Infelizmente, na falta de ética e dignidade política, o melhor e mais inspirador exemplo da semana veio de um cachorro
Qual a semelhança entre uma Rede furada, um delegado de trânsito, dezenas de políticos e uma cadela? A resposta resume-se numa palavra: fidelidade (ou a falta dela).
Quando lançou-se no mar político, a Rede de Marina Silva uniu as mais distintas mentes. Figurando como novidade, logo tornou-se a grande alternativa política. Porém, ao mesmo tempo, serviu de refúgio para as infinitas picuinhas da esquerda.
Os membros que outrora habitaram o PT, um dia fundaram o PSOL. De lá, outra briga gerou o PSTU. Mesmo com objetivos comuns, a esquerda tem o costume de se rachar em micropartidos sem expressão. Assim, os filhos desgarrados da consciência de classe rumaram para a Rede. Em questão de tempo, os eternos conflitos pela “certeza de estar certo” começaram a furar a Rede e deixar passar a possibilidade de oficialização do partido. No fim, a Rede só pescou traíra.
Quase morrendo na praia, Marina provou que até as boas intenções precisam entrar no jogo para sobreviver. Distante de ideologia, a ex-senadora aliou-se a Eduardo Campos, repousando sua intenção de presidir o país. A decisão deixou sem rumo seus seguidores, como Gustavo de Biase, ex-PSOL, militante do Rede, mas que se filiou ao PSB. Por aqui, De Biase já foi o principal opositor justamente do governo PSB de Casagrande. Seu destino leva a especulações no mínimo satíricas, como a possibilidade de sua propaganda dizer: “Eu sou Gustavo De Biase. Vamos conversar?”.
Tal como Marina e marineiros, o delegado Fabiano Contarato tem em mãos a mesma missão: manter-se fiel a si mesmo. O desafio é grande, pois Contarato aliou-se justamente a Magno Malta, o moço das camisas pretas com frases de efeito.
Como delegado de Trânsito, Contarato sempre fez uso de seu discurso justiceiro, fazendo valer a lei e lançando fortes críticas à política nacional, condenando quem fazia uso do poder para promoção pessoal. Por ironia do destino, Malta é conhecido por sua grife sensacionalista que lhe serve de trampolim político.
O senador já desfilou com os looks de “Todos contra a Pedofilia”, “Maconha Não”, “O Petróleo é Nosso” e “Redução da Maioridade Penal Já”. Alguém ainda tem dúvidas que sua próxima campanha será sobre a violência no trânsito?
O delegado ainda terá como colega Edson Ribeiro, o “cheirador de Bíblia” e ex-candidato a Prefeitura de Vitória. Caberá a Contarato provar que é o nome que o Senado necessita. De todo modo, seu primeiro ato configurou uma infração digna de ser enquadrada no Código de Trânsito.
Os últimos dias também foram de reajustes nas ideologias inexistentes e de novos pactos obscuros pelo poder. De olho em 2014, mais de 50 deputados federais já trocaram de partido, enchendo as novas legendas, como o PROS e o Solidariedade (SDD).
Junto da infidelidade partidária há, ainda, a medíocre estratégia de atrair votos com celebridades. Em 2014, o PSDB lançará o ex-jogador Giba como deputado, enquanto o PSB aposta no astronauta Marcos Pontes. Já o PSC deposita fichas no cirurgião plástico Dr. Rey, e o PTB pretende puxar votos com o pagodeiro Belo. Todos grandes conhecedores da política.
Enquanto a fidelidade pessoal e com o país falta na política, uma cadela tornou-se o melhor exemplo da semana. Ao ver seu parceiro morador de rua ser preso por furtar um carrinho de mão, a vira-lata Neném seguiu a viatura policial e passou dois dias de prontidão na delegacia.
Sua fidelidade rendeu-lhe um acidente em plena Avenida Vitória e um fêmur quebrado. Mesmo assim, ao reencontrar seu dono, ela esqueceu a lesão e se jogou em seus braços. Se dependesse apenas dela, continuaria vivendo na rua, ao lado de quem se tornou seu parceiro, mesmo sem condições adequadas.
Na história de Neném não há oportunismo, decepções ou infidelidade. Não há Rede Furada, decepções prévias nem interesses obscuros. Por isso a vira-lata percorreu o país nos noticiários.
Hoje, embora triste, é necessário destacar que, infelizmente, na falta de ética e dignidade política, o melhor e mais inspirador exemplo da semana veio de um cachorro.
Gabriel Tebaldi, 20 anos, é estudante de História da Ufes
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