Stélio Dias
As recentes denúncias contra parlamentares, relatores do Orçamento Geral da União para o próximo ano mostram um assunto que se pensava ter acabado com o caso de corrupção conhecido como o dos Anões do Orçamento.
O novo esquema destinado a fraudar o Orçamento copiou de maneira mais elegante e sofisticada a denominada máfia dos sanguessugas que foram emendas destinadas a compra de ambulâncias.
O Senador, Relator titular e a Senadora que o substituiu, supostamente cometeram as mesmas irregularidades como fartamente denunciaram as reportagens do Estadão e da Veja. Trata-se de recursos públicos orçamentados em decorrência de emendas postadas no Orçamento pelos parlamentares.
O Orçamento Público conhecido pela sigla OGU, Orçamento Geral da União é uma peça que revela em foto ampliada tudo que deveria acontecer no Governo. Deveria porque nunca é cumprido na sua íntegra. Mas, é uma foto que revela o governo.
Por ele qualquer cidadão poderia (de novo poderia) acompanhar todos os passos do Governo Federal e de toda a Federação. O abismo entre o ideal que a teoria dos orçamentos prega e a realidade que os governos produzem e executam é abissal.
A rigor poderíamos imaginar que o país está nos melhores dos mundos. Antes de aprovado o Orçamento, discute-se uma Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Essas diretrizes conduzem as peças orçamentárias que são feitas por técnicos do Ministério do Planejamento, analisadas pelo Congresso através de Comissão Mista Senado Câmara, e sua execução acompanhada pelo mesmo Congresso, Auditoria Geral da União, Ministério da Fazenda e auditores do Ministério e Tribunal de Contas.
Toda essa parafernália da burocracia de controle não justificaria que uma simples ONG usasse verbas do Ministério de Turismo para shows e festas não realizadas e desviassem recursos. Mas acontece, como aconteceu com os Anões do Orçamento e com os sanguessugas. E, continuará acontecendo.
A mal não esta nas ONGS, mas quem se utiliza delas. A mal não está nas emendas, mas nos requisitos e critérios de suas apresentações. Tecnicamente a Emenda parlamentar não existe. A Lei 4.320 (Código Financeiro) não prevê tal instrumento.
A emenda parlamentar mesmo alheia a Lei existe, como existe em outros países. Em todos muito combatida pela sociedade. As emendas parlamentares quando executadas, isto quando se transformam em recursos financeiros não são acompanhadas pela sociedade porque ainda não são muito compreendidas, mesmo pela mídia.
Os parlamentares já incorporaram as emendas a sua saúde legislativa, embora um estudo da USP tenha mostrado que não existe (estudo feito na Câmara) conexão entre sucesso eleitoral e as emendas apresentadas ao Orçamentos. Não existe conexão entre a emenda e o voto. Ao contrario, há um impacto negativo de uma votação para outra. O estudo abrange todos os deputados que apresentaram emendas em três legislaturas seguidas.
Como a emenda parlamentar, tecnicamente não existe; como fica sendo, uma vez incorporada ao Orçamento, uma transferência voluntaria da União essas emendas ficam guardadas no “tesouro” político do Governo e sacadas como “moedas” de troca entre o Executivo e o Legislativo.
Como elas vem do Legislativo (a maioria) sem os pré requisitos republicanos a emenda existente no “mercado” político tanto pode ser uma destinada a uma obra importante para a sociedade, como pode ser para pagamento de “shows” “culturais” (?) que podem ser realizados ou não como provou o Estadão em recente reportagem.
O Orçamento Geral da União para o próximo ano recebeu cerca de dez mil emendas, somando cerca 72,1 bilhões de Reais. O Orçamento em execução recebeu deste mesmo Congresso 68,9 bilhões de reais em emendas, mas o Executivo só cumpriu (ou pagou) 22,5 bilhões. Não existe controle e ninguém sabe o que aconteceu com todas essas emendas. No meio delas estão os “shows” e as festas patrocinadas denunciadas pela mídia.
Como os itens amortização de dividas da União, despesas com juros, benefícios previdenciários e outros custeios consomem na media 80 por cento do Orçamento o que resta fica por conta do Executivo que é o “dono” da banca. O Orçamento por isso é apelidado de peça de ficção. É mais do que isso beira a irracionalidade, e a irrelevância na sua aplicação.
O escândalo dos Anões do Orçamento, dos Sanguessugas e agora dos shows culturais no remete ao recente livro do Prof. Dias Junior “Os Contos e os Vigários – Uma historia da trapaça no Brasil” (leitura recomendada).
Prof. Dias Junior ao historiar a trapaça no Brasil descreve que a “época explica os golpes e os golpes explicam a época” e defende uma tese que “cada pais tem o vigarista que merece – ou seja os vigaristas sabem sintonizar seus golpes com os contextos culturais próprios de seus países”.
Livres são as conclusões e comparações com o que assistimos hoje.
Fonte: http://bit.ly/grgRjg
Talvez seja pela data de publicação, 26/12/2010, um dia após o Natal, que o artigo não ter tido nenhum comentário ou será porque o brasileiro não está interessado ou não entende do assunto. Assunto de maior relevância, já que muitos recursos são desviados com o uso desse expediente, além de se constituir em uma aberração, já que o Legislativo não só quer legislar mas quer mandar o Executivo executar algo que o Executivo talvez não tenha interesse em executar. O Orçamento tem quer ser visto como o Plano de Ação do Executivo, com suas ações, metas, planejamento, origem dos recursos, destinação dos recursos e não ferramenta para os parlamentares angariar votos. O correto, a meu ver, seria os parlamentares apresentarem os pleitos aos órgãos responsáveis do executivos e convencê-los de colocarem em seu planejamento e não simplesmente emendarem o orçamento e, depois, pressionarem para que a emenda seja liberada.
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