quinta-feira, 24 de março de 2011

O MUDINHO ARTILHEIRO ( By Marco Sobreira )

Toda cidade tem seus tipos folclóricos, em Atílio Vivácqua não é diferente e um dos mais interessantes é o mudinho. Trabalhador responsável, trabalhava na fábrica de Calçados Itapuã em Cachoeiro de Itapemirim, onde era chefe do setor. Tudo mudava nos finais de semana, tomava umas cachaças e pronto, ficava pegajoso, inconveniente, exigia atenções para si e até meio agressivo. Uma das coisas mais engraçadas era mandar botar músicas e ficava dançando como se estivesse ouvindo, não perdia um jogo de futebol e acabava virando atração tal seu entusiasmo na torcida.


Como médico no interior acaba fazendo de tudo, certa época, lá pelo ano de 1987 se não me falha a memória, eu era Presidente, jogador e técnico do segundão do glorioso Nacional Beira-Rio EC, tínhamos um bom time e sem adversários à altura nas redondezas, chegamos a ser Campeões Sulinos de futebol amador, resolvemos marcar jogos amistosos com times de cidades mais distantes.

Nosso primeiro compromisso seria em Iuna, simpática e progressiva cidade no sudoeste do Espírito Santo, terra de gente brava mas que tinham um bom time chamado Rio Pardo FC. Saímos num domingo pela manhã, dois ônibus lotados de torcedores e entre eles o mudinho, aproveitei para durante o percurso conversar e alertar para que evitassem confusão, como todo mundo sabe, torcida de futebol tem de tudo, inclusive os brigões, nosso amigo era um deles.

Após três horas de viajem, chegamos e de cara tivemos uma surpresa, o estádio ficava no alto de um morro tão a pique que os ônibus não puderam subir, ficaram estacionados na pracinha embaixo, o que já me deixou apreensivo, em caso de confusão estaríamos em maus lençóis.

Sacos de roupas e chuteiras nas costas, mochilas, bandeiras, batuque, lá fomos nós subindo a ladeira , foguetes anunciavam a nossa chegada.

O jogo estava bastante divulgado e a cidade estava animada, nosso time tinha fama e o Rio Pardo não perdia em casa pra ninguém, todos esperavam um grande jogo.

A primeira confusão começou ainda no jogo preliminar e por minha culpa, ao escalar o segundão, fiquei surpreso ao perceber que não tínhamos reservas, vieram somente os onze jogadores e o goleiro reserva, e então cometi o grande erro, o mudinho insistiu em ficar no banco e para não ficar sem ninguém acabei concordando, não tinha mesmo idéia de aproveitá-lo, apesar de que não faria feio, já que gostava de jogar uma pelada e me garantiram que não tinha bebido nada.

Jogo transcorrendo sem problemas, apesar do juiz, que insistia em puxar a sardinha para o time da casa, perdíamos por 2X1, já na metade do segundo tempo quando um dos nossos jogadores torceu o pé num buraco do campo e não tinha condições de continuar. E agora? Olhei para o banco de reservas e lá estava o mudinho se aquecendo, minha única opção, me esforcei para entendesse que queria que ficasse do meio do campo pra frente, sem posição fixa, seria pedir demais e pensando bem perder por 2X1 já estava de bom tamanho.

O mudinho estava realizando o seu grande sonho, entrou acenando para a torcida, feliz da vida, era sua grande chance e por coincidência na primeira bola lançada, partiu para o gol, estava em completo impedimento, o juiz apitava freneticamente , os jogadores pararam e o mudinho nem aí, entrou no gol com bola e tudo e saiu como louco comemorando, gesticulando, literalmente foi para a galera. O juiz esperou pacientemente, anulou o gol, expulsou o mudinho e a confusão estava formada, quis bater em todo mundo e quando fui argumentar com o juiz que não escutou o apito porque era surdo e mudo, também fui expulso. Jogo encerrado, ânimos serenados, nos preparamos para o jogo principal, o pior estava por vir, mas isso é o tema da próxima história.

Até hoje, quando toma umas cachaças o mudinho se revolta com a anulação do único gol , da única partida que disputou em toda sua vida.

2 comentários:

  1. Ri muito imaginando a história.... Hilária!!! A mais engraçada de todas na minha opinião... O mudinho comemorando, correndo pra galera é demais... Pode até ter sido expulso, mas tenho certeza que se realizou e ainda saiu como o "injustiçado".... Tá ficando profissional hem "dotô"!!!!! abraços.

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  2. Em toda cidade tem uns tipos engraçados assim, viva a diversidade!

    Abraços!!

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