Fonte: http://www.atarde.com.br/ - 04-06-2006
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"Desaparecimento de 8 mil cartões de programação de urnas eletrônicas coloca em risco a segurança do pleito na Bahia"
Ao assumir a presidência do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) da Bahia, em agosto de 2002, o desembargador Manoel Moreira sabia que organizar a votação de 8,5 milhões de eleitores, em 40 dias, não seria fácil. Só não imaginou a dimensão dos problemas que teria sobre a sua mesa de trabalho. Poucos dias depois da posse, foi informado de que o sistema de informática encontrava-se desorganizado. E o mais grave: estavam desaparecidos 8 mil flash-cards, volume equivalente a 24% dos cartões preparados para programar as 30 mil urnas eletrônicas do estado.
De lá para cá, poucas pessoas tomaram conhecimento da crise que ameaçou as eleições de 2002 na Bahia e que ATARDE revela hoje com exclusividade.
O desembargador Manoel Moreira determinou, então, que as buscas aos cartões fossem intensificadas. Cada flash-card preparado para dar carga em uma urna pode ser aplicável a cerca de uma centena de urnas. E os técnicos constataram outro problema adicional: todos os arquivos eletrônicos das secretarias de Administração e Informática do tribunal haviam sido apagados. Não existia memória nas máquinas de dois setores vitais do TRE baiano. A preocupação aumentou justificadamente.
O desembargador Manoel Moreira decidiu recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em busca de ajuda. Diante do relato que ouviu pelo telefone, o então presidente do TSE, Nelson Jobim, decidiu enviar técnicos para auxiliar a equipe da Justiça Eleitoral baiana e recomendou sigilo sobre o assunto. A crise estava instalada. O secretário de informática do TSE, Paulo Camarão, desembarcou em Salvador poucas horas depois, juntamente com o diretor-geral Miguel Augusto Fonseca de Campos, com a tarefa de resolver o problema.
Naquele momento, até a aritmética do prejuízo começou a ser feita. Cada flash-card custava cerca de US$40. Para comprar novos cartões, seria preciso cerca de US$ 320 mil (ou R$ 1,2 milhões no câmbio da época), quantia indisponível nos cofres da Justiça Eleitoral baiana. Pelo telefone, o presidente Nelson Jobim assegurou que haveria suplementação de verba para a compra dos cartões, se não houvesse outro jeito.
Fim da Crise - Foram dez dias de nervosismo até que os técnicos encontraram os flash-cards, armazenados sem a segurança necessária, em cartórios e no depósito de urnas. Os técnicos do TSE só embarcaram de volta para Brasília com o término da crise. Para todos os que acompanharam a evolução dos fatos, Jobim recomendou um pacto de silêncio, em defesa da credibilidade do sistema.
Durante semanas, ATARDE tentou reconstruir esta história e encontrou poucas pessoas dispostas a falar. Passados quase quatro anos, várias personagens que acompanharam a crise do TRE baiano bem de perto foram procuradas e desconversaram, alegaram desconhecimento e usaram todos os meios possíveis para evitar o assunto. Mas, o desembargador aposentado Manoel Moreira confirmou em entrevista exclusiva a gravidade dos fatos que colocaram em risco as eleições da Bahia.
"Naqueles dias terríveis, tratei dos nossos problemas com uma única pessoa", declarou Moreira. "Com Nelson Jobim", completou a repórter, juntando as peças do quebra-cabeças fornecidas por fonte brasiliense. O desembargador limitou-se a sinalizar que sim, com a cabeça. E não quis fornecer detalhes adicionais sobre a delicada operação conduzida pelo TRE e TSE. "Não vou reviver aqueles acontecimentos", sentenciou.
Integrante da cúpula da Justiça Eleitoral baiana desde a gestão de Manoel Moreira (sucessor do desembargador Amadiz Barreto), o diretor-geral do TRE da Bahia, Raimundo Vieira, comentou aquele episódio. "Quando chegamos, a casa estava desarrumada. Houve sindicância para apurar responsabilidades no caso dos arquivos eletrônicos apagados", disse. "Em função disso, ocorreram exonerações no setor da informática. Quanto ao desaparecimento dos flash-cards, não houve quaisquer evidências de má-fé".
Descontrole - Na última terça-feira, o professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade de Brasília (UnB), Pedro Rezende, foi informado do desaparecimento temporário dos oito mil flash-cards na Bahia. "É o primeiro caso de flagrante descontrole da Justiça Eleitoral.", disse.
Em Camaçari (BA) e Petrópolis (RJ) houve registro de desaparecimento de alguns flash-cards, informou Rezende, doutor em Matemática Aplicada pela Universidade da Califórnia, em Berkeley. Mas, segundo ele, foram "problemas de proporções infinitamente menores".
Os oito mil cartões temporariamente desaparecidos continham informações necessárias para a votação de 2,04 milhões de eleitores baianos cadastrados em municípios do interior.
"O que vocês me informam ter ocorrido na Bahia é um descontrole inédito", comentou Rezende. "Além disso, fica evidente o esforço feito para ocultar da sociedade as informações". Na avaliação do especialista, uma conjunção de fatores agravou a situação vivida na Bahia. "Não houve transparência nas atividades preparatórias das eleições 2002", acrescentou. "A maioria foi executada por técnicos terceirizados, cuja atuação escapa ao controle externo."
Embora a técnica de fraude por infecção de urna com programa malicioso possa parecer ineficaz, o professor Rezende observa que existe forma de aplicação. "Está constatada a possibilidade de violação de lacres sem deixar rastro digital. Portanto, depois da eleição de 2002, a fraude só demandaria o acesso 'as urnas preparadas para votação, a pretexto de checar a carga das baterias, por exemplo. Os flash-cards poderiam ser usados nas eleições seguintes, o pleito municipal de 2004".
Um dos mais graves casos de fraude eleitoral dos últimos anos no Brasil, ocorreu no município baiano de Camaçari, região metropolitana de Salvador. Após duas revisões eleitorais (1998 e 2001) para eliminar irregularidades em seu cadastro, Camaçari ainda desafiava a Justiça Eleitoral abrigando, em 2002, milhares de eleitores fantasmas aptos a votar nas eleições presidenciais.
Nem as urnas eletrônicas que o TSE garante serem seguras foram suficientes para eliminar os milhares de títulos falsos naquele município. Pelo contrário, embora tenham sido usadas para dar mais credibilidade à ultima revisão, com as urnas eletrônicas ficou fácil fraudar o cadastro de eleitores, prática antiga em Camaçari. Empregadas como simples computadores, rodando programa especial, as urnas foram o principal instrumento dos fraudadores, sob as vistas da Justiça Eleitoral.
A existência de "fantasmas" em Camaçari é antiga, uma fraude que sobreviveu à informatização. Após duas revisões eleitorais, mais de 30 mil títulos de eleitores caíram na malha fina da Justiça Eleitoral por falta de comprovação dos domicílios. Com o cancelamento dos títulos irregulares, o universo de eleitores aptos a votar no município caiu para 80 mil.
O município de Santo Estevão (148 km de Salvador) também ganhou projeção nacional no debate sobre a segurança das máquinas de votar. A Coligação Unidos Pela Paz (PPB-PFL) apresentou impugnação do resultado eleitoral de 2000, solicitando que fosse realizada perícia nas urnas eletrônicas.
Em julho de 2001, foi oficialmente instalada a perícia. Houve dificuldades para a realização do trabalho. No ano seguinte, o diagnóstico deixou preocupados os especialistas em segurança eletrônica. O perito judicial apresentou um laudo onde, além da denúncia de que seu trabalho fora dificultado por membros da Justiça Eleitoral, havia evidências das fragilidades na segurança do sistema e de fraude relativa à carga dos programas das urnas eletrônicas. No campo das vulnerabilidades, o perito constatou que seria possível abrir a urna e chegar ao flash-card interno, sem remover o lacre de proteção da urna.
Nos Estados Unidos, esse assunto também tira o sono de políticos, autoridades e Justiça Eleitoral. Depois do fiasco ocorrido na apuração da Flórida 2000, outro fantasma passou a assombrar o sistema eleitoral norte-americano, a partir de 2004. Não foram as antiquadas cédulas de papel que trouxeram novas incertezas, mas as urnas eletrônicas.
A adoção de um sistema eletrônico de votação em boa parte do país fez com que cerca de 50 milhões de americanos, quase um terço do eleitorado, votasse em computadores. Mas o sistema eletrônico foi questionado por especialistas em computação, parlamentares e grupos de ativistas. Além de criticar o funcionamento porque houve problemas em vários Estados durante as primárias, os opositores da votação digital afirmam que ela abriu caminho para fraudes.
As principais queixas são de que não há como se fazer uma recontagem, caso necessária, e que o eleitor não tem como saber que o seu voto foi anotado corretamente. A solução mais defendida é o voto impresso. Nesse modelo, uma impressora é acoplada à urna, e o eleitor confere, por um vidro, a cédula antes de ela ir para a espécie de caixa coletora. Em mais de 20 estados norte-americanos, parlamentares ou autoridades eleitorais já propuseram leis ou normas determinando o uso de impressoras nas votações.
Entenda a importância do Flash-Card
Uma semana antes das eleições, o flash-card é utilizado na preparação das urnas. O primeiro passo é zerar a máquina, apagando as informações armazenadas. Em seguida, o programa é instalado nas urnas.
O flash-card permite "carregar" a máquina com as seguintes informações: cópia do sistema operacional, versão para a eleição, os aplicativos das eleições, tabelas de candidatos, municípios, zonas e dados dos eleitores de cada seção.
Todas as informações carregadas na urna são identificadas pelas respectivas assinaturas digitais, garantindo integridade e inviolabilidade. O conjunto formado por todas as informações gravadas recebe também uma assinatura digital para assegurar a integridade desse conjunto.
Após o encerramento da carga, a urna recebe um lacre físico que evidencia a sua autenticidade e proteção contra violação. A urna, assim preparada só realizará todas as operações no dia e hora pré-determinados. Caso seja ligada antes do dia da eleição, aparecerá na tela mensagem indicando o dia e hora de início da eleição.
No dia da eleição, as urnas são ligadas às 7h30. Durante a inicialização são executados todos os testes dos componentes básicos do sistema e a verificação da consistência de todas as informações.
Será que isso ocorreu só na Bahia e não está
ResponderExcluirocorrendo em outros estados teria que haver uma
fiscalização em todos os Cartórios Eleitorais vão
encontrar muita coisa errada isso tem que ocorrer
nas vésperas de eleições