sábado, 9 de julho de 2011

METENDO OS PEZÕES PELAS MÃOS.

Não há político no Brasil que tenha aprendido tanto com Luiz Inácio Lula da Silva como Sérgio Cabral, governador do Rio: imita-o na falta de limites, na disposição de afrontar a ordem legal, na marquetagem pessoal, no destemor com que desafia o ridículo. Todos o viram há pouco a lançar uma espécie de código de ética para o governo do estado. Seria uma iniciativa meritória não estivesse em questão o comportamento do próprio Cabral, chegado a receber favores de bilionários com sólidos interesses na administração.
A promiscuidade, há muito conhecida, ganhou tinturas dramáticas com o acidente de helicóptero que matou piloto, duas crianças, uma babá e três mulheres: Mariana Noleto, namorada de um filho de Cabral do primeiro casamento; Jordana Kfuri, mulher do empreiteiro Fernando Cavendish, e Fernanda, irmã de Jordana e namorada de Cabral, que se divorciou só ontem de sua segunda mulher. No Rio, todos sabem disso, mas preferem falar do barquinho que vai e da tardinha que cai. Estavam reunidos na Bahia para comemorar o aniversário de Cavendish, um homem de trajetória empresarial, como dizer?, um tanto conturbada. A Delta toca obras de mais R$ 1 bilhão no estado do Rio, mais de R$ 200 milhões desse total sem concorrência.
A proximidade do governador Sérgio Cabral com Cavendish, dono da Delta, e favores outros recebidos de Eike Batista, somados ao drama pessoal vivido pelo homem Sérgio Cabral lançaram o seu governo numa espécie de crise de credibilidade. De súbito, o político que consegue dosar com grande competência, admito, fanfarronice, dramaticidade, populismo e até certos ecos daquela estereotipia do “malandragem” carioca se viu sorumbático, um tanto abatido, atropelado pela sua falta de senso de medida, como uma espécie de ressaca que sobreviesse à alegria que leva um jovem a exagerar na dose. Foi, assim, nesse seu momento taciturno, que o tal código veio à luz, como se não houvesse leis que desaconselhassem Cabral a usar o jatinho de um ou a participar do convescote de outro…
Pois bem. Ontem, a presidente Dilma Rousseff foi ao Rio inaugurar o teleférico no Complexo do Alemão. Em um mês, a presidente teve de demitir dois ministros: Antonio Palocci saiu no dia 7 de junho, e Alfredo Nascimento, no dia 6 de julho. Embora os dois estejam envolvidos em casos de natureza distinta, pode-se dizer que uma coisa os une: a falta de liturgia ao lidar com o interesse público. O caso de Nascimento é mais grave para o governo porque envolve uma fatia da base de apoio no Congresso. Muito bem.
Cabral ainda está na sua fase de recolhimento. O grande orador do governo do Rio foi o vice-governador, Luiz Fernando Pezão. E ele não hesitou: “Ninguém sabe no Brasil mais do que a senhora (Dilma Rousseff) o que é fazer obra pública neste País (…) Eu queria aqui dividir esse momento (…) por nós estarmos celebrando de vencer a burocracia toda, de vencer os ministérios públicos, de vencer todas as dificuldades que existem num processo como esse”. Em seguida, metendo os pezões pelas mãos, mostrou-se grato às empreiteiras, inclusive à Delta, a empresa de Cavendish, também citada nominalmente.
Eu sempre me emociono quando vejo um governante falar das enormes dificuldades legais que os patriotas enfrentam para governar o Brasil, como se todos eles nos fizessem um enorme favor, abrindo mão dos próprios interesses para defender os nossos. Eu estou entre aqueles que, de vez em quando, enroscam com uma exigência ou outra do Ministério Público, mas eu posso! A homens públicos não cabe fazer proselitismo contra órgãos encarregados de fiscalizar a conduta de… homens públicos! Essa era uma das peças de resistência de Lula, que atacou de modo sistemático, nos seus oito anos de governo, o Tribunal de Contas da União, por exemplo.
São dias realmente muito especiais estes que vivemos. Uma presidente que acaba de demitir a cúpula de um Ministério diante de evidências gritantes de corrupção ouve um vice-governador ser grato às empreiteiras — inclusive àquela que é pivô da crise que enfrenta o governador — e atacar os “ministérios públicos”. Esta mesma presidente impôs ao Congresso um regime de concessão de obras públicas para a Copa do Mundo que poderá, por comparação, fazer gente como Valdemar Costa Neto parecer um coroinha. Na prática, o texto devolve o país à selvageria pré-lei de licitações.
Estamos sendo governados por heróis que descobriram as virtudes revolucionárias de jogar no lixo as leis.
Por Reinaldo Azevedo

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