sábado, 10 de agosto de 2013

ENGANOS DIÁRIOS



A bancada do PT elaborou uma "Minirreforma", dando razão ao "nada é tão ruim que não possa piorar"


Para os brasileiros, viver desenganos é ainda mais comum do que dizer “isso é um absurdo”. Após a esperança percorrer as ruas, o país voltou ao berço esplêndido em que teve uma curta insônia. E assim reestreia nosso choque de realidade, com requintes de desenganos diários.

Nos transportes, engana-se quem pensa que político não usa transporte público. Em São Paulo, o PSDB prova o contrário: Alckmin e Serra garantem que usaram os trens e metrôs num esquema de cartel que ultrapassa R$ 500 milhões em fraudes. Em sua defesa, Geraldão disse que “o Estado é vítima”. Agora só falta dizer que “não sabia de nada”.

Falando em gente que não sabe nada, o PT agora se levanta como paladino da ética. Engana-se, porém, quem crê em suas boas intenções. Na verdade, engana-se quem crê na honestidade dos partidos que se acusam mutuamente. Tanto o bico rachado dos tucanos quanto a estrela sem brilho dos petistas carregam sobre si um telhado de vidro mais frágil que vitrine em dia de manifestação.

Sobre as manifestações, engana-se quem acredita que a ocupação da Assembleia mudou a política capixaba. Ontem mesmo o Legislativo firmou o contrato para os 31 novos carros, de no mínimo 135 cavalos, que levarão os deputados para o “trabalho”. Isso um mês após o governo quase decretar falência diante do risco da multa do pedágio.

Engana-se quem espera melhor investimento do dinheiro público. Em 2012, Cariacica teve o maior aumento nos gastos com vereadores e o menor investimento em saúde do Estado. A prefeitura diz que contratará 700 médicos. Resta saber se os doutores conseguirão passar pelos corredores repletos de pacientes que esperam até 9 horas por atendimento.

Mais além, engana-se quem aposta na reforma política. Após as desastrosas iniciativas da presidenta inteligenta, a bancada do PT elaborou uma “Minirreforma”, dando razão ao “nada é tão ruim que não possa piorar”.

A ideia de Cândido Vaccarezza (PT-SP) cria, por exemplo, a possibilidade de um candidato declarar seus gastos como “não passíveis de comprovação” e, assim, não precisar apresentar documento algum. Além disso, diminui em até 10 vezes a multa para empresas que doarem verba de campanha acima do limite legal.

Segundo Vacarreza, isso tornará as eleições mais “democráticas e transparentes”. Na nova regra ortográfica, o termo “Minirreforma” perdeu o hífen. Diante da declaração do deputado, estudiosos pesquisam se o sentido de “democráticas e transparentes” também foi transformado.

Enganam-se, ainda, os que acham que os preceitos cristãos são integralmente vividos por alguns maus pastores. Se depender de Silas Malafaia, terceiro pastor mais rico do país, o mandamento “Não roubará” deve ser substituído por “Não denunciará”. Segundo MalaCheia, quem denuncia religiosos corruptos são “idiotas e imbecis travestidos de crentes”. Silas aconselha: “Teu pastor é ladrão? Não está gostando? Sai e vai pra outra igreja”.

Já o padre Pedro Camilo, de Vila Velha, acha normal o papa ter um carro simples e ele um de luxo, de quase R$ 100 mil. Curioso, também, é que enquanto Francisco combate as incoerências da igreja, a Arquidiocese de Vitória deixa um cheiro de pizza eclesiástica no ar. Mas a Bíblia não deixou passar: justamente na data em que o padre renunciou sua paróquia, o Evangelho do dia ensinou: “Vaidade, tudo é vaidade”.

Por fim, engana-se, principalmente, quem diz que “o país não tem jeito”. Como destacou Amarildo, para termos hospitais e escolas no “padrão Fifa”, precisamos de eleitores no “padrão Fifa”. E não é porque muitos cometem erros que tais faltas tornam-se aceitáveis. Como escreveu o poeta francês Anatole France, “Se cinquenta milhões de pessoas dizem uma grande besteira, continua sendo uma grande besteira”.

Nossos choques de realidade são diários e o erro parece ser a regra ausente de exceções. A verdade, porém, vem nas palavras do escritor americano Claude McDonald: “Algumas vezes uma maioria simplesmente significa que os tolos estão do mesmo lado”. Engana-se quem pensa o contrário.

Gabriel Tebaldi, 19 anos, é estudante de História da Ufes

Fonte: A Gazeta

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