Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) disseram nesta terça-feira que, independentemente da veracidade das novas declarações de Marcos Valério, é preciso considerar a hipótese de proteção do empresário. De acordo com reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, Valério forneceu novas informações sobre o esquema do mensalão em troca de redução da pena na Ação Penal 470, o processo do mensalão, além de proteção à sua vida. Apontado como o operador do esquema, o publicitário foi condenado a mais de 40 anos de prisão.
Para o ministro Gilmar Mendes, não é possível ignorar a situação "delicada" envolvendo a proteção da vida dos personagens envolvidos no fato. Ele também criticou desqualificações prévias das informações do empresário. "De fato, temos nesse processo alguém que fez declarações que foram largamente comprovadas, que foi o Roberto Jefferson, e ninguém ficou perguntando os motivos, se foram nobres ou ignóbeis. Então, a questão é de verificação para um juízo mais seguro", disse ele.
Mendes acredita que, caso verídicas, as revelações de Valério implicando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não devem modificar o julgamento da ação penal, que já está na fase final. Ele pondera, no entanto, que as informações podem influenciar o julgamento de outros processos derivados do mensalão em outras instâncias. "Sabemos que o que está aqui no STF é um percentual muito pouco significativo do que se fez", salientou.
Valério diz que Lula sabia
Segundo o jornal paulista, Valério disse em depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR), em setembro, que o ex-presidente Lula sabia do esquema do mensalão e que se beneficiou dele. Ainda conforme a reportagem, o publicitário disse que Lula autorizou empréstimos dos bancos Rural e BMG para o PT com o objetivo de viabilizar o pagamento de propina a parlamentares da base aliada. Para o ministro Ricardo Lewandowski, revisor do mensalão, o benefício de proteção à testemunha é possível em qualquer etapa do processo. "Isso sempre é possível, depende da polícia e do Ministério Público. A proteção da testemunha quem deve operacionalizar isso é o Poder Executivo, que tem o poder de polícia necessário para isso", afirmou.
Embora também rejeite a possibilidade de alteração no rumo da Ação Penal 470, o ministro Marco Aurélio Mello defendeu a concessão de proteção a Marcos Valério, caso ele realmente tenha solicitado: "A proteção tem que ser dada pelo Estado a qualquer pessoa que se sinta ameaçada". O ministro disse que não conhece o teor do depoimento de Valério, mas que, caso procedente, as afirmações são graves e não podem ser descartadas sem apuração mais aprofundada. "Você não pode ter ideia pré-concebida, nem para excomungar a fala, nem para potencializá-la a ponto de proclamar que é a verdade", afirmou.
Segundo o jornal paulista, Valério teria sido ameaçado de morte pelo atual diretor do Instituto Lula e amigo do ex-presidente Lula, Paulo Okamotto. A reportagem informa que Okamotto queria impedir o publicitário de revelar mais detalhes sobre o esquema do mensalão às autoridades competentes.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson. Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
Fonte: Terra Noticias
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