Era o ano de 1978, já estava clinicando há dois anos em Atílio Vivácqua, como não tínhamos hospital nem pronto-socorro, atendia os pacientes num anexo que fiz na minha residência e fazia muitas consultas nas casas dos moradores, principalmente no interior do Município. Um dia , visitando a localidade de Córrego da Fama, povoada quase que exclusivamente por descendentes italianos, cheguei à casa do Sr. Carlito, que mais tarde se tornaria meu compadre, para consulta-o e à sua esposa. Durante minha estadia em sua casa, notei uma mocinha esperta que ajudava sua mãe nos afazeres domésticos e como precisava de uma babá para os meus dois filhos perguntei se não deixariam sua filha trabalhar na cidade, em minha residência e assim após algumas recomendações, principalmente um alerta sobre o seu gênio, a Odete que é como se chama entrou definitivamente na vida da minha família.
O tempo foi passando , ficamos encantados com nossa secretária e aprendemos a conviver com seu gênio, ficava amuada num canto e muito brava quando se aborrecia, mas era tão esperta e carinhosa com as crianças que acabou se transformando numa espécie de filha mais velha. Um dia, me chamou e pediu:
- Dr. Marco, o Vanildo quer vir aqui conversar comigo, pode?
- Olhe Odete, retruquei, lembra-se das recomendações de seus pais? Teremos que ir conversar com eles antes,
-No final de semana o Sr vai lá comigo?
-Vou, vamos pedir autorização, você sabe da minha responsabilidade.
Assim o fiz os pais consentiram, desde que o namoro fosse em casa, nada de deixar sair. Voltamos e como podem imaginar ela estava radiante. Vanildo era funcionário público municipal, bom rapaz, honesto, mas gostava de tomar umas pingas, o que era motivo de freqüentes brigas entre os dois. Após um ano de namoro e mais seis meses de noivado, aconteceu o casamento, o que nos deixou muito felizes e naturalmente fui padrinho do casal. Antes do casamento fiz questão de conversar com o noivo e alertá-lo sobre o gênio da noiva. Me disse que já tinha domado a fera ( expressão dele ) e que estava convicto do que estava fazendo e não me restou outra coisa a fazer senão calar-me e ajudar no que fosse possível.
Os anos se passaram, a vida seguiu, tiveram três filhas e ao batizar a mais velha me tornei além de padrinho, compadre do casal, Vanildo nunca parou de tomar suas pingas o que tornou famoso na cidade as brigas do casal e rolava boatos de que ao chegar bêbado em casa, o compadre apanhava da mulher o que era prontamente desmentido por ele em suas conversas com os amigos nas rodadas de cachaça.
As filhas já eram mocinhas, pré-adolescentes quando um dia estava eu atendendo no Posto de Saúde e entre um paciente e outro, percebi que na fila para consulta estava o compadre Vanildo, de soslaio, pude perceber que seu aspecto não era nada bom, alguns hematomas no rosto, braços arranhados, cabeça baixa, o que me deixou a pensar o que teria acontecido. Ao chegar sua vez, entrou no consultório e travamos o seguinte diálogo:
- Bom dia compadre,
- Bom dia, que cara é essa rapaz, o que aconteceu?
- Olha compadre, vou te contar, o Sr bem que me alertou sobre o gênio da Odete, estava cansado de ser humilhado, pois toda vez que chegava em casa, além das broncas de costume, pegou a mania de partir pra cima de mim com o cabo de vassoura,
- Mas também Vanildo, argumentei, você não toma jeito, tem que beber todo dia e chegar bêbado em casa?
- É a tentação compadre, saio do trabalho pra ir pra casa, mas sabe como é, encontro com os amigos, me convidam pra uma rodada e acabo bebendo,
- Perguntei então, tudo bem, mas o que aconteceu? Por que está todo machucado?
- Vou contar pro Senhor, eu resolvi dar um basta nessa braveza da mulher, ontem criei coragem, tomei umas canas a mais e fui resolvido a mostrar pra ela quem era o macho da casa,
- E daí, perguntei, já morrendo de curiosidade,
- Daí, que cheguei em casa, meti o pé no portão, gritei Odete!!!, venha cá que hoje eu vou te exemplar!!!!
- Sim, e aí?
- Aí, compadre nem te conto, a mulher virou uma fera e o resultado é o que o Sr está vendo, partiu pra cima de mim com um pedaço de pau e se não corro muito acho que estaria morto a essa hora,
Após soltar uma sonora gargalhada, tratei de cuidar dos ferimentos do compadre, não sem antes lembrá-lo do meu alerta e conseguir sua promessa de que nunca mais beberia, naturalmente promessa que não durou uma semana.
Continuam juntos, já são avós, ela não melhorou o gênio nem ele parou de beber.
rsrsrsrs
ResponderExcluirAdorei, que delícia de texto, aliás de relato!
Obrigada pelo presente de enviá-lo p mim...
Carla Flores
Você escreve tão bem que dá gosto de ler!
ResponderExcluirA história é pitoresca, e muito colorida.
Abraço,
Mia
From: Paulo Gilberto @pegemorais1
ResponderExcluirPatos (PB)
Gostei. É desse jeito que têm de ser tratados os políticos corruptos deste país. Na porrada!
Ahhhh Odete, preciso de umas aulinhas.... Eita mulher de verdade sô!!!!
ResponderExcluiradorei a odete! (rs)
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