vão receber? Que conversa é essa? Vão dar uma

de melhores que a gente?” Aí o Múcio voltou a mim. Eu respondi: “Isso desmoraliza.

Tenho 22 anos de mandato e nunca vi isso acontecer no Congresso Nacional”.

Jefferson diz à jornalista ter procurado o ministro do Turismo, Walfrido Mares

Guia (PTB-MG):

– No princípio de 2004, liguei para o ministro Walfrido e disse que precisava

relatar algo grave. Conversamos num vôo para Belo Horizonte. “Walfrido, está havendo

essa história de mensalão”. Contei desde o Martinez até as últimas conversas. “Em

hipótese alguma. Eu não terei coragem de olhar nos olhos do presidente Lula. Nós não

vamos aceitar”.

O deputado diz que passou a viver uma “brutal pressão”, pois os deputados do

PTB sabiam que os colegas do PL e do PP recebiam o mensalão.

– Fui ao ministro Zé Dirceu, ainda no início de 2004, e contei: “Está havendo

essa história de mensalão. Alguns deputados do PTB estão me cobrando. E eu não vou

pegar. Não tem jeito”. O Zé deu um soco na mesa: “O Delúbio está errado. Isso não

pode acontecer. Eu falei para não fazer”. Eu pensei: vai acabar. Mas continuou.

Agora, o diálogo com o ministro Ciro Gomes (PSB-CE), da Integração

Nacional:

– Lá para junho eu fui ao Ciro Gomes. Falei: “Ciro, vai dar uma zebra neste

governo. Tem um mensalão. Hoje eu sei que são R$ 3 milhões, R$ 1,5 milhão mensal

para o PL e para o PP. Isso vai explodir”. O Ciro falou: “Roberto, é muito dinheiro, eu

não acredito nisso”.

– Aí fui ao ministro Miro Teixeira, das Comunicações. Levei comigo os

deputados João Lyra e José Múcio. Falei: “Conte ao presidente Lula que está havendo o

mensalão”. Nessa época o presidente não nos recebia. Falei isso ao Aldo Rebelo, que

então era líder do governo na Câmara.

– A quem mais no governo o senhor denunciou a situação?

 – Disse ao ministro Palocci: “Tem isso e é uma bomba”. Fui informando a todos

do governo a respeito do mensalão. Me recordo inclusive de que, quando o Miro

Teixeira, depois de ser ministro, deixou a liderança do governo na Câmara, ele me

chamou e falou: “Roberto, eu vou denunciar o mensalão. Você me dá estofo?” Eu falei:

“Não posso fazer isso. Vamos abortar esse negócio sem jogar o governo no meio da rua.

Vamos falar com o presidente Lula que está havendo isso”. Me recordo até que o Miro

deu uma entrevista ao Jornal do Brasil denunciando o mensalão e depois voltou atrás.

– No princípio deste ano, em duas conversas com o presidente Lula, na presença

do ministro Walfrido, do líder Arlindo Chinaglia, do ministro Aldo Rebelo, do ministro

José Dirceu, eu disse ao presidente: “Presidente, o Delúbio vai botar uma dinamite na

sua cadeira. Ele continua dando mensalão aos deputados”. “Que mensalão?”, perguntou

o presidente. Aí eu expliquei ao presidente.

– Qual foi a reação dele?

– O presidente Lula chorou. Falou: “Não é possível isso”. E chorou. Eu falei: “É

possível sim, presidente”. Estava presente ainda o Gilberto Carvalho.

– Toda a pressão que recebi neste governo, como presidente do PTB, por

dinheiro, foi em função desse mensalão, que contaminou a base parlamentar. Tudo o

que você está vendo aí nessa queda-de-braço é que o mensalão tem que passar para R$

50 mil, R$ 60 mil. Essa paralisia resulta da maldição que é o mensalão.

– Isso não existia também no governo passado?

– Nunca aconteceu. Eu tenho 23 anos de mandato. Nunca antes ouvi dizer que

houvesse repasse mensal para deputados federais por parte de membros do partido do

governo.

– O que, em sua opinião, levou a essa situação?

– É mais barato pagar o exército mercenário do que dividir o poder. É mais fácil

alugar um deputado do que discutir um projeto de governo. É por isso. Quem é pago

não pensa.

– O que fez o presidente Lula diante de seu relato?

– Depois disso parou. Tenho certeza de que parou, por isso está essa insatisfação

aí. Ele meteu o pé no breque. Eu vi ele muito indignado. Pressão, pressão, pressão,

pressão. Dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro, todo mundo tem, todo mundo tem. Acho

que foi o maior erro que o Delúbio cometeu.

Para Jefferson, “o governo agiu para isolar o PTB”, para “circunscrever a

desonra ao PTB”. Ele não perdoa o discurso em que José Genoino falou em

“requalificar” a base de apoio ao governo:

 O PTB é uma base desqualificada. Foi isso que afetou. Não segurou ninguém.

Não são parceiros, não são solidários.

Ele prossegue:

– Eu sempre disse aos meus companheiros, e eles são testemunhas desde o

início, o PT não tem coração, só tem cabeça. Ele nos usa como uma amante e tem

vergonha de aparecer conosco à luz do dia. Nós somos para o PT gente de segunda, eu

sempre me senti assim. A relação sempre foi a pior possível.

E mais:

– Você não pode confiar, o que está fechado não está fechado. Tudo o que é dito

não é cumprido. Toda a palavra que é empenhada não é honrada. O PT esgarçou,

esgarçou, esgarçou a minha autoridade como presidente do PTB, porque prometeu e não

cumpriu. O pior foi na eleição, o que o Genoino fez comigo. Ele e o seu Delúbio.

Em outra parte da entrevista à Folha, o presidente do PTB responde a denúncias

sobre o IRB (Instituto de Resseguros do Brasil). Relata encontro com o presidente da

estatal, Lídio Duarte:

– Por volta de agosto de 2004, eu o chamei ao meu escritório no Rio e disse:

“Quero que você me ajude, procurando essas pessoas que trabalham com o IRB, para

fazerem doações ao partido nesta eleição, porque estamos em situação muito difícil”.

Ele ficou de tentar. Em setembro, ele voltou a mim e disse: “Deputado, não consegui

que as doações sejam por dentro, com recibo. Querem dar por fora, e isso eu não quero

fazer”. Eu falei: “Então não faça”.

Jefferson conta que Lídio Duarte aproximou-se de Luiz Eduardo de Lucena,

diretor comercial do IRB, indicado para o cargo pelo líder do PP na Câmara, deputado

José Janene (PR). Instala-se uma queda-de-braço entre o PTB e o PP:

– O Palocci conversa comigo e diz o seguinte: “Roberto, vamos fazer uma saída

por cima. Nós temos o diretor administrativo, um homem de altíssimo gabarito, o

Appolônio Neto, sobrinho do Delfim Netto, fez um dos melhores trabalhos de

modernização do IRB. A gente passa o Appolônio como sendo do PTB, e ele sendo

sobrinho do Delfim, que é do PP, e a gente resolve a situação”. Eu falei: “Não sou

problema, está dada a solução”. O doutor Appolônio foi uma indicação salomônica do

ministro Palocci.

O presidente do PTB também reclama que o PT, com 20% da base, responde

pela indicação de 80% dos cargos:

– Mesmo o IRB: o PTB tem a presidência, mas todos os cargos são do PT. A

Eletronorte: o presidente, doutor Roberto Salmeron, é um dos melhores quadros do

PTB. Mas, de novo, toda estrutura abaixo é do PT. O diretor mais importante, o de

Engenharia, é o irmão do ministro Palocci.

O escândalo do mensalão explode em Brasília. O ministro das Relações

Institucionais, escalado pelo Palácio do Planalto, fala da entrevista de Roberto

Jefferson. Admite que Lula fora informado por Jefferson do suposto pagamento de

mesadas a deputados do PL e do PP, em 23 de março de 2005. Nervoso, Aldo Rebelo

(PC do B-SP) afirma:

– É bom deixar claro que não há nenhuma acusação que relacione o pagamento a

parlamentares por parte do governo. A denúncia do deputado Roberto Jefferson refere-

se ao hipotético pagamento de um partido a parlamentares de outros partidos. O

governo não sofreu qualquer tipo de acusação.

O ministro confirma a reunião em que Jefferson levou o assunto ao presidente.

Estavam presentes, entre outros, o ministro Walfrido Mares Guia (PTB-MG), os

deputados Arlindo Chinaglia (PT-SP), José Múcio (PTB-PE) e ele próprio, Aldo.

– De passagem, durante essa conversa, Jefferson fez referência ao pagamento a

parlamentares na Câmara... Jefferson não fez referências nem a fatos nem a pessoas,

fazendo apenas um comentário genérico.

O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), confirma que Lula

foi avisado por Jefferson. E também menciona a reunião de 23 de março:

– Nenhum dos presentes tratou aquilo como denúncia, nem discutiu o assunto na

reunião. Depois, Lula chamou Aldo e Chinaglia e perguntou se havia comentários sobre

isso na Câmara. Não houve denúncia, apenas o relato de boato.

O deputado Miro Teixeira (PT-RJ) confirma os relatos feitos por Jefferson e põe

mais lenha na fogueira:

– O relato do Roberto Jefferson foi mais amplo. Não posso relatar em detalhes,

pois não tenho elementos de prova. Mas ele descreveu uma cena de corrupção em um

ambiente ministerial, a que ele assistiu.

A “cena de corrupção”, como definiu Miro, tinha, segundo Jefferson, um

ministro, representantes de três partidos e um diretor de departamento. Ocorreu num

ministério e, na ocasião, um integrante de um partido deu dinheiro a outro, de outro

partido. Quando ouviu o relato de Jefferson, Miro era ministro das Comunicações e

filiado ao PDT. Reação de Miro, segundo ele mesmo:

– Vamos agora ao presidente da República.

Miro afirma que Jefferson se recusou e que, sem provas, teria sido irresponsável

se encaminhasse a denúncia. O Jornal do Brasil publicou reportagem sobre o assunto

em 24 de setembro de 2004. Miro, fonte da notícia, negou posteriormente as

informações. O caso não foi investigado pela Câmara.

O governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), também testemunha: aliados

do governo Lula procuraram dois deputados federais goianos e ofereceram mesada para

que trocassem de partido.

– Foi um assédio. Era para trocar de partido, sair do PSDB e ir para a base do

governo, por uma mesada de R$ 40 mil por mês e R$ 1 milhão por ano de bônus.

O mais grave: o governador conta que relatou o caso ao presidente da República

em 5 de maio de 2004, durante uma visita de Lula a Rio Verde (GO). Segundo Perillo,

Lula reagiu como se não soubesse, disse que iria apurar e responsabilizou o governo

passado, período no qual, conforme o presidente, esse tipo de expediente teve início. O

governador não aceitou:

– Eu retruquei. Disse que estava falando do que estava acontecendo no governo

atual, no governo dele.

O ministro Ciro Gomes (PSB-CE) confirma a procedência das denúncias de

Jefferson:

– É fato que, há um ano, ele esteve na minha sala e, numa conversa, disse que

havia um boato de que haveria essa prática de dinheiro para uma fração de

parlamentares que, segundo mencionou, estavam no PL e no PP.

Para Ciro, não existiam provas do esquema.

– Perguntei se ele tinha dados mais objetivos, que me obrigassem a tomar

alguma atitude de levar adiante a informação. Ele não tinha.

O ministro Walfrido Mares Guia (PTB-MG) também ouviu os “boatos de

mesadas” feitos por Jefferson, duas vezes. E confirma que testemunhou a reunião de 23

de março, da qual Lula participou:

– Ele falou no final da reunião, disse que tinha boatos sobre um mensalão, mas

ficou nisso. Logo depois fomos embora.

O prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), também vem a público. Para dizer que

somas em dinheiro eram distribuídas de forma aberta durante almoços mensais

realizados em restaurantes de Brasília. Relata ter tomado conhecimento do esquema por

intermédio de 15 parlamentares, com os quais conversou.

– O dinheiro chegaria em uma mala, e os pacotes eram distribuídos.

De forma reservada, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) avaliam que

em tese Lula pode sofrer processo de impeachment, por crime de responsabilidade. O

presidente teria prevaricado se ficar provado que, informado a respeito da existência do

mensalão, não tomou providências para investigar as denúncias.

Declaração do jurista Fábio Konder Comparato, presidente da Comissão de

Defesa da República e da Democracia, um dos mais conceituados advogados do país:

– A rigor, se ficar comprovado o ato de corrupção, há várias implicações penais.

Configura, inclusive, o crime de responsabilidade por parte do presidente, o que o

sujeita a impeachment.

Comparato acrescenta, a respeito de Lula:

– Ele, de qualquer maneira, estava ciente e mandou prosseguir, ou ficou ciente e,

como diz Jefferson, mandou frear a coisa, mas não tomou providências para apurar

responsabilidades.

O PPS inicia processo de coleta de assinaturas para criar a CPI do Mensalão. Em

decorrência da crise, o apadrinhado de Roberto Jefferson (PTB-RJ) na presidência da

Eletrobrás, Roberto Salmeron, demite-se do cargo. Outra conseqüência do escândalo: o

assessor dos Correios, Fernando Godoy, já afastado, é indiciado pela Polícia Federal.

Enquanto isso, aparentemente alheio à gravidade dos fatos, o PT trata de emitir

nota em que nega a existência do mensalão. E seu presidente, José Genoino, manifesta-

se mais uma vez contrário à CPI dos Correios. A essa altura, a comissão já é fato

consumado. O PT sabe disso e toma providências para blindar o tesoureiro Delúbio

Soares. Proíbe-o de dar entrevistas e o isola na sede do partido, em São Paulo. O

tesoureiro só sai de lá à noite, apressado. O carro dele é escoltado por duas

motocicletas.

Apreciador de charutos cubanos, Delúbio tem intimidade com Lula e o comando

do PT. Em 2004, contudo, foi denunciado por comprar fazendas em Goiás, com

dinheiro vivo. No mesmo ano pediu que o Banco do Brasil comprasse 70 ingressos por

R$ 1.000,00 cada um, para um show musical. Detalhe: a arrecadação serviria para

comprar uma nova sede para o PT. Denunciada, a operação foi desfeita.

25 – 7/6/2005 Acuado, Lula muda novamente de estratégia. Ordena ao PT que

apóie a CPI dos Correios e, mais do que isso, se some à iniciativa de criar a CPI do

Mensalão. O governo não diz, mas analisa que uma segunda comissão acabará tirando o

foco da primeira. Supõe que os trabalhos ficarão dispersos e o processo como um todo

confundirá a opinião pública. Em sua ofensiva, Lula determina a demissão de diretores

do IRB, dos Correios e solicita ao PT o afastamento do tesoureiro Delúbio Soares.

Contrariado, José Genoino, o presidente do PT, trata de defender o que chama de

“patrimônio ético” do partido. E garante que o assunto mensalão jamais circulou dentro

do PT:

– O que aconteceu com o Delúbio? Uma denúncia falsa e mentirosa.

O secretário-geral do partido, Silvio Pereira, o Silvinho, também na ofensiva,

descarta uma investigação interna do PT sobre as atividades de Delúbio:

– Não há necessidade. Não há nada contra ele.

Na mesma linha, Paulo Ferreira, secretário de Relações Internacionais do PT:

– Delúbio é quadro de confiança do partido e seu afastamento não está em pauta.

O tesoureiro permanece recluso, protegido da imprensa. No final do dia, deixa a

sede do PT apressado, mais uma vez. Agora, abaixado, no banco de trás de um carro,

com vidros escuros. Outro veículo, para despistar, deixara o local pouco antes,

pretendendo confundir os jornalistas.

Declaração da senadora Heloísa Helena (PSOL-AL), ex-petista, para quem o

governo Lula entregou a máquina pública “para ser parasitada por delinqüentes de

luxo”:

– Tenho absoluta convicção de que ninguém da cúpula palaciana do PT age

isoladamente na montagem dos crimes contra a administração pública. Se Delúbio,

Waldomiro e outros, entre aspas, quadros partidários agiam, é porque havia autorização

e leniência do presidente Lula. Pelo que eu conheço do PT, não existe atuação

individual.

Reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revela uma crise na Petrobrás,

decorrente de nomeações políticas. A proliferação de empresas de “papel”, voltadas ao

transporte de gás natural, serve de fato para abrigar apaniguados políticos, nomeados

com objetivo de acomodar situações e dar governabilidade à administração federal.

Segundo o jornal, o expediente gerou uma crise na Gaspetro, subsidiária da

Petrobrás, e a demissão do diretor João Eudes Touma. Ele entregou uma carta

justificando sua saída: houve contratações indevidas de pessoal para empresas que, a

princípio, seriam virtuais. Uma delas, a Transportadora Nordeste Sudeste, recebeu, em

cinco meses, R$ 722 mil, apenas para pagar salários.

26 – 8/6/2005 O tesoureiro Delúbio Soares, com um broche do PT no peito,

concede entrevista. Fala a um batalhão de jornalistas. Não convence. Apesar de

orientado por advogados e pela cúpula do PT, Delúbio é patético. Nervoso, usa frases de

efeito, vazias, evasivas, e não responde a parte das perguntas. Por fim é salvo pelo

presidente do partido, José Genoino, que encerra a entrevista. Antes, os repórteres já

haviam sido impedidos de retrucar e questionar as respostas do tesoureiro.

Delúbio é um dos três dirigentes do PT que usam carro blindado. Além dele, o

privilégio cabe ao ministro José Dirceu e ao presidente Lula. Durante a entrevista,

repete seis vezes que o PT “não compra votos nem apoio” de deputados. Utiliza

variações do termo “chantagem” 15 vezes. Uma das falas, sempre confusas:

– Nós não aceitamos chantagem. Não me prejulguem pela versão de uma

chantagem porque o Brasil é maior do que essas acusações. Estou muito indignado.

Estão tentando chantagear não só o PT, mas também o governo e também o Congresso.

O PT não se rende e não se vende.

Perguntado sobre suas idas ao Palácio do Planalto, sede do governo federal,

apesar de não ter cargo público, o tesoureiro diz: “Lá estive várias vezes, para tratar dos

assuntos de interesse do PT. É isso que aconteceu”. A respeito da entrega de dinheiro a

partidos da base aliada:

– O PT participou, no ano passado, de campanha eleitoral. Os acordos eleitorais

foram tratados entre os partidos. O PT e os partidos da base aliada fizeram acordos que

foram traduzidos em apoio aos candidatos nos municípios. Isso foi feito em comum

acordo entre os partidos.

Acerca da ligação com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto (SP), cujo

partido, da base aliada, foi citado por Roberto Jefferson (PTB-RJ) como um dos

beneficiários do mensalão, Delúbio responde:

– Não tenho nenhuma restrição, o presidente do PL tem sido uma pessoa correta.

Não tenho nenhum problema de encontrar o presidente do PL, seja na minha casa, seja

no escritório do PT, seja na sede do PT ou em Mogi das Cruzes, onde fui visitá-lo, em

apoio ao candidato do PL naquela cidade.

A Polícia Federal investiga denúncias de extorsão praticadas por Maurício

Marinho, nos Correios. Um dos dez empresários que prestaram depoimento, Haroldo

Cláudio, dono de uma empresa de calçados, disse que recebeu proposta para pagar R$

350 mil de propina. Se desse o dinheiro, ganharia licitações na estatal. Segundo o

empresário, Marinho disse que o dinheiro iria para o PTB.

27 – 9/6/2005 O Congresso instala a CPI dos Correios. O deputado Sandro

Mabel (PL-GO) nega ter proposto à deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO) para que

deixasse o partido de oposição e ingressasse na base aliada do governo, em troca de

uma mesada de R$ 30 mil e um bônus de R$ 1 milhão, no final do ano. Dois

parlamentares apontam Mabel como o autor do assédio à deputada. O caso foi relatado

pelo governador Marconi Perillo (PSDB) a Lula.

Mabel admite ter conversado com Raquel, mas nega que ofereceu dinheiro. E

envolve o vice-presidente da República, José Alencar (PL-MG):

– A deputada uma vez me procurou e disse: “Sandro, estou querendo ter mais

espaço”. Até havia uma assessora dela. Eu falei: “Raquel, o PL está sempre de portas

abertas”. José Alencar já tinha falado isso para ela. Estamos precisando de mulher.

Agora, financeiro? Recusamos 15 parlamentares em um ano, vamos dar recursos

financeiros para quê? Em primeiro lugar, não temos nem recursos.

De acordo com Mabel, a deputada acabou decidindo não sair do PSDB, depois

de conversar com a própria base política. Diz Mabel:

– Ela só queria entender o processo, porque estava meio chateada com não sei o

quê. Foi conversa de corredor.

A repórter Sheila D’Amorim, de O Estado de S. Paulo, questiona Mabel. Diz

que o governador de Goiás mencionara dois deputados assediados, sendo que Raquel

confirmara uma abordagem. Reação do deputado:

– Mas foi abordada com dinheiro? Então não foi comigo que ela conversou. É

simples. É só chamar a Raquel ou quem quer que seja. A nossa posição é clara nesse

assunto. Aqui recusamos parlamentares. Para que iríamos pagar parlamentar para vir?

Dirigindo-se à repórter, com ironia, Mabel insinua que deseja saber que partido

paga parlamentares, para que mudem de legenda:

– Vou fazer uma proposta para você. Quando você descobrir, me conta porque aí

vou para esse partido também.

28 – 10/6/2005 A Abin (Agência Brasileira de Inteligência, vinculada ao

governo federal) divulga nota oficial para explicar que o recém-afastado presidente dos

Correios, João Henrique Souza Almeida, integrante da cota do PMDB no governo Lula,

vai ser intimado a depor e poderá responder a processo por prevaricação e improbidade

administrativa. Motivo: antes do escândalo nos Correios vir a público, Almeida recebeu

prazo para afastar Maurício Marinho da estatal e relatar à Polícia Federal atividades

supostamente ilícitas do funcionário. Não o fez. A Abin informa que havia infiltrado

agentes entre empresários descontentes, por ter sido informada da ocorrência de fraudes

em licitações nos Correios.

29 – 11/6/2005 Nova gravação clandestina com diálogos mantidos por Maurício

Marinho chega à imprensa. Desta vez, são divulgadas na Folha de S.Paulo.

Investigações sugerem disputas comerciais como causa das escutas. As conversas

revelam tentativas de extorquir empresários que desejam firmar contratos para fornecer

bens e serviços aos Correios.

A fita segue o mesmo padrão da anterior. Marinho recebe em sua sala

interlocutores supostamente ligados a empresários, interessados em negócios com os

Correios. Sem saber que está sendo gravado, uma vez mais o funcionário menciona seus

contatos com o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) e Marcus Vinícius Vasconcelos

Ferreira, o genro de Jefferson e assessor da diretoria da Eletronuclear. Trecho do

diálogo, que começa com o interlocutor:

– Eles querem garantir a condição deles dentro dos Correios. É mais do que

importante, é vital até, para essa empresa. E queriam saber daí de você, de mim, me

disseram, “olha, Joel, vê se é ele mesmo a pessoa”.

– Nós estamos conversando aqui. Eu vou sair daqui ainda hoje e vou direto para

o diretor, tá?

– O que eu precisava saber de você... Mas isso bem exato e prático. Quais seriam

os valores, incluindo a diretoria. Porque aí eu acerto com você as coisas, e você faz essa

distribuição.

– Normalmente é feito isso, todo negócio é acertado... Tem algo que sobe, né?, e

um “x” que fica embaixo. Isso é acertado assim.

– Sim, mas você me deixa numa condição meio tranqüila, porque efetivamente

você tem essa condição de negociação.

– Tenho. O que for acertado... O que for fechado é o que sobe.

“O PT assombra o Planalto”, diz o título de reportagem de Veja. A revista

afirma que o mensalão, no valor de R$ 30 mil, é pago “para um plantel estimado de uns

90 deputados, o que daria cerca de R$ 2,7 milhões mensais”. Relata ter conversado com

três ministros, cinco deputados e um senador, e que “todos confirmaram, com a

condição de não ter a identidade revelada, a existência do mensalão”. Informa que os

nove políticos pertencem ao PT, PMDB, PSB, PP e PFL. “Esses políticos contam que

Delúbio desembarcava em Brasília com o dinheiro e se dirigia à residência dos líderes e

presidentes de partidos para fazer a distribuição”.

Veja traz declaração de um deputado petista que pede para não ser identificado.

Segundo ele, o PT despreza o Congresso:

– O PT acredita que é um poder burguês. Por isso, acha que lá só tem corrupto e

que o jeito mais fácil de controlá-lo é com dinheiro.

Em outra reportagem, Veja acusa madeireiros do Pará de doarem dinheiro a

lideranças do PT, em troca de autorização para derrubar árvores na Amazônia. O

esquema reuniu três candidatos a prefeito nas últimas eleições, dois deputados do PT,

funcionários do Ibama, Incra, sindicalistas e madeireiros. Escreve Veja:

“Os três candidatos a prefeito pelo PT, apurou a reportagem, teriam recebido

pelo menos R$ 300 mil de madeireiros, às vésperas das eleições, em troca de

autorização do Ibama para derrubar madeira ilegal. São eles: Paulo Medeiros, de Urará;

Chiquinho do PT, de Anapu; e Lenir Trevisan, de Medicilândia.”

Tudo intermediado pelos deputados petistas José Geraldo e Airton Faleiro,

ambos ligados ao Ibama. Veja descreve o método, “de um descaramento nunca visto”.

Feito o desmate ilegal e vendida a madeira nobre, o transporte passa pelos postos de

fiscalização graças a um adesivo colado nos caminhões. Os dizeres, impressos no

adesivo: “oPTante do Plano Safra Legal 2004”, assim mesmo, com as letras “p” e “t”

em maiúsculo.

O empresário Leivino Ribeiro, da Associação de Madeireiras dos Municípios de

Anapu e Pacajá, concede entrevista. Afirma que gastou R$ 2 milhões com

procedimentos para “documentar” a madeira, na parceria com o PT. A revista reproduz

 trechos de uma conversa gravada entre o deputado João Batista Oliveira, o Babá

(PSOL-PA), ex-petista, e um representante do sindicato dos reflorestadores do Pará.

Pergunta do deputado:

 Como era essa história do adesivo?

– O pessoal intitulou o acordo de “Optante do safra legal”, com destaque para a

sigla do PT no adesivo. Os caminhões com esse adesivo iam sem ninguém perturbar. Só

em Anapu foram mais de 100 mil metros cúbicos de madeira nesse esquema.

– Mas por que o Ibama liberou toda essa madeira? Vocês deram apoio para o PT

na região?

– Foi dado apoio, sim. Estou falando isso como sindicalista, sou do

Sindifloresta, participei das negociações, mas estou achando uma grande sacanagem.

– Mas tinha contrapartida financeira?

– Eles aproveitaram o momento para pedir apoio. O setor madeireiro tem muito

voto e também deu apoio financeiro.

O jornal O Estado de S. Paulo denuncia: Delúbio Soares, o tesoureiro do PT, é

funcionário fantasma. Professor de matemática da Secretaria de Educação de Goiás,

recebe salário mas não vai trabalhar. Está licenciado, com remuneração mensal de R$

1.242,56 para prestar serviços no sindicato da categoria, em Goiânia. Mas há cinco anos

Delúbio responde pelas finanças do PT e vive no eixo São Paulo-Brasília, bem distante

de Goiás. Antes disso, foi secretário sindical do PT por cinco anos, e tampouco prestou

serviços no sindicato. Delúbio costuma se apresentar, falsamente, como professor

aposentado.

30 – 12/6/2005 Nova entrevista do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) à

repórter Renata Lo Prete, da Folha de S.Paulo. Traz denúncias contra o governo Lula,

auxiliares do presidente, integrantes da base aliada no Congresso, membros do PT. E

introduz um novo personagem no cenário político nacional, até aqui desconhecido de

todos aqueles que não freqüentavam os escaninhos do poder em Brasília: o empresário

Marcos Valério Fernandes de Souza. Jefferson explica a origem do dinheiro do

mensalão:

– Vem de operações com empresas do governo e com empresas privadas.

– Que operações?

– Transferência de dinheiro à vista. Esse dinheiro chega a Brasília, pelo que sei,

em malas. Tem um grande operador que trabalha junto do Delúbio, chamado Marcos

Valério, que é um publicitário de Belo Horizonte. É ele quem faz a distribuição de

recursos. Sei que o deputado José Janene é um dos operadores. Ele vai na fonte, pega,

vem, é tido como um dos operadores do mensalão. Inclusive eu já vi o ministro Zé

Dirceu muito irritado com ele porque ele se apresentava como “operador do Zé Dirceu”.

Ele também é um dos homens que constroem o caixa para repartição entre deputados do

PP e do PL.

– Qual era exatamente o papel de Marcos Valério?

– Ele é operador do Delúbio, desde o início do governo. O Janene faz a mesma

operação. É de conhecimento notório.

– O senhor poderia citar nomes de deputados que recebiam essa remuneração

mensal?

– Isso eu vou deixar para a imprensa investigar. Mas eu sei que as direções do

PP e do PL recebiam. Não é segredo. Eles insinuaram isso para o Zé Múcio, que não

quis entrar.

Outro trecho:

 – Se você perguntar: “Tem provas? Fotografou? Gravou?” Não. Mas era

conversa cotidiana na Câmara a repartição de mesada entre os deputados da base aliada,

em especial o PL e o PP. Nunca ouvi falar do PMDB, e tenho certeza de que os

deputados e os senadores do PT jamais receberam isso.

– O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, já anunciou a decisão de processálo.

– É um direito dele. Na colocação que fiz, eu o atingi duramente. Ele tem o

direito democrático de me processar.

– Houve problema de dinheiro entre PT e partidos da base na campanha

municipal?

– Eu e o líder Zé Múcio acalmamos nossa base dizendo o seguinte: o PTB não

vai ter mensalão, que desmoraliza e escraviza o deputado, e nas eleições a gente

compõe com o PT uma troca de apoio e pede o financiamento para candidaturas que nós

entendemos que devemos ganhar. Foi pedida ao PTB, pelo José Genoino, uma planilha

por Estados de campanhas a prefeito que o PT financiaria para nós. Apresentamos uma

planilha de R$ 20 milhões. Esse recurso foi aprovado pelos dois e pelo Marcelo Sereno.

No princípio de julho de 2004, eu reuni o partido e comuniquei. O repasse do dinheiro

se dará em cinco etapas.

– O primeiro recurso chegou na primeira quinzena de julho: R$ 4 milhões, em

dinheiro, em espécie. Em duas parcelas: uma de R$ 2,2 milhões e, três dias depois, uma

de R$ 1,8 milhão. Quem trouxe o recurso à sede do PTB foi o Marcos Valério, em

malas de viagem. Eu e o Emerson Palmieri dividimos esses recursos entre candidatos. E

assumimos o compromisso, que era o do Genoino comigo, que outras parcelas viriam.

Elas não vieram, e os candidatos do PTB que haviam assumido compromissos de

campanha entraram em crise brutal. Essas coisas foram esticando a corda, tensionando a

relação do PTB com o PT.

– Que avaliação o senhor faz das reações dos membros do governo citados em

sua entrevista anterior?

– Os ministros foram covardes com o presidente. O Palocci sabia do mensalão

porque eu falei para ele. O Walfrido errou por não ter dito ao presidente sobre o

mensalão, porque eu falei com ele. O ministro Ciro sabia. O Zé Dirceu, conversei várias

vezes com ele sobre o mensalão. Deixaram o presidente completamente desinformado

de algo que viciou a relação do governo, e do comando do PT em especial, com a base

aliada no Congresso.

– Quando de minha conversa com o presidente este ano, lá no gabinete dele no

Palácio do Planalto, estávamos eu e o ministro Walfrido, quando eu disse a ele do

mensalão. Ele tomou um susto. Expliquei a ele no que consistia: um repasse de recursos

do Delúbio para líderes e presidentes de partido da base aliada dividirem um dinheiro

por mês com representantes de suas bancadas, em especial o PP e o PL. O PTB fora

convidado a participar e repelira.

– Acho que os ministros traíram a confiança do presidente. Como pode ministros

minimizarem, dizendo que não havia importância em minhas palavras, e ter essa

explosão no Brasil quando a Folha as coloca para a opinião pública? Só eles não tinham

dimensão da explosão que isso iria provocar? O presidente, foi como se alguém dissesse

“olha ali a tua mulher com outro homem”. Aquela reação de surpresa, de mágoa, as

lágrimas brotaram. Ele me pediu que explicasse como funcionava o mensalão. Eu disse.

Depois ele se levantou, me deu um abraço e eu saí.

– E o que eu sei, até pela vivência da Casa, essas coisas não se escondem, é que

houve uma atitude forte, porque o mensalão secou. E nós estamos assistindo a uma crise

de abstinência. O corpo mole é porque está faltando aquilo que o Delúbio sempre

transferiu a líderes e presidentes da base: o dinheiro para pagar o exército de

mercenário, as bancadas de aluguel.

Em outro trecho da entrevista, a repórter pergunta:

– Como se estabeleceu a relação do PTB com a cúpula petista?

– Quando, lá atrás, o José Carlos Martinez era presidente do PTB, e nós

começamos a constituir a relação, depois de nomeado o Walfrido Mares Guia ministro

do Turismo, o segundo cargo foi o do delegado Regional do Trabalho no Rio, Henrique

Pinho. Toda a estrutura abaixo dele foi nomeada pelo Silvio Pereira. Outro cargo:

Fernando Cunha, para a BR Distribuidora. Toda a estrutura abaixo do Fernando Cunha

foi nomeada pelo Silvio Pereira. Na área de Petrobrás, de petroquímica, quem manda é

ele.

– Um dia, perguntei: “Mas como é isso? Vocês dão a cabeça e tomam o corpo?”

E ele disse que esse era o jeito do PT de repartir o poder. Foi assim no Departamento

Nacional de Infra-Estrutura e Transportes. A primeira indicação para o Dnit, feita pela

bancada de São Paulo, acho que é Pimentel o nome, esse que hoje aparece nos jornais.

Toda a estrutura abaixo foi montada pelo Silvio e pelo Delúbio. O gerente, um tal de

Lauro Corrêa, é homem do PT. Ele mandava mais que o diretor-geral do Dnit. O PT

nomeava as pessoas que controlavam a estrutura do poder por baixo dos nomeados do

PTB.

– A quem o senhor se refere quando fala na direção do PT?

– Genoino, Marcelo Sereno, Delúbio Soares, Zé Dirceu, que sempre soube de

tudo. Várias vezes eu conversei com o Genoino e com o Delúbio no gabinete do

ministro Zé Dirceu. Tudo era tratado com o conhecimento dessas pessoas e do Silvio

Pereira. Isso no início do governo. Há uma sala contígua à do gabinete do ministro Zé

Dirceu no Palácio do Planalto, e de vez em quando nós fazíamos essas conversas. 90%

das conversas eram feitas no Palácio, numa salinha que era reservada ao Silvio Pereira.

De vez em quando o Delúbio metia a mão na porta, entrava, sentava, conversava e saía.

O Zé Dirceu participava da conversa, e o Genoino também.

Jefferson lembra o encontro com Lula, em janeiro de 2004, quando falou do

mensalão ao presidente. E revela suspeitas acerca do envolvimento de seu nome na

divulgação dos escândalos:

– E quando eu disse a ele, olhando nos olhos dele, do mensalão, o choque dele...

Eu tenho seis mandatos. Eu sou deputado federal desde o presidente Figueiredo. Eu

nunca tinha ouvido falar de financiamento de bancada aliada na base pelo partido do

governo. E contei isso ao presidente Lula. E vi a reação dele de perplexidade. E então as

coisas pararam. Mas o que eu estranho é que a Abin, depois que eu disse isso ao

presidente Lula, parte para mandar arapongas contra o PTB. Alguém, dentro do

governo, não gostou que nós passamos essa informação ao presidente.

Quanto à reação do governo, desde que decidiu contar o que sabe dos

pagamentos a deputados:

– Num primeiro momento, o Zé Dirceu ficou muito hostil comigo depois do meu

discurso na Câmara, quando eu assinei a CPI. Na véspera, houve reunião da executiva

do PTB para que todos os companheiros assinassem a CPI e nós devolvêssemos os

cargos ao governo.

Jefferson comenta a conversa, em sua casa, com José Dirceu e Aldo Rebelo. Os

dois homens de confiança de Lula pediram para que ele retirasse o nome do

requerimento de criação da CPI. Respondeu-lhes que se importava com a restauração da

honra, e que a revista Veja vinha promovendo um “verdadeiro linchamento”. Reação de

Dirceu, segundo Jefferson:

– Ele respondeu: “Roberto, na Veja não tenho nenhuma ação, porque a Veja é

tucana”. Eu falei: “Mas O Globo e a Globo estão repetindo o linchamento”. Ele falou:

“No O Globo eu falo por cima. Dá para segurar”.

Jefferson conclui:

– Retirar a assinatura foi o meu maior erro. Depois que fiz isso, recrudesceu o

noticiário contra o PTB. Eu entendi que foi uma armadilha do Zé Dirceu para mim.

Recrudesceu o noticiário, e eu vi claramente a mão do governo.

– Viu onde e como?

– Nas matérias que saíram na revista Época e no O Globo no fim de semana

seguinte. Violentamente contra mim e contra o PTB. Eu falei: “Eu errei, eu me

enfraqueci ao retirar a assinatura da CPI, e o Zé Dirceu armou essa arapuca pra mim”.

(...) Eu vejo nitidamente o dedo desse segmento, Zé Dirceu, Genoino e Delúbio, para

colocar esse cadáver podre no colo do PTB.

O ministro José Dirceu (PT-SP) e o presidente do PT, José Genoino, reagem à

nova entrevista de Jefferson. Negam as acusações do deputado. Para Genoino, é mentira

que Marcos Valério fazia pagamentos regulares a deputados:

– Marcos Valério nunca fez esse tipo de coisa, ele não é desse tipo.

A Folha de S.Paulo noticia uma reunião, ocorrida em fevereiro de 2004, na qual

40 deputados do PTB teriam decidido rejeitar a oferta de pagamentos mensais em troca

de apoio ao governo federal. O jornal afirma:

“Três deputados do PTB ouvidos pela reportagem confirmaram que Jefferson, há

mais de um ano, fala aberta e criticamente sobre o ‘mensalão’ com seus colegas na

sigla. Um deles, o deputado federal Pedro Fernandes (MA), disse que Jefferson “pôs em

discussão” a possibilidade na bancada, mas houve uma recusa unânime.”

A reportagem reproduz declaração do deputado Osmânio Pereira (PTB-MG):

– Em pelo menos duas reuniões ele disse que nunca aceitaria mensalão.

O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que na época fazia parte do PTB, também

mencionou Jefferson ao jornal:

– Ele ameaçou denunciar o mensalão. Disse assim: “Se tentarem cooptar

deputado meu em cima de mesadas, eu vou denunciar”.

E mais:

– Desde que Lula assumiu, tem esse boato aqui dentro. Mas eu não vou ser o

bocão para denunciar quem está recebendo.

A Folha publica o editorial “Adeus às ilusões”:

“A eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai se revelando um dos

maiores estelionatos eleitorais da história democrática do país. Todas as bandeiras que

um dia caracterizaram o Partido dos Trabalhadores foram conspurcadas. Até mesmo o

que se afigurava como o último baluarte petista, uma relação diferenciada com a ética e

a coisa pública, se reveste de tons de ‘bravata’, para utilizar um termo empregado pelo

próprio presidente da República ao negar propostas antes defendidas pelo seu partido.”

Em outro trecho, o editorial aponta:

“Em termos sociológicos, a ausência de um projeto ajuda a explicar a crise da

legenda. Sem uma utopia à qual aspirar, o poder pelo poder transformou-se em razão de

existência. Muitos de seus expoentes mostraram-se deslumbrados com as mordomias,

benesses e oportunidades de ascensão social oferecidas pela nova situação.”

O editorial conclui:

“Galgado ao comando do país, o partido enredou-se na trama do fisiologismo e

da corrupção. Suas virtudes transmutaram-se em vícios. O despreparo, a ambição e o

oportunismo derrotaram a esperança.”

O escândalo do mensalão leva Lula a convocar duas reuniões. Quer debater

saídas para a crise. O segundo encontro, domingo à noite, termina com a decisão de se

descartar a saída do ministro José Dirceu (PT-SP) do governo. Seria “passar recibo” do

envolvimento dele nas irregularidades denunciadas por Roberto Jefferson (PTB-RJ). O

próprio Dirceu responde com um “de jeito nenhum, isso é uma loucura”, quando

perguntado sobre o seu afastamento. O PT divulga nota. Afirma que vai processar o

presidente do PTB. Ameaça. Quer que Jefferson “responda perante a lei por suas falsas

acusações e pelos seus irresponsáveis atos”.

31 – 13/6/2005 O presidente do PL, deputado Valdemar Costa Neto (SP), vai à

forra. Depois de acusado por Roberto Jefferson (PTB-RJ) de envolvimento no

escândalo do mensalão, trata de disparar contra o oponente. Para Valdemar, Jefferson

quer “tomar dinheiro” de alguém. Diz duvidar da doação de R$ 4 milhões do PT ao

PTB, em 2004. Motivo: o PTB está “cheio de cargos no governo”, e “ajudando um

monte de empresários”. Palavras de Valdemar:

– Como é que vai dar dinheiro em campanha para um cara que tem milhares de

cargos? Há diversos empresários que atuam nessas empresas que podem fazer doações

para o partido. Qual é a justificativa para dar um mundo de cargos e, depois, dar

dinheiro para eleição? Isso não bate.

O ataque contra Jefferson:

– Como não bate ele reclamar do mensalão. Um camarada que extorque

empresas abrirá mão de mesada? Vai querer em dobro. Vai dizer: “Tô bravo porque tem

mesada?” Ele falava aquilo para conseguir mais cargo. Foi com essa história de

mensalão para conseguir mais espaço.

Para Valdemar, não tem lógica uma estratégia para fornecer mesadas a dezenas

de deputados:

– Quem vai administrar um negócio desse? Você tem um problema em casa,

com a mulher, um assessor... O pessoal deda.

A deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO) confirma ter recebido oferta em

dinheiro para mudar de partido e fazer parte da base aliada do governo. Recusa-se,

porém, a dar detalhes do episódio:

– A verdade me obriga a dizer que sim, eu fui convidada a mudar de partido.

Agora, a responsabilidade me obriga a parar por aqui. Porque não posso provar. Vai ser

a palavra de uma pessoa contra a palavra da pessoa que me fez o convite.

O ministro José Dirceu (PT-SP) faz saber, por meio da assessoria, que “minha

relação com o presidente é excelente”. E manda o recado:

– Não faço nada que não seja de comum acordo e determinado por ele.

Na declaração, todo o veneno e a ameaça implícita. Dirceu seria capaz de vir a

público contar a verdade?

O diretor de Administração e Finanças da Embratur, Emerson Palmieri, pede

exoneração do cargo. Ele foi citado por Roberto Jefferson como tesoureiro informal do

PTB. Teria a função de receber e distribuir pagamentos do PT dentro do PTB.

Maurício Marinho admitiu ao Ministério Público Federal que recebeu mais de

300 fornecedores e prestadores de serviços, interessados em assinar contratos com os

Correios. A notícia ganha destaque nos jornais. O funcionário confessou que o genro de

Jefferson, Marcus Vinícius Vasconcelos Ferreira, intermediou o acesso de empresários

aos Correios. Trecho do depoimento:

“Marcus Vinícius foi muitas vezes na ECT. Marcus Vinícius pedia ao depoente

que atendesse determinados fornecedores, entre os quais César de tal (fornecedor de

copiadoras) e Cristiano Brandão ou outra pessoa (área de tecnologia). Que não consegue

se recordar de outras pessoas, mas pode informar que Marcus Vinícius o apresentou a

outros fornecedores mais de duas vezes.”

Denúncia contra os ministros José Dirceu (PT-SP) e Ciro Gomes (PSB-CE). Diz

respeito ao projeto para a transposição de águas do rio São Francisco. Declarações do

deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), reproduzidas no site do Jornal do Brasil, dão

conta de que Roberto Jefferson (PTB-RJ) teria exibido uma fita para a bancada do

partido, com a comprovação da maracutaia.

Jefferson teria ido ao gabinete de Ciro com os deputados Luiz Antônio Fleury

Filho (PTB-SP), José Múcio (PTB-PE) e o senador Fernando Bezerra (PTB-RN).

Queria assuntar sobre a contratação de uma empresa de consultoria, dentro do projeto

de transposição. Ciro teria informado que o problema já tinha sido resolvido, com outras

duas empreiteiras. O acordo firmado envolveria Dirceu. Ciro, porém, teria sinalizado

com outros negócios, em novas licitações, num futuro próximo.

Acusação contra a Petrobrás. A estatal teria favorecido Prefeituras do PT e de

partidos da base aliada, na Bahia. O motivo, patrocínios para festas de São João. Apesar

de o PFL administrar 150 cidades baianas, recebeu recursos para festas em apenas dois

municípios. Já o PT, que controla 18 Prefeituras da Bahia, recebeu patrocínios em oito

cidades. O coordenador de comunicação da Petrobrás, Rosemberg Pinto, responsável

pelo programa, é filiado ao PT. Outros dez municípios agraciados são administrados por

PP, PL, PMDB e PC do B, todos partidos com representantes na base aliada do governo

Lula. Pinto não informou quanto a Petrobrás desembolsou com os patrocínios.

32 – 14/6/2005 O Brasil pára a fim de ver e ouvir o depoimento do deputado

Roberto Jefferson (PTB-RJ) ao Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. A sessão

dura quase sete horas, entre a fase de depoimento e os debates. Provoca um terremoto

político. Repleto de acusações, declarações contundentes e ironias, o depoimento de

Jefferson reafirma denúncias feitas à Folha de S.Paulo. E vai além: a confissão e o

testemunho do deputado comprometem, e muito, o governo Lula. Sobre o mensalão:

– Desde agosto de 2003 é voz corrente em cada canto desta Casa, em cada fundo

de plenário, em cada gabinete, em cada banheiro, que o ‘seu’ Delúbio, com

conhecimento do ‘seu’ José Genoino, sim, tendo como pombo-correio o ‘seu’ Marcos

Valério, um carequinha, que é publicitário lá em Minas, repassa dinheiro a partidos que

compõem a base de sustentação do governo no negócio chamado mensalão.

Jefferson refere-se ao tesoureiro do PT, Delúbio Soares:

– Atendi na minha casa, no princípio de 2004, janeiro, fevereiro... O Delúbio foi

simpático. Fumou um charuto. Simples, um homem simples, mas cumprindo uma

missão. Cheio de melindres e de tato para falar comigo. Com aquele jeitão dele de

goiano do interior, disse que gostaria de ajudar a desencravar uma unha que pudesse

haver, foi a expressão que ele usou, e que faria alguns repasses para o PTB.

– Com o Zé Dirceu eu falei sobre esse assunto uma meia dúzia de vezes. Não é,

Zé Dirceu? Não é? Ao Genoino, o presidente do partido, falei uma meia dúzia de vezes.

– Disse isso ao ministro Palocci. Ele nega. Mas, Palocci, com todo o respeito,

disse isso a vossa excelência, olhando dentro dos seus olhos.

Agora, Jefferson mira deputados envolvidos com corrupção:

– Será que eu estou falando em um convento de virgens? Será que só eu ouvi

falar em mensalão? Eu apenas destampei a panela, deputado.

– Tem muita gente do PP que está acima disso, tem muita gente do PL que está

acima disso. Mas deputado Valdemar Costa Neto, deputado José Janene, Pedro Corrêa,

Sandro Mabel, Bispo Rodrigues, Pedro Henry. Me perdoem, de coração, não posso ser

cúmplice de vocês.

Para Valdemar Costa Neto (PL-SP), que o acusa de mentiroso:

– Eu afirmo que o senhor recebe repasses.

Dirigindo-se a Valdemar, que é o presidente nacional do PL:

– Diga os nomes dos seus que recebem o mensalão. Vossa excelência recebe e

reparte.

Jefferson aponta que o dinheiro, “no início, era para transferência de partido.

Depois foi para votação”. E mais:

– Um dia, pedi a um companheiro: (...) Avisa ao Pedro Henry que, se ele tomar

os dois deputados do PTB que está tentando com aquela mala de dinheiro, vou para a

tribuna e conto a história do mensalão. Aí, refluiu, mas o mensalão não parou.

Sobre a saída do deputado Luiz Piauhylino (PDT-PE) do PTB:

– O motivo não é nobre, não é justo, foi por dinheiro.

– Provas não tenho, mas tenho provação. Provação vivi, porque além de eles

receberem a mesada, ainda ficavam tentando os nossos deputados: “Vem para cá, seu

otário. Olha, está na mala. Vocês não tem. Aqui tem”.

Jefferson dá novos detalhes do acordo PT/PTB:

– Em maio do ano passado, conversamos eu, o tesoureiro do meu partido,

Emerson Palmieri, o doutor Delúbio, o presidente José Genoino e o Marcelo Sereno. Lá

no prédio da Varig, onde fui várias vezes, e os senhores podem buscar informação na

portaria, porque lá a gente tem que se identificar. Pedi ao presidente do PT, ex-deputado

Genoino, um apoio para a campanha do meu partido. “Sem problema. Você me dá um

planejamento de custo das campanhas do PTB”. Fizemos. Voltamos. Nos reunimos de

novo com os três e eles aprovaram R$ 20 milhões para o financiamento das campanhas

do PTB em todo o Brasil.

– Eles cumpriram a primeira parte do acordo, em princípios de julho, com R$ 4

milhões. O dinheiro foi levado para o partido (...) pelo senhor Marcos Valério. Foi

quando estive com ele pela primeira vez. É carequinha, falante e fala em dinheiro como

se fosse assim uma coisa que caísse do céu. Primeiro foram R$ 2,2 milhões. Em duas

malas enormes, notas de R$ 50 e R$ 100, etiquetadas por Banco Rural e Banco do

Brasil. E três dias depois, (...) ele volta com R$ 1,8 milhão. Notas de R$ 50 e R$ 100,

Banco Rural e Banco do Brasil e a promessa de outras quatro parcelas iguais. Perguntei

ao Genoino: “Como é que a gente vai fazer para justificar esse dinheiro?” Ele falou:

“No final a gente faz a entrada, via partido, e a saída, conta-contribuição”. Perfeito. Mas

até hoje essas notas não chegaram. Isso gerou uma crise brutal no meu partido...

– Voltei ao Zé Dirceu, uma, duas, dez vezes, e disse: “Zé, está esgarçando, estou

perdendo autoridade”. Ele falou: “Roberto, a Polícia Federal é meio tucana. Meteu em

cana 62 doleiros, agora, na véspera da eleição. A turma que ajuda não está podendo

internar dinheiro no Brasil”.

Jefferson usa o depoimento para mandar recado a José Dirceu:

– Eu percebi que o governo quis botar um cadáver podre, que atinge o senhor

Delúbio Soares, que atinge o senhor Silvio Pereira, que atinge o senhor Zé Dirceu...

Estão dizendo que eu sou réu... Zé Dirceu, se você não sair daí rápido, você vai fazer

réu um homem inocente, o presidente Lula. Rápido, saia daí rápido, Zé, para você não

fazer mal a um homem bom, correto e de quem tenho orgulho de ter apertado a mão.

A origem do dinheiro da corrupção:

– Tem de perguntar isso ao Genoino e ao Delúbio, mas pelo que ouvi da

conversa do Marcos Valério, quando ele foi levar os recursos ao PTB na eleição, ele faz

via agência de publicidade, na relação de contratos que tem com algumas empresas do

governo.

Sobre o financiamento de campanhas eleitorais, feito com dinheiro de empresas:

– Nenhum partido aqui recebe ajuda na eleição que não seja assim. Nenhum.

Tenho a coragem de dizer de público aqui. Não aluguei meu partido, não fiz dele um

exército de mercenário, nem transformei os meus colegas de bancada em homens de

aluguel. Aqui todos sabem de onde vem, só que nós temos a hipocrisia de não confessar

ao Brasil. Estou assumindo isso aqui e faço como pessoa física, faço como Roberto

Jefferson. O dinheiro vem dos empresários que, na maioria das vezes, mantêm relação

com as empresas públicas. É assim e sempre foi.

Jefferson toca no problema dos Correios, na acusação de que participou de

esquema de corrupção:

– Não consegui compreender ainda por que o zeloso Ministério Público, a zelosa

Polícia Federal, a zelosa Corregedoria da União não investigaram a diretoria de

informática... E 60% do depoimento do senhor Maurício Marinho apontam lá para a

diretoria do ‘seu’ Silvinho Pereira, secretário-geral do PT.

– Não entendi por que não pesquisaram a Novadata ainda. Não sei por que

correm atrás de um óbolo de R$ 3 mil, quando os contratos que desfalcam os Correios

são de bilhões. Não compreendi ainda como é que o cioso Ministério Público, a ciosa

Polícia Federal e a ciosa Corregedoria da República ainda não investigaram o correio

aéreo noturno, do ‘seu’ Silvinho Pereira, onde as contas de superfaturamento nos

primeiros anos da atual gestão chegam a superfaturamento de 300%.

– A Skymaster? Eu nunca tinha ouvido falar. Sei agora, porque gente boa dos

Correios está começando a me dar essas informações. E a Novadata? Naquela época

não sabia nada, mas gente boa dos Correios começa a me dar agora essas informações.

Assim como gente boa começa a me dar informações, deputado Valdemar Costa Neto,

das licitações da Valec, do ex-deputado Juquinha, do PL. Como gente boa começa a me

dar o que está acontecendo no Dnit, lá do PL. Coisas que, se Deus quiser, a CPI vai

conhecer.

Ex-tesoureiro nacional e atual secretário-geral do PP, Benedito Domingos afirma

aos jornais Correio Braziliense e O Estado de S. Paulo que tomou conhecimento de um

esquema de pagamento de mensalões a parlamentares do PP. A distribuição de dinheiro

era feita no apartamento do deputado José Janene (PP-PR), localizado em edifício da

Asa Sul, em Brasília.

– Você sabe que as pessoas tinham, mas não sabia de onde vinha.

Domingos conversa com o repórter Expedito Filho, de O Estado de S. Paulo. Diz

que o mensalão era conhecido como “apoio financeiro”, e entendido como uma espécie

de caixa 2:

– O zunzunzum era muito forte. Um grupo sempre freqüentou a casa do Janene.

Sempre houve uma grande movimentação. A casa do Janene era chamada de pensão.

A revista Isto É Dinheiro publica duas entrevistas com Fernanda Karina Ramos

Somaggio, uma ex-secretária do empresário Marcos Valério, o dono das agências de

publicidade DNA Propaganda e SMPG Comunicação. Ela acusa Valério de

envolvimento com o esquema de compra de deputados.

Fernanda Karina relata os encontros freqüentes de Valério com dirigentes do PT.

Cita Delúbio Soares, Silvio Pereira, e reuniões em hotéis de São Paulo e Brasília.

– Em que hotéis?

– O Blue Trees, em Brasília, o L’Hotel, em São Paulo, o Sofitel, também em São

Paulo.

A secretária testemunhou saídas de dinheiro:

– Com certeza. O Marcos Valério ficava o tempo todo com o Delúbio Soares.

Era o Marcos quem pegava o negócio e levava de um lugar para o outro.

– Onde o dinheiro era retirado?

– Era sempre no Banco Rural. E era coisa grande. Algumas vezes pouco, R$ 50

mil, R$ 30 mil. Às vezes muito, mas muito mais.

Para ela, Delúbio era o mais próximo de Valério no esquema:

– Depois, o Delúbio abriu as portas e aí tinha o José Dirceu, o Silvio Pereira.

– Como era o contato com o ministro José Dirceu?

– Havia ligações. A gente ligava e pedia para a menina do Delúbio colocar ele

em contato com o Marcos Valério.

– Então o Valério tinha uma comunicação direta com o Dirceu?

– Sim.

– A senhora relata também que o irmão do ex-ministro Anderson Adauto teria

recebido dinheiro da agência. Isso aconteceu no Ministério?

– Não. O irmão dele foi lá na agência, pegou uma mala de dinheiro e foi embora.

A ex-secretária conta que Valério mantinha contato com dois deputados do PT

de São Paulo, José Mentor e João Paulo Cunha. Valério pagou passagens aéreas para

Silvana Jupiassu, secretária de Cunha. A filha de Silvana também ganhou bilhetes

aéreos.

– Isso porque ela facilitava o contato com o João Paulo.

Em outra parte da entrevista, Fernanda Karina envolve outra funcionária de

Valério nos saques de dinheiro:

– Eram pedidos freqüentes. Era tudo feito pela Simone Vasconcellos. Era ela

quem ia de vez em quando para Brasília pagar.

Fernanda Karina fala das atividades de Valério:

– Ele faz intermediação de negócios. Por exemplo: a SMPB tem a conta do

Banco do Brasil na parte de esportes através da Multi Action, uma das empresas do

grupo. E é tudo negociata. Eu sei que eles passam dinheiro para o pessoal do governo.

– Como isso é feito?

– O Marcos Valério manda e tem um pessoal do departamento financeiro que faz

isso.

– E como a senhora tinha conhecimento?

– Ele era meu chefe. Eu estava sempre com ele. Todo mundo sabe que tem

mutreta no fato de a empresa ter um bom dinheiro no Banco do Brasil.

– Haveria pagamento de propinas a gente do governo?

– Eu já vi sair muito dinheiro de lá.

– Em que situações?

– Vi sair R$ 100 mil em dinheiro para o irmão do Anderson Adauto, no fim de

2003, quando ele era ministro dos Transportes.

– E para o pessoal do Banco do Brasil?

– O Marcos Valério dá muitas festas para eles, muitos paparicos, muitos mimos.

– Ele oferece viagens de jatinho para eles?

– Não, o Marcos usa o jato do Banco Rural, eventualmente. O Delúbio Soares

também anda no jato do Banco Rural.

Em outro trecho, o repórter de Isto É Dinheiro, Leonardo Attuch, indaga se

Valério faz pagamentos para obter em troca contas publicitárias do governo. Diz

Fernanda Karina:

– Com certeza. Quando você entra numa concorrência, a gente já sabe quem vai

ganhar e quem não vai. Eles fazem a licitação pública, mas é um jogo de cartas

marcadas. Tem quem vai pegar a melhor parte da conta, a pior parte da conta.

– A senhora viu?

– Olha, para o Banco do Brasil, o Marcos dava festas. Festas para a alta cúpula e

para a área de marketing.

A revista pergunta como os pagamentos eram feitos:

– Tinha duas pessoas da área financeira, a Simone Vasconcellos, e uma

assistente, a Geysa, que cuidavam de tudo.

– A senhora tem noção de quanto?

– Já vi o boy sair com motorista para tirar R$ 1 milhão do Banco Rural. Era para

depois dividir o dinheiro, entendeu?

A Folha de S.Paulo divulga o relatório “Agências & Anunciantes”, do jornal

Meio & Mensagem. Traz informações sobre o faturamento da agência DNA

Propaganda, de Marcos Valério. É o que mais cresceu em 2004, com um aumento de

203%. Dos R$ 23,2 milhões de faturamento registrados em 2003, o valor subiu para R$

70,5 milhões. A agência atende as contas do Banco do Brasil, Eletronorte e Ministério

do Trabalho. Um outro dado: a DNA recebeu multa de R$ 9 milhões em sete processos

na área tributária e dois na previdenciária, por não pagamento de impostos.

Já a SMPB, a outra agência de Valério, cuida da conta dos Correios. Teve

faturamento de R$ 39,9 milhões em 2004, sendo R$ 29,6 milhões apenas com os

Correios. Além de atender o Banco Rural, a SMPB foi contratada pelo Ministério dos

Esportes e pela Câmara dos Deputados, na gestão de João Paulo Cunha (PT-SP).

Parlamentares de cinco partidos entregam ao presidente do Senado, Renan

Calheiros (PMDB-AL), pedido para a criação da CPI do Mensalão. O requerimento tem

assinaturas de 255 deputados e 41 senadores.

O chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho, admite em

depoimento a promotores criminais que entregou ao prefeito de Santo André, Celso

Daniel (PT), no ano 2000, um dossiê de 80 páginas, com denúncias de fraude em

licitações naquela cidade da Grande São Paulo. Relata ter havido uma discussão, poucos

dias antes do assassinato de Daniel, entre o então prefeito e o seu secretário de Serviços

Municipais, o vereador Klinger Luiz de Oliveira (PT). Klinger vem sendo investigado

por envolvimento no suposto esquema de corrupção montado em Santo André.

O irmão do prefeito morto, João Francisco Daniel, declarou ao Ministério

Público que o dinheiro da propina entregue por fornecedores da Prefeitura tinha como

destino as campanhas eleitorais do PT. Segundo o depoimento dele, Carvalho teria

confessado que transportou R$ 1,2 milhão, de uma só vez, para o então presidente do

PT, o deputado José Dirceu (SP).

33 – 15/6/2005 O governo conquista o comando da CPI dos Correios. Nomeia

dois aliados para os cargos principais da comissão: o presidente será o senador Delcídio

Amaral (PT-MS), e o relator o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). Serraglio tem

ligações com José Dirceu. Apoiou a candidatura do filho do ministro, José Carlos

Becker (PT), à Prefeitura da cidade paranaense de Cruzeiro d’Oeste.

A escolha dos nomes ignora a tradição de conceder um posto-chave à maior

bancada do Senado, no caso o bloco PSDB/PFL. O terceiro cargo mais importante, o de

vice-presidente, também vai para as mãos de um governista, o senador Maguito Vilela

(PMDB-GO). Delcídio e Serraglio acenam com investigações restritas aos Correios,

deixando de fora denúncias acerca do mensalão.

Os jornais destacam que durante os trabalhos da CPI do Banestado, o relator e

deputado José Mentor (PT-SP) apresentou sete requerimentos relacionados ao Banco

Rural, determinou a quebra de sigilo bancário da instituição, solicitou cópia de inquérito

policial sobre investigações de empresas do banco no exterior, ouviu diretores e

convocou a presidente da instituição para depor. No final do processo, não concluiu

nenhuma investigação relativa ao Rural.

Outra notícia: o Banco Rural foi condenado a pagar multa de US$ 5,9 milhões

por ilegalidades cometidas no mercado de câmbio, na década de 80. O Rural teria

permitido remessas de dinheiro ao exterior, com a falsificação dos nomes dos

verdadeiros remetentes.

34 – 16/6/2005 Demite-se do cargo o ministro da Casa Civil, José Dirceu (PTSP).

Considerado a face do PT no governo, chegou a ser o mais poderoso ministro de

Lula. Perdeu força em fevereiro de 2004, em conseqüência do escândalo Waldomiro

Diniz. Com as denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), fica sem condições

de permanecer no governo. Sai contrariado. Volta à Câmara para exercer mandato de

deputado federal por São Paulo.

O senador Jefferson Péres (PDT-AM), um dos mais respeitáveis parlamentares

do Congresso Nacional, defende uma investigação para apurar se Lula sabia do

mensalão. Quer saber se o presidente agiu para investigar o esquema e punir eventuais

responsáveis. Péres está convicto: Lula “foi conivente, prevaricou, com certeza”:

– Não acho que o presidente Lula seja capaz de um ato desonesto, no sentido de

enriquecer ilicitamente. Agora, que ele sabia, com certeza sabia.

Para o senador, “ninguém, só quem acredita em Papai Noel, pode imaginar que

José Dirceu com o senhor Delúbio, amigos, companheiros de partido, que há muitos

anos acompanham o presidente da República, tenham feito tudo isso com o seu

desconhecimento. E ficou comprovado, ou há fortes indícios de que ele sabia”.

Péres admite que um eventual processo de impeachment “pode levar o país a

uma instabilidade muito grande”. Entende, contudo, que a situação justifica uma

investigação sobre o presidente:

– Se ficar evidenciado que o presidente realmente sabia e não tomou

providências, não podemos, em nome da estabilidade, fingir que não sabemos e ficar de

braços cruzados, senão nós é que estaremos prevaricando também.

Do senador: responsabilizar alguém por corrupção não exige farta documentação

para servir de prova:

– Provas são provas. Há provas documentais, técnicas, periciais e testemunhais.

Se a testemunha for idônea, se o seu depoimento for convincente, a testemunha vale

também, é uma prova.

O repórter Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo, entrevista o ex-assessor

parlamentar, ex-coordenador de campanha e sobrinho do deputado José Janene (PPPR),

Aristides Barion Júnior. Ele ataca o tio. Diz não se surpreender com denúncias que

envolvem Janene, o líder do PP na Câmara dos Deputados, como um operador do

esquema do mensalão:

– Surpreso, eu? Claro que não. O Zé é terrível, você não conhece ele. Quando o

Zé vê que o cara é menor, ele esmaga. Se vê que não pode com o cara, tenta fazer um

acordo. O Zé é o número um do mensalão, não tenho dúvida.

Aristides conta que Janene lhe deve US$ 1 milhão, dinheiro que foi emprestado

para a campanha eleitoral de 1994. Afirma que o tio ficou rico depois de entrar para a

política:

– O Zé mora em um apartamento que vale mais de R$ 1 milhão, tem fazenda,

carros importados, tem avião, tem dois apartamentos na praia, mas é tudo em nome de

terceiros.

Há cinco anos o Ministério Público pede à Câmara dos Deputados uma

investigação contra Janene. Ele é réu em sete ações civis na Justiça do Paraná. Tem

acusação por suposto ato de improbidade administrativa, desvio de verbas públicas na

Prefeitura de Londrina (PR) e enriquecimento ilícito.

O sobrinho conta como Janene age nas campanhas eleitorais:

– Aí você tira suas conclusões. As campanhas são ostensivas, ele gasta uma

fortuna. Na última eleição, não tinha uma esquina em Londrina que não tinha duas ou

três pessoas dele com bandeiras. É muito dinheiro. Ele trabalha em cidadezinha

pequena. Vai lá, acerta com o prefeito e com os vereadores, 60, 80 cidades pequenas. Aí

faz votos, manda bala sem dó nem piedade.

Cerco ao ministro Luiz Gushiken. Ele comanda a Secom, Secretaria de

Comunicação da presidência da República, e é um dos auxiliares mais próximos de

Lula. A Folha de S.Paulo publica que a mulher de Marco Antônio da Silva, diretor de

eventos da Secom, trabalha para a empresa Multi Action, ligada a Marcos Valério.

A publicitária Telma dos Reis Menezes Silva ocupa o posto estratégico de

representante da Multi Action, uma realizadora de eventos. Telma mantém contatos

com órgãos públicos em nome da empresa de Valério. O detalhe: cabe à Secom opinar e

determinar o conteúdo de editais de licitação que definem contratações na área de

comunicação do governo federal. É a Secom de Gushiken que controla a publicidade e

os patrocínios oficiais do governo Lula.

Marco Antônio da Silva nega qualquer irregularidade. Afirma que não tem

envolvimento com o trabalho da mulher. A Folha pergunta-lhe para quem Telma

trabalha. O marido:

– Não sei. Deve trabalhar para vários eventos.

– Sua mulher nunca lhe disse para quem trabalha?

– Eu evito. Minha mulher não é política, não é militante, não é filiada.

– Como ela conheceu Marcos Valério?

– Não sei.

– O ministro sabe dessa situação?

– Acho que não. É uma questão de foro pessoal. Eu relativizei de forma

primária, por ela já ser do mercado. Ela é uma pessoa ingênua em relação a essas coisas.

Problemas políticos daqui eu não comento em casa.

35 – 17/6/2005 A imprensa noticia que dois diretores indicados pelo PT e

afastados como os demais da cúpula dos Correios, em razão das irregularidades

ocorridas na estatal, já estão novamente nomeados nos Correios, uma semana depois de

terem sido oficialmente desligados da estatal. Eduardo Medeiros de Morais, afastado da

diretoria de tecnologia, e Maurício Coelho Madureira, afastado da diretoria de

operações, são agora os novos consultores dos Correios. Os salários: R$ 10.000,00 cada

um, para trabalhar diretamente no gabinete da presidência da estatal. Depois da notícia,

as nomeações são canceladas.

O Campo Majoritário, o maior grupo interno do PT, segmento liderado pelo

deputado José Dirceu (PT-SP), decide manter nos quadros do partido o tesoureiro

Delúbio Soares e o secretário-geral, Silvio Pereira. Para Delúbio, houve acusações

falsas. Ele avisa que não deixará o cargo, pois “seria uma confissão de culpa”:

– Agi dentro das regras da política.

Manifestação de Silvio Pereira:

– O que eu fiz foi decisão partidária. Se eu sair, vai ter de sair todo o mundo.

O presidente José Genoino, por sua vez, recusa-se a pôr em discussão o

afastamento dos dois dirigentes. Para ele, as acusações são inconsistentes:

– Não será sequer objeto de avaliação. Será adotado o melhor para o partido.

O deputado Roberto Jefferson (RJ) anuncia que se licencia do cargo de

presidente nacional do PTB. Reportagem da Folha de S.Paulo informa que Jefferson

omitiu das duas últimas declarações de renda, entregues ao TRE (Tribunal Regional

Eleitoral), a propriedade de dois apartamentos em Cabo Frio (RJ), comprados em 1997.

Uma casa em Petrópolis (RJ), adquirida em 1990, tampouco constou das declarações de

Jefferson ao TRE.

O jornal O Estado de S. Paulo traz reportagem denunciando dois altos dirigentes

do PT. Eles teriam tentado comprar, por R$ 4 milhões, o apoio da bancada do PPS na

Câmara Municipal de São Paulo. O objetivo da investida: obter apoio dos dois

vereadores do partido ao governo da então prefeita Marta Suplicy (PT-SP).

A oferta teria sido feita ao presidente do PPS de São Paulo, Carlos Fernandes, e

ao tesoureiro do partido, Ruy Vicentini. Os dois foram chamados a conversar numa

padaria no bairro dos Jardins, em 2004. Os emissários que falaram em nome do PT

seriam o secretário-geral do partido, Silvio Pereira, e o secretário de Projetos Especiais

de Marta Suplicy, Valdemir Garreta.

Em um segundo encontro, realizado em hotel paulistano, Garreta, ao lado de um

assessor de Rui Falcão – o dono do estratégico cargo de secretário de Governo de Marta

Suplicy –, teria reiterado a oferta. O PPS rejeitaria o suborno. De acordo com o

tesoureiro Vicentini, a tentativa de comprar o partido foi registrada em ata. Ele conta

como Garreta fez a abordagem:

– Aí ele disse: “Vamos ser práticos e me entrega um planejamento de

campanha”. Eu disse que não ia entregar. Aí ele disse: “Eu estou autorizado pelo

tesoureiro do partido a chegar até R$ 4 milhões, sendo R$ 2,5 milhões na hora de

firmarmos o compromisso, e o outro R$ 1,5 milhão na campanha”. Eu levantei e disse:

“O partido não está à venda”.

36 – 18/6/2205 A revista Época traz a manchete de capa “Homem da Mala”. A

reportagem, de Diego Escosteguy, traça um perfil de João Cláudio Genu, o chefe de

gabinete do líder do PP na Câmara, deputado José Janene (PR). Genu é apontado como

braço direito de Janene, e “principal executivo na operação do mensalão”. Época:

“O partido de Janene teria um esquema de arrecadação muito semelhante ao do

PTB de Jefferson. Apadrinhados bem posicionados em estatais garantem a arrecadação.

O PP instalou diretores na Petrobrás, em Furnas, no Instituto de Resseguros do Brasil e

na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O dinheiro chega a Brasília

trazido por emissários ou pelo próprio Genu. Depois, é distribuído. Segundo relato de

um parlamentar, vem em envelopes.”

A revista aponta que o PP, após aderir ao governo Lula, engordou a bancada do

partido. Passou de pouco mais de 20 para 56 parlamentares. E informa que os

mensalões, no PP, variavam de deputado para deputado:

“Os valores variam de R$ 5 mil a R$ 30 mil, a depender da importância do

político recompensado. O local de entrega varia. Às vezes é o apartamento do próprio

Janene, apelidado de ‘a pensão’ dentro da bancada do PP. Outras, a própria sala da

liderança. Em alguns casos, a casa que Genu mantém para festas no bairro Park Way,

em Brasília. O chefe de gabinete de Janene é apontado como responsável pela logística

da operação. O mensalão vinha sendo usado para atrair novos deputados e para garantir

que alguns deles seguissem fielmente as orientações do partido.”

Sobre o patrimônio de Genu, cujo salário alcança R$ 5.720,00:

“O assessor é dono de um apartamento de luxo, uma casa no setor de mansões

de Brasília e cinco carros, dois deles importados. Numa avaliação pessimista, nos

últimos cinco anos, amealhou entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões. Metade disso só no

governo atual. Na declaração que entregou ao Imposto de Renda no início do ano,

declarou ter ganho menos de R$ 80 mil em 2004. Pelo recolhimento de CPMF, a

Receita descobriu que passaram por suas contas bancárias R$ 680 mil no mesmo

período.”

A revista Isto É também destaca o deputado José Janene (PP-PR), o chefe de

Genu. O relato dos repórteres Amaury Ribeiro Jr. e Luiz Cláudio Cunha é demolidor:

“Curiosamente, nos dois primeiros anos do governo Lula, que coincidem com a

idéia milagrosa do mensalão denunciado pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson,

Janene desencravou da miséria. Documentos obtidos por Isto É em cartórios, órgãos

oficiais e sindicatos rurais do Paraná mostram que Janene e sua mulher, Stael Fernanda,

viraram proprietários em 2003 e 2004 de uma dezena de fazendas, imóveis e uma frota

de carros importados avaliados em cerca de R$ 7 milhões. O casal amealhou tudo isso

ganhando, junto, R$ 200 mil anuais, média mensal de R$ 16,5 mil – pouco mais que

meio mensalão. Nesta fantástica engenharia financeira não estão incluídas outras jóias

de seu patrimônio: rebanhos de gado e ovinos, safras de soja e a mansão de R$ 2

milhões, ainda em construção, encravada no Royal Golf, um elegante condomínio

fechado na zona mais elegante de Londrina, onde é vizinho, entre outras personalidades

endinheiradas, do locutor global Galvão Bueno.”

As agências de publicidade de Marcos Valério são mais uma vez notícia de

jornal. A Folha de S.Paulo traz reportagem informando que a Polícia Civil de Minas

Gerais investiga a DNA e a SMPB por compra de notas fiscais frias. O inquérito

policial traz 23 notas falsas, mas suspeita-se que o número seja muito maior.

Do repórter Mario Cesar Carvalho: “O uso de notas frias por agências de

publicidade que trabalham para o governo é um método clássico para desviar dinheiro.

Imagine que a agência X contratou 10 figurantes para um comercial. Na nota fiscal, os

10 podem virar 100 e a diferença em dinheiro vai para partidos ou políticos”.

A matéria informa que Valério já foi condenado a dois anos e 11 meses de

reclusão, porque suas agências sonegaram contribuições previdenciárias. Segundo a

sentença, a DNA “deixou de recolher contribuições sociais devidas valendo-se de

expedientes escusos diversos, sobretudo omitindo, de seus registros contábeis, fatos

geradores daqueles tributos”.

O jornal explica: “A agência não lançava na folha os valores pagos a

empregados a título de remuneração e também fazia pagamentos a empregados da

empresa como se fossem trabalhadores autônomos. A escrituração de pagamentos de

salários em ‘contabilidade paralela’ foi comprovada com a apreensão de um documento

que descreve os ‘procedimentos adotados para efetuarmos pagamentos de salários aos

funcionários que recebem seus vencimentos através do caixa (2)’”.

Em reportagem, O Estado de S. Paulo trata da empresa CGI Informática, cujos

contratos com a Petrobrás no Paraná, em 2004, alcançavam R$ 6,6 milhões. A empresa

teria alugado 70 automóveis e entregue os veículos para a campanha eleitoral à

Prefeitura de Curitiba, no mesmo ano de 2004, para uso político da aliança que reunia

PT, PTB, PL e parte do PMDB. Nota fiscal reproduzida no jornal atesta o pagamento de

R$ 8.400,00 para o aluguel dos veículos, somente por um período de dois dias.

A enxurrada de denúncias não pára. A Folha de S.Paulo traz reportagem

centrada no relato do tesoureiro do PT do Maranhão, Luís Henrique Sousa, para 20

pessoas, durante uma reunião partidária na capital São Luís, em janeiro de 2005: a

direção nacional do PT mandara um emissário à cidade portando “uma mala” repleta de

“verdinhas”. O dinheiro serviria para pagar dívidas contraídas durante as eleições de

2004.

As “verdinhas”, no entanto, não seriam dólares, segundo a reportagem, mas

apenas a forma como o tesoureiro se expressou para dizer que o dinheiro fora

encaminhado pelo partido. A mala trazia R$ 327 mil. Segundo o tesoureiro, as despesas

de campanha do PT no Maranhão, no valor de R$ 1,5 milhão, foram autorizadas pelo

presidente do partido, José Genoino, e o tesoureiro Delúbio Soares.

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