Foto: Arquivo do Governo do ES
Escolhido pelas oligarquias, Aristeu perdeu apoios no fim da gestão
A classe média pede mudanças na política, o povo vai às ruas, organiza protestos nas proximidades do Palácio Anchieta e é reprimido pela polícia. A cena descrita assemelha-se ao que se viu em Vitória na semana que passou, mas foi, também, uma das principais marcas do governo de Aristeu Borges de Aguiar, presidente de Estado (o equivalente a governador) em 1928, ano de lançamento de A GAZETA.
Há 85 anos, o Brasil estava sob o regime da Primeira República. A monarquia havia sido extinta no final do século XIX e, nesse ínterim, os cafeicultores de São Paulo revezavam-se com os pecuaristas de Minas Gerais no comando de um país que ainda engatinhava na industrialização e urbanização das maiores cidades.
Em Vitória só existia uma ponte, e o interior começava a ser povoado – levando para além da Capital forças com capacidade de articulação política.
As famílias Monteiro e Vivácqua, do Sul do Estado, tinham forte influência nos bastidores do poder. Conforme assinala o professor Luiz Cláudio Ribeiro, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), as oligarquias passaram, pouco a pouco, a ser contestadas.
“A instabilidade política marcou esse período anterior a 1930. O acordo entre os cafeicultores paulistas e pecuaristas mineiros começou a se romper, com reflexos aqui no Estado. O interesse econômico não era só agrário, começou a ser também mercantil. A pequena produção de café, sobretudo, se distribuiu para o Norte, no Vale do Rio Doce, e pela região de montanhas, resultando numa redistribuição de poder e influência”, destaca Ribeiro.
Brigas
Foto: Edson Chagas
“Aristeu era considerado um intelectual da época. Mas seu governo passou a ser criticado porque o governador nomeou muitos parentes em cargos importantes” - Estilaque Ferreira dos Santos, historiador
A ida de pequenos agricultores para o interior, na segunda metade da década de 20, fez com que os Monteiro e os Vivácqua perdessem força. Como naquela época a escolha do presidente de Estado passava pelo crivo das grandes oligarquias, Aristeu Borges de Aguiar também começou a receber suas primeiras críticas.
O historiador Estilaque Ferreira dos Santos assinala que o governo de Aguiar se sustentava pelo sucesso de seu antecessor, Florentino Avidos, que teve caráter desenvolvimentista. Entre 1924 e 1928, foi construída a ponte de ferro entre Vitória e Vila Velha e Colatina, na região Noroeste, ganhou seu primeiro eixo viário sobre o Rio Doce.
“A situação era próspera. Aristeu foi escolhido com certo consenso, pois era diretor de escola, advogado, considerado um intelectual da época. Mas seu governo passou a ser criticado porque o governador nomeou muitos parentes em cargos importantes. Os dissidentes, como é natural, ficaram na bronca”, pontua o historiador.
Ribeiro conta que também os apoiadores do presidente de Estado começaram a se dividir. “O grupo de Bernardino Monteiro e de Jerônimo Monteiro sofreu uma cisão. O Brasil passava por um período de contestação popular e ascensão da classe média, que pressionava por maior participação na política. Os militares também entraram nessa briga”.
Registros
Até o ano em que o jornal A GAZETA entrou em circulação, só havia um periódico no Espírito Santo. Era o “Diário da Manhã”, que pertencia à família Monteiro. Como o grupo era ligado ao governo, são poucos os registros políticos da época.
“Não havia, antes de 1928, uma indisposição notória contra o governo de Aguiar. O crescimento da cidade levou ao aparecimento das primeiras críticas e da oposição. O surgimento de um novo jornal, como A GAZETA, foi um indicador de que a oposição estava se organizando”, cita Estilaque.
Naquele biênio que antecedeu a Revolução de 1930, quando o ex-presidente Getúlio Vargas tomou o poder com amplo apoio de setores da sociedade e dos militares – que formaram a Aliança Liberal –, a política capixaba também sofreu um revés e o povo foi às ruas.
O grupo dos Monteiro, que no passado havia chancelado a ida de Aristeu Borges de Aguiar para o Palácio Anchieta, renegou apoio ao presidente de Estado. Nas regiões Norte e Sul, militares organizaram-se e começaram uma caminhada em direção a Vitória, com apoio de populares.
“Foi um momento de efervescência política e negação do centralismo do poder. O governador perdeu apoio político e muitos capixabas aderiram à Aliança Liberal”, ressalta o professor Luiz Cláudio Ribeiro, da Ufes.
Em 19 de novembro de 1929, a capa de A GAZETA trazia um editorial reforçando a posição contrária ao Palácio Anchieta. “Com a Aliança Liberal estão todos os ex-presidentes vivos da República brasileira: Epitácio Pessoa, Arthur Bernardes e Wenceslau Braz. Homens capazes de medir, melhor que qualquer outro, a responsabilidade do momento político que se atravessa”, dizia.
Massacre após comício perto do Palácio
Um dos episódios mais lembrados do governo Aristeu Borges de Aguiar é o do “Massacre do 13 de fevereiro”. Em 1929, cerca de 3 mil pessoas se reuniram em frente ao antigo Colégio do Carmo, na Cidade Alta, em um comício da oposição. O governo decidiu dispersar a população usando a polícia.
“A Aliança Liberal era um movimento político que congregava todos os leques da sociedade: classe média, trabalhadores, comerciantes. Pessoas informadas, que criaram jornais, questionavam o poder e foram para as ruas”, explica o professor da Ufes Luiz Cláudio Ribeiro.
Foto: Eduardo Paes / Arquivo Público
"Massacre do 13 de fevereiro" aconteceu em frente ao antigo Colégio do Carmo
O comício de 13 de fevereiro de 1929 tinha como cabeças os ex-deputados estaduais Fernando Abreu e Geraldo Viana. Naquele momento, a maioria da Assembleia Legislativa se rebelava contra o então presidente de Estado.
“A cavalaria montada da polícia saiu de todos os lados da rua Coronel Monjardim, na Cidade Alta. Foi uma repressão violenta, com muitos feridos e mortos. Naquela madrugada, o jornal A GAZETA foi empastelado (fechado)”, relata o historiador Estilaque dos Santos.
A GAZETA no alvo
O empastelamento foi relembrado em 2008, num volume de 275 páginas comemorativas à oitava década de lançamento de A GAZETA: “O jornal ampliou a sua campanha contra os governos do presidente Washington Luiz e do governador Aristeu Borges. Após a dissolução do comício, o jornal foi empastelado por agentes policiais orientados pelo governador”.
Devido aos estragos causados ao maquinário do jornal, não houve registro do episódio na imprensa capixaba. O “Diário da Manhã”, ligado à situação, não publicou nada sobre o confronto na Cidade Alta.
Um dos poucos registros do massacre está disponível no acervo do carioca “Correio da Manhã”. “É sabido que o número de mortos sobe a cerca de 18, havendo mais de 50 pessoas feridas, a maior parte a pisada de cavalos”, relatava o jornal, hoje disponível na internet.
Às vésperas da Revolução de 30, já com a imagem desgastada, Aristeu Aguiar fugiu para a Europa em um navio que estava atracado no Porto de Vitória. Em seu lugar, foi nomeado o interventor Punaro Bley, que ficou no governo até 1943.
Foto: Arquivo público Estadual
Às vésperas da Revolução de 1930, o então governador Aristeu Borges de Aguiar perdeu apoio das famílias Monteiro e Vivacqua, que tinham influência na política capixaba, e desgastou-se com a opinião pública. Temendo a invasão dos militares a Vitória, ele deixou o Palácio Anchieta e fugiu para a Europa, aproveitando-se de um navio atracado no porto
Fonte: A Gazeta
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