domingo, 5 de dezembro de 2010

EUA, SAITO, JOBIM E OS CAÇAS. (WIKILEAKS)

A disputa pela venda de 36 caças para as Forças Armadas Brasileiras foi palco de grande atuação da representação americana no Brasil. Documentos obtidos pelo WikiLeaks revelam que a embaixada procurou o ministro da Defesa, Nelson Jobim e o comandante da FAB Brigadeiro Juniti Saito para influenciar na decisão. Ao mesmo tempo, instava o governo americano a se mexer, assim como o frances  estava fazendo.


A menos de um mês do final do governo Lula, a compra dos caças continua sem definição e deve ser decidida pela presidente eleita Dilma Rousseff. Nesta semana, ela retoma a discussão em reunião com o ministro Jobim.

Lobby

Mas desde maio de 2009, a embaixada americana em Brasilia tenta fazer com que o governo dos EUA se engaje mais na disputa. Em um telegrama do dia 19,  a Ministra Conselheira Lisa Kubiske pediu que Washington faça um lobby mais intenso, pois alguns contatos brasileiros "dizem não acreditar que o governo dos Estados Unidos esteja apoiando a venda fortemente, enquanto o presidente francês Nicholas Sarcozy estaria envolvido diretamente e os suecos estariam atuando também a ní­vel ministerial.

Kubiske acredita que a falta de atuação pessoal "São uma desvantagem cri­tica em uma sociedade brasileira na qual os relacionamentos pessoais servem de fundamentação para as negociações, e reforça que o governo deve assumir posição favorável  à aprovação de transferências de tecnologia.

Nossa embaixada recomenda o seguinte, como próximos passos a fim de reforçar nossos argumentos no que tange à transferência de tecnologia: uma carta do presidente Obama ao presidente Lula defendendo a causa; uma carta da secretária Clinton ao ministro da Defesa Jobim afirmando que o governo americano aprovou a transferência de toda a tecnologia apropriada.

Também recomenda tentar influenciar senadores que questionaram os EUA em junho daquele ano. "Concentrando as atenções em senadores importantes, temos a oportunidade de conquistar o apoio de indivíduos que podem influenciar os responsáveis pela decisão e garantir que as pessoas que terão de aprovar os gastos do governo brasileiro compreendam que o F-18 lhes oferece mais valor".

Para Lisa, a campanha francesa é mentirosa: "Nos últimos meses, o esforço francês de vendas vem se baseando em alegações enganosas, se não fraudulentas, de que seu caça envolve apenas conteúdo francês (o que o isentaria dos incômodos controles de exportação dos Estados Unidos). Mas isso não procede. Uma análise da Administração de Segurança da Tecnologia de Defesa encontrou alta presença de conteúdo norte-americano, o que inclui sistemas de mira, componentes de radar e sistemas de segurança que requererem licenças norte-americanas.

Aliados

A decisão americana em atuar mais fortemente foi vista com apreciação pelo brigadeiro Juniti Saito, comandante das Forças Armadas.

Por causa da atuação pessoal de Obama, que conversou com o presidente Lui­s Inácio Lula da Silva na cúpula do G8 em Áquila, na Itália, em 9 de julho de 2009, Lula teria instruí­do Jobim e Saito a conversarem com o Conselheiro de Segurança Nacional, general James Jones, segundo revela um telegrama de 31 de julho de 2009.

Àquela (a conversa) abriu as portas para que eu pudesse procurar o embaixador, como o  fiz, teria explicado Saito durante um jantar por ocasião da visita do comandante do Comando Sul, o general Doug Fraser.

Na ocasiõo, Saito chamou o embaixador Sobel e seu conselheiro polí­tico de lado para indicar que preferia o F-18 ao francês Rafale. E afirmou que não existia dúvida, do ponto de vista técnico, que americano era o melhor avião. "Vendemos equipamentos americano há décadas e sabemos que são confiáveis e que sua manutenção é simples e oferece bom custo/benefi­cio por meio do sistema de vendas militares externas".

Saito insistiu ainda que o governo americano enviasse a carta que ele havia pedido se comprometendo com transferência de tecnologia. O embaixador teria dito que a carta estava na fase final de aprovação. "Aliviado, Saito disse que precisava ter a carta em mãos no dia 6 de agosto", relata o telegrama assinado pelo embaixador Clifford Sobel. "Essa foi a expressão mais clara de que Saito pretende recomendar o F18".

Em 5 de janeiro, pouco antes da mudança de embaixador, Lisa Kubiske envia outro telegrama  dizendo que a embaixada vai tentar influenciar Jobim para convencer o presidente. Permanece, entretanto, o formidável obstáculo de convencer Lula. Nosso objetivo agora deve ser garantir que Jobim tenha argumentos reforçados ao máximo possi­vel para ir a Lula em janeiro. Para ela, o "alto preço" do Rafale e "as dúvidas sobre o desenvolvimeno do Gripen" levariam o Super Hornet a ser a "opção óbvia". Mas "o fato é que Lula reluta em comprar um avião dos EUA.

Um dos ultimos telegramas obtidos pelo WikiLeaks  relata uma conversa telefônica entre Nelson Jobim e o atual embaixador dos EUA, Thomas Shannon, em 5 de fevereiro deste ano. O embaixador Shannon fez pressão, dizendo que "apesar da venda ser conduzida como uma transação comercial, a sua importância para a relação bilateral não deve ser ignorada". Segundo ele, "a decisão inédita de trasnferência de tecnologia americana em apoio ao Super Hornet mostra o alto grau de confiança que o governo americano coloca na sua parceria com o Brasil".

Patriota, Iran e Haiti

Antonio Patriota, anunciado como futuro ministro das Relações Exteriores durante o próximo governo, também foi alvo de lobby sobre os caças. Durante uma reunião de uma hora no dia 4 de fevereiro, ouviu que a decisão de liberar toda a tecnologia necessária ao Brasil refletia uma mudança de paradigma para os EUA e ouviu que a decisão ainda não estava tomada.

Mas ouviu mais. Segundo o relato de Shannon , Patriota comentou ainda a situação do Iran, que na época sofria pressões contra mais uma rodada de sanssões contra seu programa nuclear. Teria dito que o Brasil quer "evitar uma repetição do Iraque", e que se havia uma saí­da diplomática, ela deveria ser adotada. A desconfiança é grande (sobre o Iran). Não nunca sabemos o quão sinceros, mas vamos continuar tentando, concluiu. O embaixador recomendou ao governo brasileiro que se movimentasse com cautela em relação ao Iran.

Sobre a situação do Haiti, que havia sofrido um terremoto em 12 de janeiro, Patriota teria dito: "nós tere­mos que encontrar uma forma de contornar a escolha entre um governo corrupto no Haiti e colocar tanto dinheiro nas mãos de ONGs não-haitianas.

Os telegramas fazem parte de milhares de documentos da embaixada e consulados dos EUA no Brasil que serão publicados pelo WikiLeaks nas próximas semanas.

2 comentários:

  1. Negociatas e mais negociatas... Mas...resta-nos apenas a INDIGNAÇÃO?
    É frustrante, pois compras assim, TÊM QUE TER O AVAL DO CONGRESSO NACIONAL - OU ESTOU ENGANADA?... OU A CONSTITUIÇÃO MUDOU?... ALGO ESTÁ MUITO ESTRANHO NISSO TUDO.
    Sei, não era para estranhar-se mais coisa alguma nesse país.TUDO Q DIZ RESPEITO AOS PODERES, PRINCIPALMENTE AO EXECUTIVO, É SURREAL.
    E, ao fim e ao cabo, quem paga as contas somos nós...

    Sei que estamos em um circo.
    Só não sei QUEM está no picadeiro e QUEM faz parte da platéia...melhor:sei, sim:os palhaços somos nós - ou alguém tem dúvidas?

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  2. Gosto que toda essa "confidências" venham à tona e mostrem a hipocrisia que vivemos. Dessa forma, Mirna, os palhaços são eles. Nós como platéia assistimos estupefatos a esse circo mambeme. Que a História registre tudo.

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