Ainda contabilizamos 13 milhões de analfabetos e temos Estados como Paraíba, Piauí e Alagoas que superam os 20% - não listarei os analfabetos funcionais para não perdermos a esperança de futuro
Escreveu o Marquês de Maricá em 1837: “A opinião pública é sujeita à moda e tem ordinariamente a mesma consistência e duração que as modas”. Doutor em Filosofia em Coimbra, o marquês – ou Mariano José da Fonseca – traçou a essência do pensamento que se eterniza em nossas terras. Passados mais de 170 anos, o brasileiro mostra a cada dia ser mestre na arte de dizer muito sobre o que nada se sabe.
Ainda contabilizamos 13 milhões de analfabetos e temos Estados como Paraíba, Piauí e Alagoas que superam os 20% (não listarei os analfabetos funcionais para não perdermos a esperança de futuro). Mas quem se importa? Como disse o doutor honoris causa Lula da Silva: “Escola mesmo é a da vida”. E como há quem acredite nisso, não há restrições: de analfabetos a estudiosos, por aqui todos são especialistas em tudo!
Basta uma vinheta de plantão e pronto: o país para e assiste ao assunto dos próximos dias. Entre um feriado e outro, o povo alimenta-se de escândalos, vive à base de repercussão e protagoniza surtos de (des)conhecimento.
Exemplo claro são os períodos de eleição. No país dos especialistas, esse é o momento do surto de militantes e cidadãos politizados. Amparados pelos sólidos argumentos da propaganda gratuita, eleitores colam adesivos, levantam bandeiras e defendem candidatos como se fossem da família. Enchem as redes sociais de lixo e debatem com um ânimo que deixa qualquer sindicalista com inveja.
Esquecem, porém, que a política não dura 3 meses, mas pelo menos 4 anos. O conhecimento é tamanho que alguns não veem problema em coligações de 16 partidos e ainda discutem ideologia. Mas, terminada a eleição, chega a hora de mostrar sabedoria em novos assuntos!
Na falta de um grande evento, recorre-se aos amparos tradicionais, como futebol, música ruim, fim do mundo ou “a novela que parou o país”. Se a novidade demora a surgir, os clássicos servem de balão de oxigênio para quem se sente sufocado pela falta de algo para cheirar. Em 2013, porém, o povo anda alimentado.
Quem sentia fome de tragédia, lamentavelmente, saciou-se com o ocorrido em Santa Maria. No país dos especialistas, deu-se o surto dos peritos e analistas de segurança. Amparados pelas enriquecedoras entrevistas que tomaram as tardes na TV, o grupo especulou, condenou e levantou alardes como se estivesse na boate.
Após terem sido exploradas e saturadas todas as facetas da tragédia, a moda passou. O assunto agora é a renúncia do papa!
No país dos especialistas, aconteceu um incrível surto de doutores em catolicismo e conhecedores dos bastidores do Vaticano. Amparados pelo “Fulano, que disse para Beltrano, que contou para Ciclano”, os teólogos do faz-de-conta apontam conspirações, intrigas e golpes. E alguns, em jornais e revistas, comentam o pontificado de Ratzinger dando claras demonstrações de que nunca leram seus livros ou suas encíclicas, e que acreditam que seis décadas como intelectual valem menos que um diploma de Jornalismo.
A renúncia de Bento XVI é, sobretudo, um ato de lucidez e humildade. Somente com tais virtudes se é capaz de reconhecer que as forças já faltam e que não se tem mais capacidade para exercer o que lhe foi confiado. A lucidez lhe permitiu analisar a si mesmo. A humildade lhe permitiu conceber-se humano e já frágil diante do que dele se espera.
Então alguns questionam: “Mas logo Ratzinger?”. A simples análise da biografia do pontífice torna tal pergunta vã. A vida dos religiosos (de diversas denominações) é marcada por renúncias. Desde a renúncia à família até os desfrutes de uma vida leve. Em seu caso, Bento renunciou até a defender-se contra os que o atacaram. Sua fala sempre foi “Peço perdão pelos meus defeitos”.
Mas no país dos especialistas, cuspir ideias é mais importante que digeri-las, e as reflexões têm a profundidade de um pires de moda. E, como escreveu o romancista francês Honoré de Balzac, “A moda é um ridículo que não teme objeções”. Pensando bem, no país dos especialistas, ser ridículo sempre esteve na moda.
Gabriel Tebaldi,
Excelente artigo. De fato, abdicar do poder requer muita humildade-qualidade escassa no mundo.
ResponderExcluirExcelente texto. Os doutores formados pelo Google pululam quando surgem temas relevantes nas redes sociais
ResponderExcluirótimo artigo, uma triste realidade das opiniões rasas que pululam nas mídias.
ResponderExcluir