terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O DRAGÃO ESTÁ VOLTANDO.

Ilan Goldfajn - O Estado de S.Paulo


Cidadãos do mundo, preparem seus bolsos. A inflação está voltando. Ela vem a reboque do tsunami de aumentos de preços de commodities globais em economias emergentes já aquecidas. Os antigos remédios para combatê-la - política monetária (juros) e flutuação cambial (deixar apreciar) - estão sob suspeita. Novos remédios experimentais - medidas "macroprudenciais" - estão em uso intenso, sem sabermos ao certo quão eficazes e quais seus efeitos colaterais. O risco de uma parada mais brusca na atividade futura para combater a inflação aumentou.

O fenômeno é global. Os preços das commodities subiram por várias razões. No começo, pelos juros baixos no mundo (EUA, Europa, Ásia) e pela depreciação do dólar, que induziram a compra de ativos "reais". Recentemente, os preços estão subindo pelo crescimento econômico e pelos problemas climáticos globais. Há poucos meses a preocupação era com a volta da recessão nos EUA, chamada de mergulho duplo (double dip). Não só a recessão foi evitada, como o crescimento nos EUA no último trimestre do ano foi muito forte. O mundo parece que estava despreparado para a volta do crescimento simultâneo das economias maduras (EUA, etc.) e das emergentes (que crescem fortemente e demandam mais commodities para a urbanização crescente da sua população).

A inflação, quando é global, costuma ser de ninguém. Não se identificam os responsáveis individuais pelo excesso de demanda global. Cada país percebe a inflação como um choque externo. O viés é deixar o outro combatê-la. No caso da inflação de commodities, esse comportamento é institucionalizado: faz parte das regras dos bancos centrais retirá-lo do índice de inflação e combater a inflação do que sobrou (o núcleo). Como se toda a inflação de commodities fosse temporária, resultante de choques de oferta.

O problema de inflação é mais agudo nas economias emergentes. Enquanto o risco nas economias maduras era de falta de crescimento, as emergentes deram-se ao luxo de sobreaquecer sua economia, estimulando-a para além da resposta à crise de 2008. O sobreaquecimento era incentivado. As economias maduras precisavam de estímulos externos para a sua retomada. Mas agora a retomada é global. As economias emergentes enfrentam choques inflacionários globais em economias já vulneráveis à inflação doméstica (serviços, por exemplo), precisando desaquecer.

O risco atual nas emergentes é a inflação subir em excesso. E para evitar corroer o poder de compra da população as autoridades econômicas precisarão desacelerar suas economias além do previsto. Nesse processo de desaquecimento, podem até errar a mão (desaquecer demais ou de menos). O risco é maior desta vez. Novos instrumentos estão sendo adotados, com resultados menos estudados. São medidas administrativas, como a elevação dos compulsórios, exigências regulatórias que encarecem o crédito e/ou reduzem o prazo do financiamento.

Essas novas medidas são denominadas macroprudenciais porque foram idealizadas para prevenir crises financeiras futuras, como a que culminou com a quebra do Lehman Brothers. Hoje seu uso está se deslocando para políticas anticíclicas, de reação ao sobreaquecimento, não prevenção. Com medidas anticíclicas é difícil estimar precisamente seu efeito sobre a economia, há muita incerteza.

O uso crescente de medidas administrativas (macroprudenciais) ocorre também como consequência da crise financeira e da reação dos EUA. Na saída da crise, com a redução dos juros básicos a zero, restou a política monetária do Federal Reserve (Fed) de estimular a economia via expansão monetária, cujo último objetivo era estimular a economia via redução das taxas de juros mais longas também (a taxa de dez anos caiu para quase 2% no auge do efeito). Com a queda dos juros americanos houve uma força para sair dos ativos americanos em direção a ativos no mundo, o que ajudou a depreciar o dólar e apreciar as moedas nos outros países. As economias emergentes resistiram (e têm resistido) à apreciação cambial via intervenção (compra de reservas, além de outras medidas), numa batalha que foi denominada "guerra cambial".

O problema dessa "guerra cambial" é que ela induz a políticas que podem potencializar o problema da inflação. A manutenção do câmbio num patamar fixo, independente do mérito dessa política por outras razões, impede o câmbio de absorver parte da subida das commodities no mundo via apreciação e permite que a inflação de commodities se transfira integralmente para os preços domésticos. Além disso, como a preocupação é com os fluxos de capital, subidas de juros são evitadas para não atrair mais capital. Portanto, a política monetária fica viesada para adotar mais medidas administrativas e menos subidas de juros.

Mas a adoção de medidas administrativas não é de graça. No passado, essas medidas haviam sido preteridas pelos instrumentos de preço, como a taxa de juros, porque eram menos gerais (afetavam determinados setores) e induziam distorções na economia (geradas pelas tentativas de burlar as políticas).

Interessante, os juros americanos voltaram a subir (juros de dez anos perto de 3,5%) e os motivos iniciais para evitar os instrumentos tradicionais perderam força. Há menos incentivo para a saída de capital dos EUA. Não há razão para os juros não voltarem a ser o instrumento principal das emergentes, como antes. Mas, ao estilo de dom Quixote, a batalha continua. Países como a Turquia chegam ao limite de reduzir juros para combater a inflação, justificando o ato com medidas administrativas compensatórias.

Em suma, as crises têm sempre seus legados. O pêndulo às vezes atinge o outro extremo. Desta vez, temos mais inflação e o uso excessivo de medidas macroprudenciais. Mais adiante, o risco é uma parada mais brusca da atividade do que o planejado nas economias emergentes

Um comentário:

  1. A meu ver, a inflação é resultante da falta de maiores investimentos no setor produtivo, que resultou no fraco desempenho de nossa economia, que, nos ultimos 8 anos, cresceu menos do que nos primeiros anos de implantação do Plano Real.
    Lembro que antes do Real o país viovia sufocado pela hiper inflação e que foi exatamente a partir do Plano Real que a economia se desenvolveu, houve aquecimento da produção industrial, fortalecimento da moeda, elevação de nossas reservas cambiais e estabilidade economica, o que atraiu muitos investimentos externos, propiciando que o Brasil se tornasse competitivo.
    Com isso, o povo passou a ter acesso aos bens de consumo e deixamos de ser pobres coitados perante a comunidade internacional.
    Diga-se de passagem, que o poder de compra elevou a alto estima dos brasileiros e com isso houve de fato um enorme salto de qualidade na vida dos cidadãos brasileiros.
    Tal constatação nos remete ao velho conceito da lei da oferta e da procura e que não é o consumo provocado pelo aumento do poder aquisitivo do trabalhador, o responsavel pela inflação.
    Penso exatamente o contrário dos economistas brasdileiros, pois a meu ver é exatamente a sensação de bem estar de nosso povo, com acesso aos bens de consumo a um custo menor, que aquecerá a economia brasileira, atualmente represada pela prática dos juros elevados e da excessiva carga tributária.
    Precissamos aquecer a produção com a adoção de medidas simples, porém eficazes, como a queda dos juros altos (em vez de aumenta-los) e promover urgentemente a tão propalada reforma tributária.
    Também é preciso medidas eficazes de proteção aos nossos produtos, combatendo a pirataria, principalmente nos setores de calçados, textil, brinquedos e de eletro eletronicos, pois sofremos forte concorrencia dos produtos piratedos oriundos de paises como a China que, além disso, está plantando laranja em todo o seu território, a fim de desbancar o Brasil, da condição de maior produtor mundial de suco de laranja.
    É preciso saber negociar com parceiros potenciais Estados Unidos, Comunidade Européia e Japão, além de potencias emergentes como China,Índia, Coréia do Sul e países Árabes, abrindo novos mercados para nossos produtos, fortalecendo a balança comercial, sem esquecer a necessária interação com nossos vizinhos da América do Sul.
    Não será uma tarefa fácil, vez que a adoção de medidas de combate a inflação e de retomada do crescimento, vai requerer muita seriedade e competencia do atual governo brasileiro que precisa ser mais responsavel do que o governo anterior, que passou 8 anos fazendo marketing pessoal e politicagem, em detrimento do avanço na conquista efetiva de novos mercados para os nossos produtos, acarretando desgastes à imagem do país, isso sem falar na pratica a nível interno, de política economica demagógica que só beneficiou aos banqueiros.
    Essa é a minha opinião.

    @DRLUIZAUGUSTO_

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