sábado, 31 de agosto de 2013

ESSE É O NOSSO DESTINO

 marketing diz que estamos avançando e os presos sendo bem tratados. Mas as recentes rebeliões mostram o contrário


O estado de higiene é de causar nojo. Colônias de moscas, insetos e ratos são visualizáveis por quaisquer visitantes. Restos de alimentos são encontráveis em meio ao pátio. Larvas foram fotografadas em várias áreas do presídio. Não há luz elétrica. Não há chuveiros. A água é fornecida somente ao fim do dia. O cheiro do local é de causar náuseas”.

Não, o trecho acima não é de algum país miserável ou em guerra. As palavras são nossas, dos presídios capixabas. O horror foi narrado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), que visitou o Espírito Santo em 2009 e revelou a verdade por detrás das grades: “Encontramos resto de alimentação com água para fermentar bebidas, celas com quatro beliches sem chuveiros, peças de ventiladores para potencializar os celulares e buracos de toda espécie, que escondem armas, drogas, baratas e roedores”.

Na época o Espírito Santo foi parar na ONU por conta de suas masmorras. Os detentos eram jogados em contêineres, carinhosamente apelidados de “cela micro-ondas”. Com capacidade para 144 presos, abrigavam 400 pessoas a uma temperatura que chegava a 45 graus. Não havia médicos, advogados, nem defensores. Presos eram assassinados, esquartejados, e os corpos, desovados dentro de marmitas.

Na véspera da visita da fiscalização, a administração prisional obrigou os detentos a limparem o local. Mas não teve jeito: “Sob as celas encontramos um rio de esgoto, com insetos, larvas, garrafas, comida e sujeira de todo tipo. A profundidade daquele rio chegava a quarenta centímetros”.

Nos últimos 12 anos, o Estado saltou de 2,2 mil para 15 mil presos. Segundo estatísticas governamentais, 250 pessoas são presas por mês e apenas 50 soltas. Somando a conta com a cultura de guerra que diz combater a violência e a lentidão da Justiça, a superlotação é inevitável. Hoje, cerca de 70% dos detentos são presos provisórios que ainda aguardam julgamento!

Diante do profundo problema, o governo vem apostando na incrível ideia de construir novas unidades prisionais. Obviamente, é preciso ampliar as vagas, mas isso está longe de resolver os problemas. A violência institucional, os maus tratos, a deficiência médica e a ausência de educação e trabalho são apenas alguns exemplos que não serão resolvidos com mais cadeias.

Ao mesmo tempo, as autoridades andam superlotadas de argumentos falhos. Sobre as torturas, dizem que isso “é coisa do passado”. Falam, ainda, que a crise penitenciária é nacional e não uma exclusividade nossa. E, como sempre, acusam os denunciantes de ter interesses obscuros nas alegações. Mas, aqui entre nós, o único interesse obscuro dessa história foi a censura que Elio Gaspari (atualmente como colunista de A GAZETA) sofreu de um jornal capixaba quando escreveu sobre nossas masmorras.

No mundo invisível das prisões, sobra para os agentes penitenciários a função de controlar o incontrolável. E acredite: em 2003, eram apenas 91 agentes em todo o Estado! Nesta semana, os profissionais entraram em greve e fecharam as portas para novos detentos. O governo chamou o movimento de “irresponsável e inconsequente”. Já a faixa na entrada do complexo de Viana foi mais verdadeira: “A ausência do Estado transforma as prisões em escola da criminalidade”.

marketing diz que estamos avançando e os presos sendo bem tratados. Mas as recentes rebeliões mostram o contrário. A crise já lota até os DPJs e, em Laranjeiras, um preso relatou: “Não tem almoço, não tem café e não tem banho. Chega uma marmita, que a gente divide com três pessoas. A gente está dormindo no chão, com tudo molhado”.

O agravamento das masmorras do “novo Espírito Santo” prova que “crescer é com a gente”, sobretudo nos índices de criminalidade e desrespeito aos direitos humanos. Assim, o CNPCP resume a realidade: “Todos nós chegamos à conclusão que nunca havíamos visto tão alto grau de degradação. Poucas vezes na história, seres humanos foram submetidos a tanto desrespeito”.

Bem que o marketing poderia cantar: “Morrer...Esse é o nosso destino...”.

Gabriel Tebaldi - A Gazeta

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