Aos
Exmo. Senadores Federais
Exmo. Deputados Federais
Exmo. Governadores Estaduais
Através desta, nos apresentamos frente a nossos representantes políticos, como brasileiros descontentes com a proposta do governo eleito apoiado pelos partidos de situação, que visa o ressurgimento da Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – CPMF, contribuição designada especificamente ao custeio da saúde pública, da previdência social e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, instituída em 23 de janeiro de 1997 baseada na edição da Lei nº 9.311de 24 de outubro de 1996, e revogada em 13 de dezembro de 2007 pelo Senado Federal. Do total do valor arrecadado a previdência social e a erradicação da pobreza recebiam aproximadamente 26% e 21% da arrecadação, respectivamente, destinando-se a maior parcela para investimentos na saúde pública.
Como contribuintes, a intenção de reaver a CPMF nos suscita várias questões quanto à efetividade da contribuição com relação à melhora da saúde pública no país, e do modelo de administração pública seguido pelo partido ora no governo, tais como: A saúde pública melhorou no país no período de vigência da CPMF? A gestão dos recursos públicos pelo governo federal tem sido satisfatória, justificando o aval necessário para o aumento de impostos? Considerando o aumento de arrecadação federal, os valores obtidos pelo Estado brasileiro não são suficientes para a melhoria dos serviços públicos? Porque ‘penalizar’ ainda mais o trabalhador brasileiro, já bastante sobrecarregado de impostos diretos e indiretos? Porque o resgate da CPMF não foi tratado pela candidata Dilma Rousseff durante a recente campanha eleitoral, tendo em vista a divulgação da proposta apenas uma semana após o pleito?
Para contestar a estas perguntas de forma devida é necessário um estudo aprofundado sobre os recursos públicos e sua eficiência na melhoria de qualidade de vida de todos os cidadãos brasileiros. Entretanto, considerando a complexidade do tema, e a impossibilidade aqui de tratá-lo em sua totalidade, buscamos orientar a analise objetivando a finalidade desta correspondência, qual seja, demonstrar os motivos de nossa absoluta oposição à restituição da CPMF.
Segundo estudos do Instituto de Política Econômica Aplicada – IPEA, órgão governamental, os gastos com a saúde pública foram insuficientes mesmo no período de vigência da CPMF. Em 2005 os recursos públicos totais nos três níveis de governo era de 2,9% do PIB, definindo um custo per capita anual de US$ 333, valor bastante baixo se comparado com Argentina - US$ 672, Portugal – US$ 1,472 ou os EUA US$ 2,862. Neste mesmo ano, a participação pública representava apenas 44% dos recursos totais da saúde, sendo o restante assumido pela iniciativa privada. Em 2009, estando a contribuição extinta, o setor público responsabilizava-se com 45,6% dos gastos, ficando com o setor privado o remanescente. A cobertura privada ocorre por meio de planos de saúde, atendimentos avulsos, hospitais e outras formas de serviço a 48 milhões de brasileiros que pagam duplamente seu plano de saúde e previdência, devido à ineficiência em todos os sentidos do serviço público de pagamento obrigatório a todos os trabalhadores assalariados, funcionários públicos, empresários, etc. O percentual destinado à saúde hoje no Brasil é de 7,6% do PIB, sendo 45,6% a cargo do setor público, como dito acima. Em comparação a outros países, o Brasil está em uma posição intermediária. Os Estados Unidos gastam 15,2% do PIB, sendo 44,6% do setor público (nos EUA a saúde como serviço público foi aprovado pelo Congresso no inicio de 2010, situação não computada aqui); na Alemanha essas proporções são 11,1% e 78,2%; no Canadá são 9,9% e 69,9%; México é 6,2% e 46,4%; Argentina é 8,9% e 48,6%; no Chile são 6,1% e 48,8%. A média do conjunto dos países da América Latina é de 6,7% do PIB com gastos com saúde sendo que 54,4% deste percentual correspondem ao gasto público, na média dos países considerados ricos tem-se 10,8% do PIB com gastos de saúde com a participação do setor público sendo de 68,2%.
Verifica-se a partir destes dados que nos países mais ricos, embora a população tenha uma renda média bastante superior a do Brasil, o Estado assume em termos percentuais a saúde muito mais que o Estado brasileiro. Em todos os casos analisados, é no Brasil onde ocorre a menor participação do Estado na provisão da saúde pública. Com relação ao PIB os gastos com saúde aumentaram após a extinção da CPMF, mas pouco alterou a porcentagem da participação pública em seu custeio, que se mantém insuficiente em comparação a países como Argentina e Chile, e vergonhosa com relação a Portugal ou Canadá.
Segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - Pnud anunciados em agosto último o Brasil caiu no Índice de Valores Humanos – IVH relativo à saúde. O país tem um IVH de 0,59 em uma escala de zero a 1, sendo 1 o melhor resultado, alcançado a partir de 0,79 para o tema trabalho, 0,54 na educação, e 0,45 na saúde. A avaliação considera o tempo de espera para atendimento médico ou hospitalar, a facilidade ou não de compreensão da linguagem usada pelos profissionais de saúde e o interesse da equipe médica percebido pelo paciente. O governo federal contestou a informação, mas a realidade evidenciada pelas denuncias realizadas em todo o país confirma a situação expressa pela pesquisa sobre o IVH/PNUD referente a nossa saúde pública, como é possível observar nos textos abaixo veiculados na internet:
“O quadro precário da saúde em Mato Grosso se repete por todo o Brasil e o Centro-Oeste não fica fora dos dados negativos. Prova disso são os números divulgados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que apresentou uma pesquisa sobre os Índices de Valores Humanos (IVH), e revelou que no setor da saúde na região Centro-Oeste, a população dá nota de 0,48.” PnBonline
“O Sistema (SUS) está em declínio e sendo alvo de graves escândalos nas suas finanças: corrupção, hospitais falidos e endividados; falta de remédios, médicos especializados nas urgências e nos Postos de Saúde; atraso nas folhas de pagamentos de funcionários. Enfim, uma série de problemas que vem se agravando, formando uma gigantesca bola de neve. O Sistema está sob a mira do povo que aliados a jornais, políticos e os Conselhos Estaduais de saúde, debatem e cobram uma posição coerente e digna do Estado. Mas, infelizmente os órgãos de fiscalização parecem não conseguir conter esse descontrole.” Plenário – Sergipe
“Atualmente, ainda 52% das Despesas com saúde são custeadas pelo paciente (Planos de Saúde, particular. medicamentos etc.), e somente 48% das Despesas são custeadas publicamente (União, Estado e Municípios). Pior do que isto, o financiamento da saúde pública no Brasil está piorando. Segundo o IBGE em sua última pesquisa o Total de Gastos Públicos com Saúde caiu para 41,6% sendo que a Família Brasileira aumentou seus gastos para 57,4%.
Hoje, 19% da renda familiar é empregada em custeio de saúde dos quais 61% com medicamentos embora a lei 8080, artigo 6, inciso “d” garante “assistência terapêutica, inclusive medicamentosa, integral”. Doutor Armindo Pydd – Coord. da Comissão do SUS da AMRIGS
Segundo as pesquisas e denuncias a situação da saúde pública no Brasil decaiu nos últimos anos, assim como o Estado se desfez de boa parte de sua responsabilidade, passando-a ao setor privado. É evidente que a situação deplorável na qual se encontra a saúde pública no país não é resultado da extinção da CPMF nos últimos dois anos, pois a insuficiência de financiação e ineficiência dos serviços remontam aos anos anteriores. Segundo os analistas as causas desta problemática seriam o subfinanciamento e a má gestão. Neste sentido, verifiquemos o volume de arrecadação a disposição do governo nos últimos anos.
Conforme as informações disponíveis, no corrente ano o total de imposto arrecadado pelo setor público nos três níveis, federal, estadual e municipal chegou a R$ 1 trilhão em 26 de outubro, 50 dias antes de alcançar o mesmo valor em 2009. Em 2008, mesmo com o fim da CPMF e a queda no ritmo de crescimento da arrecadação no final do ano, a Receita Federal obteve um recorde histórico de arrecadação, atingindo a marca de R$ 685, 675 bilhões. No ano de 2007 este valor foi de R$ 602, 793 bilhões. Estes números demonstram que a arrecadação tem crescido a um ritmo acelerado fruto, sobretudo, do trabalho de todos os brasileiros, que repassam compulsoriamente ao Estado em torno de 40% de seus rendimentos anuais. Paralelamente, os dados sobre a qualidade de vida no país têm piorado constantemente nos últimos anos. Acima analisamos a situação da saúde, na seqüência observemos a questão da educação, saneamento, segurança, infraestrutura, áreas básicas e fundamentais para a obtenção do mínimo de qualidade de vida de uma sociedade.
· O ranking de desenvolvimento educacional da UNESCO, o qual avalia a qualidade das escolas nos diversos países, vem rebaixando o posto brasileiro nos últimos anos, sendo que em 2010 o país passou de 0,901(2005) para 0,888, colocando o Brasil atrás de países pobres como Paraguai, Equador e Bolívia.
· A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – PNSB/IBGE mostra um avanço tímido do país nesta área. Em 2000 52,2% dos municípios tinham rede geral de esgotos, em 2008 este total ampliou-se para apenas 55,2%. Os dados de tratamento do esgoto são ainda mais preocupantes, pois pouco mais de um quarto dos municípios - 28,5%, tratam o esgoto coletado.
· Segundo o Indicador de Desenvolvimento Sustentável – IDS/IBGE a taxa de homicídios no país cresceu 32% em 15 anos (1992-2007). Conforme ficou evidenciado na última campanha eleitoral inexiste fiscalização eficiente na fronteira entre o Brasil e a Bolívia, comprovadamente o país de origem da maior parte do tráfico de droga que ingressa em nosso território, fator que interfere diretamente nos índices de violência local.
· O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), Adriano Pires opina que elevar a infraestrutura do país a uma situação de primeiro mundo é o desafio do próximo governo. São estradas, portos, aeroportos, ferrovias, geração e transmissão de energia, telefonia, que seguem a espera de planejamento e execução por parte do governo, que muito pouco realizou nesta área nos últimos anos. “O governo tem que deixar de ter planos como o PAC - Programa de Aceleração do Crescimento, que é apenas uma colagem de vários projetos individuais, e realmente promover um grande programa de investimento em infraestrutura, com medidas para estimular a iniciativa privada a fazer a sua parte”, aposta Pires. A Confederação Nacional da Indústria - CNI também se posiciona nesta direção, pois entende que a superação das deficiências do setor de infraestrutura do país depende da efetiva participação da iniciativa privada no investimento e na gestão dos serviços. A entidade defende mais agilidade nos processos de licenciamento e licitação, segurança e qualidade de regulação, além de mais eficiência na gestão e no planejamento dos investimentos.
Esta breve panorâmica dos valores da arrecadação da Receita Federal e dos serviços mínimos a serem prestados pelo Estado demonstra que o povo brasileiro vem fazendo a sua parte repassando aproximadamente 40% de sua renda anual aos cofres públicos, entretanto o governo, sobretudo a nível federal, falha rotundamente em todas os setores relativos aos serviços públicos. A incompetência da administração não apenas deixa de evoluir nesta área, como permite o decrescimento na qualidade das prestações sociais de direito do cidadão, pois dispostas na Constituição Federal. Ao crescimento dos valores de arrecadação observa-se uma involução dos serviços públicos o que demonstra que a ampliação da receita não é garantia de melhoria das condições de bem estar da população. Considerando que os valores da arrecadação são incompatíveis com a qualidade dos serviços públicos a disposição da sociedade brasileira, nos negamos terminantemente a ampliar a carga de impostos. Conforme os dados analisados e a realidade vivenciada pelos cidadãos, entendemos que o atual governo federal que terá continuidade, não merece credibilidade tanto no que diz respeito à competência de gestão quanto à idoneidade moral (desnecessário faz-se aqui citar a seqüência de casos de corrupção dos últimos oito anos, destacando-se o Mensalão, comprovado juridicamente), para receber o aval do contribuinte para o acréscimo de tributação. Inserido nas questões de cunho ético, merece referência o fato da candidata do PT à presidência da república não ter incluído em seu discurso a restituição da CPMF, noticiada apenas uma semana após o pleito. Esta posição denota que os planos de governo da candidata não foram totalmente explicitados para a avaliação do eleitorado, atitude que não contribui para a transparência da atuação política, para o debate e politização da sociedade, enfim, para a democracia.
Neste sentido, exigimos de nossos representantes no Senado e na Câmara Federal que se posicionem contra qualquer tipo de ampliação da carga tributária que recaia sobre o cidadão brasileiro já bastante sobrecarregado, e que para muitos acarreta suprimir a possibilidade mínima de consumo. Entendemos que antes da ampliação dos impostos deve ser alavancada a reestruturação da administração federal objetivando a eficiência, a melhora dos serviços públicos prestados, e a idoneidade dos dirigentes no trato dos recursos públicos.
Sem mais,
Atenciosamente
http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/7505
Assinem.
Colaboração de Mara kramer
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