Impossível não avaliar como vergonhoso, imoral, exorbitante, escandaloso - e outras tantas palavras com sentido semelhante -, o aumento de 61,8% autoconcedido pelo Congresso na noite de quarta-feira.
A revolta na sociedade é geral, e não só pelo percentual astronômico, muito acima dos padrões do país e dos 19,9% da inflação acumulada desde 2007, quando a atual legislatura começou.
Por todo ângulo que se olhe, o fato não é razoável. Especialmente porque a impressão é de que o parlamento nacional passou os últimos anos protagonizando escândalos, como no caso recente dos desvios por meio de emendas. Portanto, a votação de quarta-feira soa como mais uma farra parlamentar.
Mas a situação também incomoda por conta da rapidez com que a proposta passou - em poucos minutos na Câmara e no Senado. Não se vê os parlamentares se mobilizarem com tanta avidez e agilidade para debater temas importantes da agenda do país, como as necessárias e urgentes reformas na lei eleitoral.
Há também a questão dos penduricalhos, que custam mais para os cofres públicos que os salários. Suas excelências têm à disposição benefícios como R$ 60 mil para pagamento de assessores, até R$ 34,3 mil para gastos diversos, mais auxílio-moradia para quem não mora em apartamento funcional.
Os parlamentares sempre sonharam em igualar seus salários aos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, como fizeram desta vez. Numa só tacada adicionaram mais de R$ 10 mil aos salários - de R$ 16,5 mil para R$ 26,7 mil, que serão pagos a partir de fevereiro, na nova legislatura.
Mas quando houve a reposição anterior, cogitou-se reduzir ou mesmo acabar com os penduricalhos. Essa discussão passou longe desta vez, mas seria necessária e justa. Da forma como ficou, criou-se uma classe de notáveis e privilegiados com benefícios custeados com dinheiro público.
Os parlamentares embutiram no projeto aumento para os salários do presidente da República, para o vice-presidente e para ministros. Nesses casos os vencimentos já estavam de fato desatualizados frente às atribuições dos cargos. E, apesar do alto percentual, 133,9%, a insatisfação não parece tão forte quanto a direcionada aos congressistas.
O fato é que essa situação cria um clima péssimo para a política e para o próprio Congresso. O Legislativo é tido como mais transparente dos poderes e como o que mais reflete o perfil da sociedade.
Não é o poder em si nem a política que está no alvo, porque, mesmo com as mazelas com as que vemos agora, o parlamento, mesmo cheio de defeitos como o atual, é imporante para a democracia, claro.
Mas é preciso que suas excelências tenham mais espírito público, porque o Congresso tem se mostrado de costas, alheio para o país não é de hoje. E, como acontece em outras esferas, muitos ainda lidam com a esfera pública como se fosse propriedade pessoal.
Num período em que os parlamentares federais já estão diplomados e a caminho do mandato, essa é uma reflexão oportuna. Resta a esperança de que o novo Congresso nos traga dias melhores.
Fonte: Praço oito - A Gazeta
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