sábado, 25 de dezembro de 2010

O GALO ENSOPADO.

Como é tradição nos pequenos municípios do interior do País, em Atílio Vivácqua no sul do Espírito Santo, eleitor exige que o candidato visite a sua casa. Evidentemente que chega o momento em que o crescimento populacional inviabiliza esta prática e como os comícios perderam o atrativo com a proibição de shows, haja criatividade para se comunicar com o eleitor, e convencê-lo que é a melhor opção. Mas por aqui, ainda esse costume vigora, então pés na estrada e disposição para percorrer todas as residências do município à cata dos votos.


Na eleição de 1992, eu era candidato à reeleição para a Câmara de Vereadores , tinha sido Presidente da Constituinte Municipal, o que absolutamente não me garantia como certa a eleição, então pés na estrada. José Luiz era candidato ao segundo mandato como Prefeito e no que diz respeito a visitar os eleitores era incansável, não tinha hora para parar, almoçar ou lanchar.

Um domingo, eu, ele e o também vereador Romildo Sérgio resolvemos aproveitar, já que neste dia da semana é mais fácil encontrar as pessoas em casa, para visitar o maior número possível de eleitores, sabíamos eu e o Romildo Sérgio que seria dura e cansativa tarefa acompanhar o nosso candidato a Prefeito. Saímos lá pelas 8 horas em direção ao interior e começamos nossas visitas, conversa vai, conversa vem, propostas, compromissos, muito cafezinho , mas comida mesmo que é bom nada, pois toda vez que recebíamos o convite para uma boquinha, José Luiz descartava, alegando que precisava aproveitar o dia para andar mais e com o estômago cheio com certeza a preguiça ia bater e não conseguiríamos cumprir o objetivo.

Lá pelas 3 horas da tarde, a fome era negra, olhava para Romildo Sérgio à procura de cumplicidade para pressionar por um almoço, quando chegamos a uma pequena propriedade, casa simples, esteios de madeira, abrigava embaixo arreios, uma charrete, e outros utensílios da lida diária do pequeno agricultor. Paramos o carro perto da porteira, a cachorrada veio nos receber , quando o Sr Antonio chegou à janela e gritou,

- Oi José Luiz, chegue mais, não se preocupe pois os cachorros não mordem,

Fomos entrando, olho nos cães, direção à escada, fomos interrompidos,

- Não, por aí não, entrem por trás, pela cozinha, vocês são de casa.

Assim o fizemos, passamos por uma pequena varanda que abrigava um pequeno fogão a lenha ainda quente e entramos numa espécie de copa, cumprimentos de praxe, família à mesa, ainda almoçando, criançada com a boca amarela de gordura se deliciando com um galo ensopado com batatas, que nos deixou a todos com água na boca.

-Chegaram bem na hora, disse o Sr Antonio, o almoço hoje saiu meio tarde porque fomos à missa, é comida de pobre, mas faço a questão que almocem, ainda mais que é a primeira vez que o Dr Marco vem a minha casa.

José Luiz ainda tentou negar o convite, mas devido a insistência do dono da casa e a nossa cara de fome, acabou por aceitar. Sr Antonio então nos convidou para ir para a sala conversar enquanto a esposa ia despachar a molecada a preparar a mesa para os convidados. Fizemos nossa campanha, pedimos votos, convidamos para comparecer ao comício que ia se realizar ali perto na próxima semana. Voto prometido, gritou para a esposa,

-E aí Maria, está pronto?

-Ao que respondeu, sim Antonio, a mesa está pronta.

Lavamos as mãos numa pequena pia, nos sentamos, arroz, feijão, macarrão , galo com batata e refresco de limão. No momento nos parecia um banquete de Rei.

-Não façam cerimônia, já almoçamos, a comida é simples mas é de coração, falou o Sr Antonio com sinceridade,

Almoçamos, o José Luiz que até então se fazia de durão foi o que mais comeu, não sei se a comida realmente estava boa ou se era a nossa fome, mas o fato é que raspamos os pratos. Terminado o almoço, Sr Antonio oferece um cafezinho, vira-se pro José Luiz e fala,

-E então Zé, fala a verdade, estava gostoso ou não estava?

-Ao que José Luiz recrutou, claro que sim, estava uma delícia,

-Viu mulher, venha cá, ouça isso, não te falei? Olha José Luiz, só porque esse galo amanheceu morto no quintal, a mulher queria jogar fora, não falei que tava bom!!!

Olhamos um para o outro, engolimos em seco , apressamos a nos despedir, saímos, paramos na primeira sombra que encontramos, enfiamos o dedo na goela, vomitamos todo àquele delicioso almoço.

No que me diz respeito, fiquei um bom tempo sem poder nem olhar para galo ensopado.

(histórias de um médico do interior)

Um comentário:

  1. Adorei, só não entendi pq provocar o vômito... Queriam comer o galo vivo????? kkkkkkkkkkk

    Brincadeira à parte, vai que o "moço" só estava testando os candidatos?????? Feliz Natal pra vc e toda sua família! Beijo especial ao pequeno Marco.

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