sábado, 23 de outubro de 2010

A DESCOBERTA DO BRASIL.

A Gazeta


José Carlos Corrêa

Quando o Plano Real foi anunciado pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique, poucos acreditavam que ele fosse, de fato, capaz de acabar com a inflação. O Brasil já havia passado pelo Cruzado, Bresser, Verão e Collor, e o Plano Real parecia que seria mais um entre tantos outros planos econômicos. E mais: enquanto os outros planos continham medidas duras como o congelamento de preços e salários, e até o confisco na poupança e contas correntes, o Plano Real parecia menos ousado ao propor tão somente um período de transição com a URV, a Unidade Real de Valor, e a sua posterior transformação em uma nova moeda, o Real.

Só passei a acreditar de fato que o Plano Real iria dar certo quando me dei conta que a caixinha de leite, que em 30 de junho de 1994 custava CR$ 2.750,00, o que equivalia, naquela data, a 1 URV, continuou custando 1 URV, ou seja, R$ 1,00 durante as semanas seguintes para - que espanto! -, passar alguns dias depois a R$ 0,98 e, em seguida, a R$ 0,96. Para quem, como eu, tinha convivido com mais de vinte anos de inflação descontrolada, era difícil acreditar que as maquininhas de remarcação de preços, tão presentes nos supermercados, iriam ser aposentadas.

Na época, a inflação era o maior problema do país. Quando atingiu 64% ao ano, chegou a ser relacionada como uma das causas do Movimento Militar de 1964. Vinte e dois anos depois, 363% ao ano, já estava fora do controle, daí a tentativa de estancá-la com o Plano Cruzado. Quando do Plano Collor, já estava em 81% ao mês. O Plano Real foi adotado diante de uma inflação de 47% ao mês e quando se vê que desde então temos tido taxas anuais de um dígito, é possível perceber porque ele é considerado a maior conquista da sociedade brasileira na história recente do país.

Seis anos depois do Plano Real, em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal, proposta pelo Governo Fernando Henrique, colocou um freio nos gastos públicos abusivos ao condicionar as despesas à capacidade de arrecadação dos estados e municípios. Para acabar com a prática de um governante deixar contas para serem pagas pelo seu sucessor, a lei estipula limites para gastos e endividamento, e obriga a publicação e apresentação de relatórios aos tribunais, sujeitando os responsáveis, em caso de descumprimento, a penas de multa, inelegibilidade e prisão.

A Lei de Responsabilidade Fiscal complementa a obra do Plano Real já que não é possível ter uma inflação controlada sem que o poder público coloque suas despesas na bitola das receitas. O chamado Programa de Ação Imediata, PAI, adotado pelo presidente Itamar e ministro Fernando Henrique já havia, em 1993, reduzido e dado maior eficiência aos gastos da União, recuperado a receita tributária federal, equacionado as dívidas dos estados e municípios com a União e saneado os bancos federais. A Lei de Responsabilidade Fiscal estendeu aos estados e municípios as práticas que a União já havia adotado.

O Plano Real promoveu, em curto prazo, a maior redução da pobreza no Brasil. A população pobre, que representava 35% do total da população brasileira, foi rapidamente reduzida a 28%. A Lei de Responsabilidade Fiscal, por sua vez, fez o que parecia impossível: exigiu que governadores e prefeitos passassem a tratar o dinheiro público com mais respeito. Essas duas medidas formam a base sobre a qual foi construída, a partir de então, uma nova etapa de desenvolvimento na história do país.

É sinal que o Brasil não foi descoberto em 2003 como tentam fazer crer os que, por coincidência ou não, votaram contra o Plano Real e contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.

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